Lula e governadores disputam uma política de segurança inexistente
Há uma crise de insegurança pública, destacada pelos eleitores nas pesquisas recentes como principal problema nacional, ao lado da corrupção
Governadores do Sul e Sudeste anunciam para hoje, em Brasília, a apresentação de projetos para dar “maior efetividade às ações e políticas de segurança pública”.
É relevante, entre outras razões, porque governam sete Estados onde vivem 56% da população (114 milhões de pessoas) e são responsáveis por dois terços da riqueza nacional.
O Sul e o Sudeste sediam as organizações brasileiras que estão se tornando transnacionais no mapa-múndi do crime organizado e possuem uma força de segurança pública (civil e militar) equivalente a 60% do efetivo das Forças Armadas.
Essa iniciativa dos Estados tem dois aspectos básicos, e em ambos é limitada. Um é o da anunciada “integração” para cooperação entre Estados na vigilância e repressão. Outro é o que os governadores definem como “inovações legislativas” — na essência, um endurecimento das normas e procedimentos aplicáveis nos casos de “crimes graves e de natureza violenta”.
Na prática, é um roteiro político de sete governadores em resposta ao vazio deixado pelo governo federal que, até agora, não esboçou um plano consistente e abrangente para a crise de insegurança pública, destacada pelos eleitores nas pesquisas recentes como principal problema nacional, ao lado da corrupção.
Lula exibe um esforço bem-sucedido na área de segurança pública. Seu governo conseguiu estabelecer novo padrão de desempenho na ação policial com a força-tarefa federal no Rio para desvendar os assassinatos da vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes.
A Polícia Federal está mostrando a versão carioca da narcomilícia que avança na corrosão das instituições — governo, prefeitura, assembleia, câmara de vereadores. O modelo de contaminação institucional varia, mas se espraia pelo país. O êxito no Rio pode ser referência, mas continua sendo pontual.
Na prática, Lula e governadores disputam uma política de segurança que não existe.
O pacote dos governadores contém ideias atrativas para um Congresso focado nas eleições municipais de outubro. Vale lembrar que as pessoas moram nas cidades, e não nos Estados ou na União. E, também, que é nas municípios onde se consolidam os acordos políticos e se montam estruturas partidárias vitais à temporada eleitoral seguinte (no caso, em 2026 quando serão eleitos presidente, governadores, senadores e deputados federais).
Se atende a objetivos político-eleitorais e administrativos, também não formata nem oferece a resposta abrange e necessária para uma política nacional de segurança pública. No entanto, apresenta a chance de abertura de um debate mais amplo no governo federal e no Congresso, muito além do habitual punitivismo.
Nem mesmo é possível agrupar todos os sete governantes do Sul-Sudeste numa imaginária bancada de oposição tenaz ao governo Lula. A moderação e o zelo pela fluidez nas relações com o Palácio do Planalto têm servido de bússola a Tarcísio de Freitas (SP), Eduardo Leite (RS), Carlos Massa Jr. (Paraná) e Claudio Castro (RJ). Já Romeu Zema (MG) e Jorge Mello (SC) escolheram permanecer anódinos. E Renato Casagrande (ES) é associado ao conglomerado partidário governista, via PSB.
A oferta dos governadores contém ideias atrativas para um Congresso focado nas eleições municipais de outubro. A ocasião eleitoral renova o risco de populismo. Mas, vale lembrar que as pessoas moram nas cidades, e não nos Estados ou na União. E, ainda, que é nos municípios onde se consolidam os acordos políticos e se montam estruturas partidárias vitais à temporada eleitoral seguinte (no caso, em 2026 quando serão eleitos presidente, governadores, senadores e deputados federais).
Se o pacote atende a objetivos políticos imediatos, não formata nem oferece a resposta abrangente e necessária para uma política nacional de segurança pública. Em tese, pode vir a representar a chance de abertura de um debate mais amplo, muito além do habitual punitivismo.
Lula, os governadores, o Congresso e o Judiciário estão reféns das próprias fragilidades diante da pressão social derivada da percepção coletiva de insegurança pública. Partidos e governos nunca se preocuparam com o problema. Limitaram-se a respostas episódicas e, frequentemente, alegóricas no aumento de punições. O Judiciário se mantém à margem, entretido e aparentemente perdido em revisões da labiríntica jurisprudência.
O resultado está aí. É uma crise nacional, com eleitores espera de respostas objetivas.