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Janela para Tóquio

Por Piti Koshimura Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Um olhar para o cotidiano da cidade olímpica
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Tatuagem no Japão: um tabu associado à máfia

As marcas no corpo nasceram como arte mas hoje são vetadas em muitos lugares públicos. Em Tóquio , desembarcam na pele de dezenas de atletas

Por Piti Koshimura
Atualizado em 31 jul 2021, 15h55 - Publicado em 31 jul 2021, 10h37
18.07.2021 - Jogos Olímpicos Tóquio 2020 - Retrato de Bruno Fratus, nadador e atleta olímpico da equipe do Time Brasil após o treino na cidade de Sagamihara, Tóquio. Foto: Jonne Roriz/COB
Nadador brasileiro Bruno Fratus é um dos vários atletas tatuados em Tóquio (Jonne Roriz/COB/Divulgação)

Se, pela TV, acompanhamos um desfile de tatuagens no corpo dos atletas, nas ruas, a realidade é outra. Ostentar a pele marcada em espaços públicos no Japão é algo cercado por restrições e tabus associados a uma das máfias mais famosas do mundo.

Tatuados que querem passar pela experiência do banho de onsen sabem bem disso. As estâncias de banhos termais, muito apreciados na cultura japonesa, costumam banir a entrada de pessoas com tatuagem. A proibição acaba sendo uma forma de barrar relações diretas com a Yakuza, organizações criminosas japonesas cujos membros exibem belíssimos traços na pele. 

Uma das duas tatuagens que me impediram que frequentar um banho coletivo de águas termais no Japão
Uma das duas tatuagens que me impediram de frequentar um banho coletivo de águas termais no Japão (Piti Koshimura/VEJA)

Mesmo quem tem tatuagens mais singelas, como essa que vos fala, acaba sendo atingido por essas limitações. Num onsen em Hakone, cidade conhecida por suas águas termais, fui alertada na recepção de que minha pele marcada poderia ser um impedimento para um banho relaxante. Não tão vistosas assim, mas grandes demais para serem cobertas por um band-aid, como havia sugerido a funcionária, os desenhos na minha pele acabaram me encaminhando a um onsen privativo — um desfecho feliz, já que a grande maioria de estâncias oferecem apenas a opção de banhos coletivos. 

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E antes que imaginem que usar um maiô cobrindo tudo fosse uma solução possível, vale falar que, no Japão, entramos nas águas termais nus em pelo, depois de lavarmos bem o corpo numa área de banho, também coletiva. Garantimos, assim, a manutenção da limpeza das águas, num ritual de comunhão total com a natureza, onde a nudez é encarada sem pudores.

TOK02. TOKIO, 27/12/07.- Miles de japoneses aprovechan la Navidad para escapar del bullicio de las grandes urbes y sumergirse en las aguas termales de sus populares balnearios, los onsen, una forma de relajación milenaria que vive con el frío su mejor momento. Cuando las temperaturas comienzan a descender en todo Japón arranca la temporada alta en estos balnearios naturales distribuidos por todo el país, que suman más de 3.000 establecimientos gracias a la actividad volcánica que bulle bajo el archipiélago nipón. En la foto el onsen Takaragawa, uno de los mayores y más hermosos balnearios al aire libre del país. Este onsen, que suma más de cien años de tradición, se enclava en un estrecho valle entre montañas, repartido entre las dos orillas de un riachuelo, en la provincia de Gunma, a un par de horas de Tokio. EFE/Juan Palop
Banhos termais onsen são uma tradição japonesa (Juan Palop/EFE)

Levantando um pouco da história, é curioso observar o rumo que as tatuagens tomaram no Japão. De acordo com um estudo da Universidade de São Francisco, há indícios de que, na Era Edo (1603 a 1868), período de grande florescimento cultural no Japão, as tatuagens eram feitas por artistas de ukiyo-e. Tendo Hokusai como seu expoente mais conhecido, o estilo de xilogravura de apelo popular representava cenas do “mundo flutuante” japonês, focando no estilo de vida hedonista da época. 

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O cenário mudou com as transformações do Período Meiji, quando o Japão abriu portos e fronteiras, passando a estabelecer contatos intensos com os Estados Unidos e a Europa. Em 1872, tanto tatuar quanto expor publicamente tatuagens acabou sendo proibido — decisão que só foi revista em 1948. O estigma da ilegalidade, no entanto, perdura até hoje, com o reforço da máfia. 

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Membros da Yakuza costumam exibem belíssimos traços na pele (//Reprodução)

Nessa época de abertura do país, que havia passado mais de dois séculos praticamente fechado para troca com estrangeiros, muitos costumes e elementos da cultura japonesa acabaram sendo filtrados pelo governo, pelo risco de serem considerados “bárbaros” ou “exóticos” demais ao olhar ocidental. Tentando ganhar a admiração das potências da época, a tatuagem acabou entrando nesse barco. Mal sabiam que tatuagens seriam elevadas ao status de arte, sendo apreciadas pelo resto do mundo — inclusive pela elite de atletas que compete hoje em Tóquio. 

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Piti Koshimura mora em Tóquio, é autora do blog e podcast Peach no Japão e curadora da Momonoki, plataforma de cursos sobre o universo japonês. Amante de arquitetura e exploradora de becos escondidos, encontra suas inspirações nos elementos mundanos. (@peachnojapao | @momonoki_jp)

 

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