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ButanVac: entenda como a vacina será feita

Domínio da tecnologia e resultados promissores: as peculiaridades do imunizante lhe conferem muitas vantagens

Por Salmo Raskin
Atualizado em 31 mar 2021, 13h22 - Publicado em 31 mar 2021, 13h18

A vacina ButanVac é do grupo de vacinas vetoriais, ou seja, um vetor carrega uma sequência genética que codifica a proteína Spike, para dentro da célula humana. Esta é a mesma estratégia de vacinas para Covid agora já conhecida de todos, por ser utilizada nas vacinas da Astrazeneca/Oxford/Fiocruz, Jansen e Sputnik. Porém a Butanvac tem várias peculiaridades.

O vetor é diferente das três citadas anteriormente. Não é um adenovírus, mas sim o vírus que causa a doença de Newcastle em aves (NDV). Este vírus de aves, assim como o SARS-CoV-2, tem um grande genoma composto por RNA. Seu RNA é composto por 15.186 letras bioquímicas, contendo o código genético de seis genes, que codificam para a proteína do nucleocapsídeo (NP), fosfoproteína (P), matriz (M), fusão (F), hemaglutinina (HN) e polimerase (L). O fato do NDV ter um grande RNA facilita a engenharia genética para formação de quimeras, e o conhecimento de que este RNA não se integra ao DNA do hospedeiro traz segurança ao processo.

Para a produção da ButanVac um vírus quimérico foi formado manipulando e recombinando o genoma dos dois vírus, NDV e SARS-CoV-2. Através da Tecnologia do DNA Recombinante insere-se entre os genes P e M do genoma do NDV, o gene que codifica para a proteína Spike (S) de SARS-CoV-2. Da sequência do gene Spike a ser transferida são previamente retirados três aminoácidos que compõem o sitio de inserção polibásco típico do SARS-CoV-2, no sentido de induzir a formação da proteína S em estado pre-fusional, uma conformação mais estável e mais imunogênica. Para aumentar a fixação da proteína Spike na membrana do NDV, a sequência genética que codifica para o domínio transmembranico e cauda citoplasmática de Spike é substituída pela sequência genética da proteína de fusão (F) de NDV, formando a quimera S (Spike)-F (Fusão). Ainda, a quimera foi desenvolvida para conter uma mutação (L289A) no gene que codifica para a proteína F do NDV, visto que esta modificação facilita ainda mais a fusão do vírus.

As peculiaridades da ButanVac lhe conferem muitas vantagens. A capacidade de produção global já existente de vacinas aonde vírus são reproduzidos em ovos embrionados, como são produzidas certas vacinas inativadas do vírus da gripe, permitirá a produção rápida de uma vacina para proteger de Covid-19 baseada em multiplicação do vírus dentro de ovos, visto que os protocolos para produção da vacina da gripe também utilizam ovos, e necessitariam apenas de pequenas modificações.

arte butanvac

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O Instituto Butantan domina há muitos anos a produção de vacinas a partir de inoculação e replicação de vírus em ovos. Esta metodologia permite produção em grande escala a baixo custo, visto que não necessita de laboratórios complexos com segurança para cultivo viral. A eficácia deste tipo de vetor viral não deve ser influenciada pela presença de anticorpos contra o NDV na população humana, visto que o vetor viral produzido não é originário de vírus que infecta humanos, mas sim aves. A utilização do NDV para fins de saúde já tem um histórico de segurança muito bom, visto que é usado há mais de uma década em oncologia por ser seletivo e destruir células cancerosas, e por jamais ter causado doença grave em humanos.

Experimentos pré-clínicos realizados em ratos e hamsters já foram publicados e demonstraram a produção de níveis altos de anticorpos e proteção contra infecção pelo coronavírus, gerando boa expectativa para os experimentos que em muito breve iniciarão em humanos. A ANVISA deve aprovar o início das pesquisas em humanos já nas próximas horas.

A colaboração científica com um renomado instituto de pesquisa como o Icahn School of Medicine do Mount Sinai, em Nova York, traz ao processo ainda mais segurança e robustez. Deveria ter sido anunciado pelo Instituto Butantan com muito orgulho, porém mais uma vez a renomada Instituição brasileira falha na divulgação de suas ótimas vacinas. O processo de elaboração da quimera é patenteado pelo laboratório do Mount Sinai. Também, ao contrário do anunciado, não se espera que a vacina esteja disponível aqui no Brasil em poucos meses. Estimamos que em 2022, se todas fases de pesquisa em humanos obtiverem sucesso, os brasileiros poderão ser vacinados com uma vacina que depende menos de outros países, do que as atuais.

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Como já sabemos que o vírus veio para ficar, ter esta autonomia para futuras vacinações, mesmo que parcial, é um grande passo para o país. Além disto, o Icahn School of Medicine do Mount Sinai se comprometeu a construir quimeras que permitam a adaptação desta vacina para conter variantes genética peculiares ao Brasil, como a variante P1. Ou seja, não é exatamente uma vacina brasileira, mas toda a produção poderá ser feita por aqui. Parafraseando Erasmo Carlos, “uma vacina para chamar de sua, mesmo que seja eu”.

* texto escrito em colaboração com Sergio Surugi de Siqueira, doutor em ciências biológicas e professor de Imunologia da PUCPR

Referências

A Newcastle Disease Virus (NDV) Expressing a Membrane-Anchored Spike as a Cost-Effective Inactivated SARS-CoV-2 Vaccine. Weina Sun, Stephen McCroskery, Wen-Chun Liu, Sarah R. Leist, Yonghong Liu, Randy A. Albrecht, Stefan Slamanig, Justine Oliva, Fatima Amanat, Alexandra Schäfer, Kenneth H. Dinnon, III, Bruce L. Innis, Adolfo García-Sastre, Florian Krammer, Ralph S. Baric, Peter Palese. Vaccines (Basel) 2020 Dec; 8(4): 771. Published online 2020 Dec 17. doi: 10.3390/vaccines8040771.

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Newcastle disease virus (NDV) expressing the spike protein of SARS-CoV-2 as vaccine candidate. Weina Sun, Sarah R. Leist, Stephen McCroskery, Yonghong Liu, Stefan Slamanig, Justine Oliva, Fatima Amanat, Alexandra Schäfer, Kenneth H. Dinnon III, Adolfo García-Sastre, Florian Krammer, Ralph S. Baric, Peter Palese. bioRxiv 2020.07.26.221861; doi: https://doi.org/10.1101/2020.07.26.221861.

Engineered viral vaccine constructs with dual specificity: avian influenza and Newcastle disease. Park MS, Steel J, Garcia-Sastre A, Swayne D, Palese P. 2006. Proc Natl Acad Sci U S A. 2006 May 23; 103(21): 8203–8208. Published online 2006 May 22. doi: 10.1073/pnas.0602566103.

Letra de Médico - Salmo Raskin
(Gilberto Tadday/VEJA)
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