A malandragem de Pablo Marçal para surfar na posse de Trump
Coach divulgou vídeo antigo ao lado do presidente americano, sem informar que não era do dia da posse, e confundiu a imprensa e os seus seguidores nas redes

Na última terça-feira 21, o coach Pablo Marçal (PRTB) aplicou mais uma de suas táticas duvidosas (para dizer o mínimo) para gerar engajamento nas redes sociais sobre o noticiário. Em seu perfil no Instagram, o candidato derrotado à prefeitura de São Paulo em 2024 publicou um curto vídeo ao lado do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pedindo que o republicano “salve a América e salve o Brasil”.
Publicado estrategicamente na esteira da posse presidencial nos EUA, o vídeo produz a falsa impressão de que Marçal teria se aproximado de Trump para o registro na semana do início de seu segundo mandato. A impressão foi reforçada por nota divulgando o vídeo enviada por sua assessoria aos veículos de comunicação. Nessa nota, o texto é cuidadosamente construído para levar ao engano. Nele, há uma frase de Marçal: “É quase impossível gravar um vídeo com o presidente porque o serviço secreto não deixa ninguém chegar perto dele. Foi o acesso mais difícil de toda a minha vida, mas eu encontrei com o Trump três vezes e ele realmente gosta do Brasil”, diz.
O encontro foi amplamente divulgado pela imprensa, incluindo veículos de amplo alcance como VEJA, Folha de S.Paulo, O Globo e O Estado de São Paulo. Parte do apelo veio do fato de que a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que viajaram aos EUA como representantes do ex-presidente Jair Bolsonaro — impedido de viajar pelo STF —, não tiveram a oportunidade de fazer nenhum registro com o mandatário americano.
Horas após a repercussão, porém, descobriu-se que o vídeo não havia sido gravado durante a posse de Trump, em Washington, mas em ocasião anterior, no luxuoso resort do magnata em Mar-a-Lago, na Flórida. Nas imagens, os detalhes do ambiente são perfeitamente compatíveis com a mansão, e não com o Capitólio dos EUA (palco do evento oficial) ou o Capital One Arena, onde o presidente discursou antes da cerimônia de Estado e compareceu a um baile depois.
Farsa foi cuidadosamente elaborada
Longe de ser um acidente, a “malandragem” de Marçal foi meticulosamente armada para induzir o receptador ao erro. Nos dias anteriores, o coach, de fato, esteve nos EUA, onde registrou dezenas de vídeos e fotos trajando exatamente as mesmas roupas que usava na gravação antiga com Trump.
A publicação ocorreu no início da tarde de terça-feira, menos de 24 horas após a posse do presidente americano. O próprio Marçal fez comentários na postagem sobre a dificuldade de conseguir o registro. Até a veiculação desta reportagem, o vídeo já havia alcançado mais de 17 milhões de visualizações e quase 800.000 curtidas, com diversas respostas de apoiadores exaltando o feito do coach, que, em nenhum momento, informou que as imagens não eram recentes.

A assessoria de Marçal, tampouco, fez questão de ressaltar que o breve encontro não era recente. O comunicado enviado a jornalistas se resume a exaltar o encontro entre os dois políticos, alegando que esta teria sido a terceira vez em que o brasileiro encontrara o americano, além de reforçar as declarações de que “o serviço secreto” dos EUA havia dificultado a abordagem e aplaudir “a crescente influência de Marçal no cenário político internacional”.
A reportagem de VEJA procurou Pablo Marçal e sua equipe para esclarecer a data exata em que o vídeo foi gravado, mas ainda não obteve resposta do coach ou de seus assessores. Questionada, a sua assessoria respondeu apenas: “Ele não deu detalhes ainda sobre local e data, mas pode deixar que qualquer nova informação que eu conseguir passo para você”. E não atendeu a nenhuma ligação para falar sobre o episódio.
Histórico de mentiras
Durante a campanha eleitoral de 2024, enquanto candidato à prefeitura paulistana, o coach mentiu sistematicamente sobre o suposto abuso de cocaína pelo rival Guilherme Boulos (PSOL) — às vésperas da votação, o influenciador chegou a divulgar um laudo forjado de internação por overdose do deputado federal.
Também no período eleitoral do ano passado, após o infame episódio da “cadeirada” que recebeu do adversário José Luiz Datena (PSDB) durante um debate, Marçal alegou que a agressão lhe causara fraturas nas costelas e disseminou um falso raio X do tórax — registro que, após checagem, revelou-se retirado de um banco de imagens para divulgação.
Ainda na época das eleições, o coach protagonizou embates com bolsonaristas por afirmar, em diversas ocasiões, que tinha o apoio de Jair Bolsonaro e seus familiares. Em uma das falácias, publicou trecho de uma entrevista de Eduardo Bolsonaro, em vídeo, na qual o parlamentar o chama de “muito inteligente” e parece endossar sua candidatura, deixando de fora as partes em que o filho Zero Três do ex-presidente diz não confiar em Marçal e não apoiá-lo à prefeitura.