As resistências bolsonaristas que Mourão terá de quebrar em campanha no RS
Contrapontos a Bolsonaro durante o mandato e até torcida pelo Flamengo causam olhares de desconfiança de políticos gaúchos ao vice, que disputará o Senado

Depois de passar quatro anos se mostrando mais moderado e habilidoso politicamente que Jair Bolsonaro (PL), um incômodo contraponto, o vice-presidente, Hamilton Mourão, fará seu primeiro voo solo eleitoral em um dos estados onde o presidente é mais forte. Na próxima quarta-feira, 16, ele trocará o nanico PRTB pelo Republicanos, sócio do Centrão, para encarar a disputa a uma cadeira do Rio Grande do Sul no Senado. Diante das discórdias fomentadas pelo próprio presidente desde os primórdios do mandato, um dos maiores desafios de Mourão será superar as desconfianças de políticos e eleitores bolsonaristas gaúchos.
As bases do bolsonarismo no estado ficam ressabiadas diante de todo o histórico de contrapontos a Bolsonaro feitos pelo vice, sendo o mais recente deles em relação à guerra na Ucrânia. Nos últimos dias, caiu muito mal entre políticos do grupo no estado um encontro entre Mourão e o embaixador chinês no Brasil, Yang Wanming, em 25 de fevereiro. Wanming, que deixava o cargo naquele mesmo dia, protagonizou embates com o governo Bolsonaro. “Aquilo caiu como querosene”, diz um político próximo do ministro do Trabalho e Previdência, Onyx Lorenzoni, que disputará o governo gaúcho. Em um estado tão cioso de suas tradições, há também quem torça o nariz às “carioquices” de Mourão, que nasceu em Porto Alegre, a começar pela torcida fanática pelo Flamengo.
O ponto de partida para aparar as arestas será a definição da aliança que incluirá o vice-presidente. Uma decisão deve ser tomada nos próximos meses, mas nos bastidores políticos dos pampas dá-se como bem encaminhado e inevitável um arranjo para que ele ocupe a vaga ao Senado na chapa encabeçada por Onyx, que se filiou ao PL para disputar o governo. “Temos interesse em reproduzir a aliança nacional nos palanques estaduais. Há boas sinalizações do Republicanos e, com a filiação de Mourão, ele passa a ser uma opção ao Senado”, diz Rodrigo Lorenzoni, filho do ministro e secretário de Desenvolvimento Econômico de Porto Alegre. “Estamos livres, leves e soltos para trilhar nosso caminho”, afirma o deputado Carlos Gomes, presidente do Republicanos gaúcho, hoje aliado do governador Eduardo Leite (PSDB).
Ainda entre os aliados de Jair Bolsonaro, outro que não arreda pé da disputa ao governo gaúcho é o senador Luis Carlos Heinze (PP). Ele também tem interesse em contar com Mourão em sua chapa e diz que sua candidatura é “irreversível”, mas políticos locais apostam em uma desistência. O nome de Heinze é cogitado em Brasília para ocupar o Ministério da Agricultura quando a ministra Tereza Cristina deixar o posto, em abril.
Apesar das desconfianças, Mourão pontua bem nas pesquisas — em janeiro, apareceu empatado na margem de erro com Manuela d’Ávila (PCdoB), Ana Amélia, José Ivo Sartori (MDB) e Lasier Martins (Podemos), segundo o RealTime Big Data. Nas entrevistas, ele se refere à gestão federal como “nosso governo” (o vice não precisará renunciar para disputar a eleição — mas não poderá mais assumir a Presidência).
O general pode se tornar ainda mais competitivo se conseguir quebrar as resistências à direita e atingir o patamar de Bolsonaro no estado. Diante disso, a equação envolvendo Heinze ganha importância porque, caso haja duas chapas bolsonaristas, Mourão teria um adversário direto com quem competir por votos mais conservadores, além de Amélia, que deixará o PP. Neste caso, um nome à esquerda poderia ganhar força pela cadeira única, como Manuela, que ainda não sinalizou com clareza que rumo vai tomar na eleição.