Lula favorito é desafio para a limitada máquina eleitoral petista
PT tenta superar limitações da sua máquina eleitoral, consequência direta do encolhimento do partido nas disputas municipais dos últimos seis anos
A pesquisa Datafolha de ontem deu motivos para o Partido dos Trabalhadores resgatar o sonho da vitória de Lula no primeiro turno.
É matemática simples e legítimo: excluídas as intenções de voto nulo, em branco e aqueles que se declaram indecisos, o resultado é Lula com 54% dos votos válidos — três pontos além do necessário para liquidar a disputa presidencial no domingo 2 de outro.
Não é impossível, mas é difícil pelo histórico eleitoral do candidato e do seu partido, pelas condições adversas na batalha dos próximos quatro meses ou até pela eloquência realística do clichê — pesquisa é fotografia, eleição é filme de emoção.
A experiência leva alguns dirigentes petistas a trabalhar com cenários que julgam mais realistas, com olhos nas fragilidades.
Uma delas é a redução da estrutura de campanha em relação à existente no ciclo áureo de Lula-Dilma, entre 2002 e 2014.
As limitações da máquina do PT hoje, para o corpo-a-corpo na caça aos votos na base do eleitorado, são consequência direta do encolhimento do partido nas disputas dos últimos seis anos.
Entre 2016 e 2020, por exemplo, o número de prefeituras petistas caiu 29,5% (de 254 para 179).
Eleições municipais, constatam pesquisadores como Antônio Lavareda e Helcimara Telles, costumam sinalizar tendências para as disputas nacionais dois anos depois.
Esse é o foco das preocupações de parte da cúpula do PT. O desafio previsível é driblar as sequelas dessa regressão na máquina eleitoral nos municípios.
Requer planejamento e organização, paradoxalmente escassos na campanha de Lula, nessa etapa, assim como recursos financeiros, materiais de campanha e, sobretudo, líderes municipais para realizar a tradicional intermediação com diferentes segmentos de eleitores.
Até 2014 havia fartura. Se passaram oito anos. “Se o partido reverter [a lógica da sinalização das eleições municipais], crescendo ao invés de diminuir, em 2022, será algo inédito” — registraram analistas da Vector Research em relatório enviado ontem a investidores, com base em consultas na cúpula petista.
A empatia de Lula, somada às engrenagens dos aliados, poderia ser suficiente, levando-se em conta o cenário favorável de hoje desenhado em pesquisas como a do Datafolha.
Há pela frente, no entanto, uma eternidade de quatro meses numa disputa onde a polaridade Lula-Bolsonaro é tendência, com todas ressalvas adequadas.
Se mantida, do outro lado há um adversário cuja base de aliados (PP, PL e Republicanos) é relativamente mais densa do que a do PT no domínio de estruturas partidárias regionais e municipais.
Ela sustenta o governo no Congresso e nos últimos dois anos recebeu oito de cada dez reais dos recursos federais liberados no chamado orçamento paralelo.
Pelas contas da Comissão de Orçamento do Senado foram cerca R$ 30 bilhões, dos quais um terço usados para engajar prefeitos, vereadores e deputados estaduais na campanha de reeleição de Bolsonaro. E o governo nem começou a usar o arsenal financeiro construído para a campanha. Existe aí uma nítida desvantagem para o PT de Lula, há seis anos longe do poder.
Em contrapartida, observa-se uma prolongada estagnação do presidente-candidato nas pesquisas com elevada rejeição (53% no levantamento do Datafolha).
Aparentemente, Bolsonaro não se recuperou junto aos eleitores do desgoverno na pandemia. E ainda não conseguiu apresentar-lhes uma alternativa à inflação crescente e disseminada, que corrói a capacidade de sustentar o padrão de vida das famílias.
Eles culpam o governo, Bolsonaro finge que não é com ele, passa o tempo tentando mudar de assunto. Por isso, patina nas pesquisas.