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Lula planeja “tirar proveito” da ambiguidade com EUA e China

Otimismo do candidato tropeça na realidade da falta de infraestrutura. Para empresários, desenhou a alternativa: forte intervenção do Estado

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 1 ago 2022, 16h58 - Publicado em 31 jul 2022, 12h37

Numa reunião com um grupo de empresários, em Brasília, Lula resumiu como pretende, se eleito, moldar a política externa na ambiguidade das relações com os Estados Unidos e a China “para tirar proveito da chamada crise internacional”.

“Vamos colocar o Brasil como solução para quem está em crise”, disse a convidados da Confederação Nacional dos Transportes. “A China está em crise com os Estados Unidos? Vamos nos colocar à disposição da China para enfrentar os Estados Unidos. Os Estados Unidos estão em crise? Vamos nos colocar ao lado dos Estados Unidos para enfrentar a China.”

Completou: “Ou seja, o Brasil tem que tirar proveito do seu potencial. O Brasil tem que tirar proveito do fato de ser um país que não tem contencioso internacional, para que a gente produza e escoe essa produção e possa transformar esse país rico.”

Essa ideia de política externa baseada na ambiguidade e direcionada à disputa entre os Estados Unidos e a China pela hegemonia, tem inspiração no balé de Getulio Vargas com os EUA e a Alemanha na década de 30 do século passado. Vargas acabou forçado ao alinhamento com o governo americano, na guerra contra o regime nazista, mas assegurou a siderurgia em Volta Redonda (RJ), marco do ciclo industrial no Brasil.

No mundo de Lula, a premissa é a da oportunidade de atração de investimentos estrangeiros numa época em que todos os países começaram a rever sua dependência de sistemas integrados de abastecimento de commodities, de bens industriais e de serviços.

Eventos sucessivos como a pandemia de Covid-19 e a guerra da Rússia na Ucrânia provocaram uma desorganização da produção em escala global.

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Um exemplo doméstico das consequências está na escassez de insumos farmacêuticos e hospitalares, de matérias-primas para remédios e vacinas a equipamentos eletrônicos.

Outro está a paisagem morta das prateleiras das indústrias: 22 de 25 segmentos industriais, em todo o país, começam o mês de agosto com dificuldades na importação de 70% dos insumos e componentes essenciais nas linhas de produção. Montadoras de veículos e fabricantes de produtos de limpeza, higiene pessoal e perfumaria estão entre os mais afetados.

É fenômeno mundial e tem como epicentro os países asiáticos, principais beneficiários da fase de expansão das cadeias integradas de suprimento antes da pandemia e da guerra russa. Taiwan, um alvo político-militar permanente da China, concentra 27% da produção global de chips. Eventual conflito na região paralisaria todos os setores dependentes da tecnologia digital — das linhas de produção de smartphones e máquinas agrícolas às de navios e de mísseis balísticos intercontinentais.

Lula vê nesse cenário de “corrida” pela diminuição da dependência da Ásia uma oportunidade de política externa centrada na atração de investimentos dos Estados Unidos e da Europa.

O otimismo do candidato tropeça na realidade de um país sem infraestrutura. Ele reconhece. Para os empresários, desenhou uma alternativa: forte intervenção do Estado.

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“O Estado tem um papel preponderante”, explicou. “Eu não defendo o Estado empresário, eu defendo o Estado indutor. O Estado tem que induzir. quando houve a quebra do Lehmann Brothers [banco de investimentos cuja quebra foi o estopim da crise financeira global de 2008] quem interveio para consertar a situação foi o governo americano. Se ele não colocasse trilhões e trilhões de dólares, não teria resolvido a quebra do sistema financeiro. Quando houve a crise da pandemia do Covid, quem é que resolveu o problema? Foi o Estado, porque se o Estado não entra, não tem solução e o dinheiro que não existia apareceu.”

Prosseguiu: “Olha, se nós quisermos fazer com que esse país tenha a infraestrutura que ele precisa para dar o salto de qualidade que todos nós sonhamos, nós temos que fazer o dinheiro aparecer. E o dinheiro existe, posso dizer para vocês que o dinheiro existe. O Tesouro tem dinheiro. Acontece que burocrata-tesoureiro, tesoureiro pode ser de clube de futebol, de sindicato, ou da associação de catadores de lagartixa, tesoureiro tem o hábito de sentar em cima do dinheiro e dizer que nunca dinheiro para nada. Ele adora dizer que tem dinheiro em caixa. Pra mim, dinheiro em caixa é bom transformado em obra, rodovia, ferrovia, portos e aeroportos, enfim, transformado em empregos. Isso é que é um caixa bom, e é isso que eu vou fazer nesse país. Esperem que vocês vão ter boas e grandes surpresas com o que vai acontecer nos próximos quatro anos no Brasil.”

No projeto ainda em construção para um terceiro governo lulista, o capítulo sobre infraestrutura prevê mudança de rota do BNDES, tradicional sócio-financiador empreendimentos desse tipo. O banco público passaria a funcionar, basicamente, como agência estatal concessionária de garantias aos investimentos privados.

Os empresários se limitaram a escutar. Lula, como sempre, disse tudo aquilo que a plateia desejava ouvir.

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