Riqueza no campo tem aumento recorde, mas candidatos não percebem
Não há debate sobre o futuro do país, mas o próximo governo assistirá à ascensão do Brasil à liderança mundial no comércio agrícola
Nunca se ganhou tanto dinheiro no campo. Neste século, o faturamento na agricultura e na pecuária já cresceu 190,2%.
Impressiona a velocidade da multiplicação da riqueza no interior do país nos últimos 21 anos, como indicam os dados mais recentes coletados pela Embrapa, empresa estatal de pesquisas rurais.
Nas lavouras, o valor da produção aumentou 193,7% acima da inflação do período. Na pecuária subiu 183,1%.
Os ganhos continuam crescendo em ritmo acelerado: aumentaram 29,2% no ano passado, quando comparados a 2019.
A expansão foi de 37,8% na agricultura e de 13,6% na pecuária. E o impulso segue firme neste ano, de acordo com as projeções.
O vigor no caixa dos produtores é consequência de um ciclo virtuoso, no qual coincidiram a ampliação da produção e da produtividade, com a incorporação de tecnologias; um ciclo de aumento de preços e, ainda, a valorização do dólar em relação ao real.
Essa transformação econômica do interior tem reflexos relevantes no mapa político brasileiro, mas partidos e candidatos ainda não se preocuparam com a dimensão das mudanças em curso.
Em geral, se limitam à visão urbana dos corretores do agronegócio, remancham em críticas rasas sobre a expansão na Amazônia, e contornam a lógica arcaica da eficiente “bancada do boi” no Congresso, a Frente Parlamentar da Agropecuária.
Num país onde a indústria virou terra arrasada, com peso similar ao que possuía na economia dos anos 40 do século passado (11% do PIB), o próximo governo terá de lidar com a ascensão do Brasil à liderança no comércio mundial de produtos agrícolas. É um bom problema.
Essa posição deverá ser assumida já em 2024, segundo ano do mandato do presidente que será eleito agora em outubro. É o que preveem entidades como a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
É óbvio que a política ambiental será fator um crítico na próxima administração. Não há como driblar as razões climáticas. No Cone Sul, por exemplo, já se enfrenta a maior seca dos últimos 90 anos. E na Amazônia, a tática do “liberou geral” para mineração e desmatamento tende a fomentar confrontos crescentes com os maiores clientes das empresas de agronegócio — as agruras da JBS nos Estados Unidos, atualmente, são exemplares.
É paradoxal, mas a cinco meses das eleições partidos políticos e candidatos presidenciais ainda não se preocuparam em apresentar propostas consistentes para o futuro urbano ou rural.
Não há debate sobre como reorganizar a falida base industrial urbana, em torno da qual se aglutina a maior fatia do eleitorado.
Nem mesmo sobre o que fazer no campo, onde a riqueza se multiplica de forma cada vez mais concentrada e em velocidade proporcional apenas à expansão dos conflitos agrários e à pobreza no entorno das cidades do interior.