Comissão sobre ditadura militar trava, e governo Lula não cumpre promessa
Ministros haviam estipulado 25 de outubro, data da morte de Vladimir Herzog para recriar grupo que busca mortos e desaparecidos, mas projeto parou na Defesa
O governo federal não cumpriu o compromisso de recriar a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos neste 25 de outubro, como havia prometido. O Ministério dos Direitos Humanos ainda aguarda o parecer do Ministério da Defesa, um dos documentos necessários para a reabertura do colegiado responsável por investigar as circunstâncias do desaparecimento de centenas de pessoas durante o período da ditadura militar no Brasil.
Os ministros Sílvio Almeida (Direitos Humanos e Cidadania) e Flávio Dino (Justiça e Segurança Pública) chegaram a se comprometer publicamente com a recriação da comissão, e estipularam o dia 25 de outubro, dia do assassinato do jornalista Vladimir Herzog, então diretor de jornalismo da TV Cultura, nas instalações do DOI-Codi em São Paulo, em 1975 — e, por isso, chamado de Dia da Democracia.
O Ministério da Defesa informa que o parecer está pronto, e que “a análise do mérito apontou que não há impedimentos jurídicos para a reativação do grupo”. A pasta, no entanto, não informou por que ainda não enviou o documento para o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania.
A recriação da comissão é uma promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Desde o início do ano, parentes de desaparecidos têm pressionado o governo pela reinstalação da comissão, encerrada irregularmente no último dia do governo Jair Bolsonaro.
O decreto de recriação da comissão chegou a ser encaminhado para a Casa Civil, mas o órgão pediu pareceres da Justiça e da Defesa para dar seguimento ao processo. O Ministério da Justiça já encaminhou parecer favorável.
A medida, entretanto, encontrou resistência do ministro José Múcio (Defesa). Em uma reunião no final de setembro, Múcio externou a Almeida a preocupação de recriar a comissão, que causa arrepios nas Forças Armadas, neste momento em que dezenas de militares se vêem envolvidos em denúncias de irregularidades, inclusive de tentativa de golpe de estado. Na ocasião, Múcio teria sugerido ao colega dos Direitos Humanos a criação da comissão em momento “mais oportuno”.
Ao não reabrir os trabalhos da comissão, o governo federal descumpre decisões da Corte Interamericana dos Direitos Humanos, que determinou que a comissão deve permanecer funcionando enquanto ainda haja casos a serem investigados.
Familiares de desaparecidos na ditadura fizeram uma live nesta quarta-feira para discutir o assunto. “A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos é essencial para seguirmos no processo de reparação, de encontro da verdade, para a justiça, para a construção da memória histórica coletiva deste país”, disse a pedagoga Ñasaindy Barrett, filha do casal de militantes Soledad Barrett Viedma e José Maria Ferreira, desaparecidos durante a ditadura.