“O Terremoto”: o discreto charme do filme-catástrofe norueguês
Nos cinemas, continuação do sucesso espontâneo “A Onda” mantém os mandamentos do filme original: drama, foco nos personagens e uso criterioso dos efeitos
Lançado em 2015, o filme A Onda se espalhou de maneira lenta mas certeira pelas listas de favoritos mundo afora: se o cinema norueguês – e o escandinavo em geral – é muito mais conhecido por dramas austeros que por produções para grande público, ali estava uma novidade capaz de combinar essas duas coisas de maneira orgânica e eficaz. Com muito critério, o diretor Roar Uthaug arejava o gênero pondo de lado o gigantismo genérico da maioria dos disaster movies americanos (que, verdade seja dita, às vezes se saem com exceções deliciosas, como O Dia Depois de Amanhã), concentrando-se no crescendo de tensão e no drama de um punhado de personagens, e reservando os efeitos de destruição (aliás, muito bem-feitos) para algumas cenas-chave – que, justamente pela sua economia, ganhavam muito mais força. A Onda está disponível na Netflix e na GloboPlay, e recomendo uma espiada: Kristoffer Joner, um ator de olhos tristes, faz o geólogo Kristian, que detecta uma movimentação anormal na estação que monitora. Investiga daqui, investiga dali, e Kristian descobre que tem míseros dez minutos para dar o alarme e evacuar a cidadezinha: a montanha acima do fjorde está para desabar e, assim que isso acontecer, uma onda de quase 90 metros vai se abater sobre o vale onde ele mora com a mulher e o casal de filhos, e onde estão todos os amigos e colegas que importam em sua vida.
A Onda termina muito mal para muitos e razoavelmente bem para alguns, e é com esse saldo que começa O Terremoto, já em cartaz nos cinemas. Apesar de ter se salvado, Kristian não se considera afortunado: está mergulhado na culpa dos sobreviventes, acusando-se por não ter compreendido antes o perigo e assim poupado mais vidas. De tão abalado, ele nem consegue mais funcionar; afastou-se do trabalho e também da família, que se mudou para a capital norueguesa, Oslo. Em uma visita à ex e os filhos, Kristian de novo topa com evidências de que um cataclismo de grandes proporções se aproxima, e toca correr contra o relógio para tentar convencer as agências governamentais de que a sua interpretação dos dados é que é a correta. (A Noruega é mais sujeita a deslizamentos que a tremores, mas Oslo de fato foi colocada em pânico por um terremoto em 1904. Embora ele não tenha sido de grande magnitude, ocorreu perto da superfície, na falha geológica que corre sob o fjorde da cidade – ou, mais precisamente, em dezoito epicentros diferentes ao mesmo tempo.)
Como em todo filme-catástrofe, O Terremoto depende de algumas decisões bastante tolas dos personagens para criar situações de clímax – incluindo aquela muleta habitual do gênero, a criança que sai das vistas dos adultos para resgatar o cachorrinho ou bichinho de pelúcia deixado para trás. Mas o novo diretor, John Andreas Andersen, segue firmemente os preceitos deixados por Roar Uthaug: foco fechado em uns poucos personagens, dramas íntimos que influenciam o cenário maior, tensão que se acumula aos poucos porém sem pausa, e bons efeitos usados com o máximo proveito em um número não muito grande de sequências. Não vou chegar ao ponto de dizer que seja inovador. Mas é com certeza sólido, e também revigorante.
Trailer
O TERREMOTO (Skjelvet/The Quake) Noruega, 2018 Direção: John Andreas Andersen Com Kristoffer Joner, Ane Dahl Torp, Kathrine Thorborg Johansen, Stig R. Amdam, Edith Haagenrud-Sande, Jonas Hoff Oftebro Distribuição: Califórnia |