Força em expansão: por dentro da fantástica fábrica da saga Star Wars
Com a saborosa série 'Skeleton Crew', a franquia amplia sua galáxia e o legado de George Lucas — VEJA conheceu de perto a usina criativa que mudou o cinema

Há muito tempo, nos anos 1970, em uma galáxia muito, muito distante, conhecida pelo nome de Califórnia, nos Estados Unidos, o cineasta e idealista George Lucas criou a epopeia espacial Star Wars. Na época, Hollywood viu o projeto com desconfiança — dois estúdios recusaram o roteiro e até os atores pensaram que aquilo daria errado. Visionário, Lucas tinha confiança no que fazia: ao assinar com a Fox para produzir o primeiro filme, Star Wars: uma Nova Esperança, de 1977, ele exigiu no contrato ao menos duas sequências. A força estava com ele, como ficou comprovado depois.

Passadas quase cinco décadas, Star Wars soma onze filmes e possui ramificações em videogames, livros, animações e seriados de TV. Esse último substrato acaba de ganhar um novo reforço, a série Skeleton Crew, da plataforma Disney+. A produção, estrelada por Jude Law na pele de um trambiqueiro do espaço acompanhado de um grupo de crianças, age em duas frentes: de um lado, mira em rejuvenescer o público da franquia; de outro, quer fisgar adultos com o sabor da nostalgia. Na onda de Stranger Things, da concorrente Netflix, a série flerta com clássicos como E.T. — O Extraterrestre (1982) e Os Goonies (1985) ao seguir quatro jovens que encontram uma nave e ficam perdidos no cosmos. Para voltar para casa, eles enfrentam vários perigos, especialmente a ameaça de piratas intergalácticos. “O desejo de explorar o mundo é parte essencial da infância”, disse a VEJA o criador da série, Jon Watts, que ganhou moral em Hollywood ao dirigir a recente e bem-sucedida trilogia do Homem-Aranha.
Na empreitada televisiva, Star Wars conta com acertos louváveis, caso de The Mandalorian e Andor, e erros retumbantes, a exemplo da caótica The Acolyte. Ao contrário de outros universos expandidos, como o da Marvel, no qual as conexões entre um título e outro são essenciais e complicadas, o time de Star Wars tem como meta desenvolver histórias independentes. “Nosso horizonte é criar a partir das influências originais de George Lucas”, revela Watts. Assim como o cineasta criou uma trama de ação para explorar as fronteiras entre o bem e o mal, as séries derivadas usam da mesma mitologia para observar temas mais humanos e profundos. The Mandalorian é um faroeste sobre traumas, paternidade e liberdade. A excelente Andor mostra o dia a dia de quem ganha e de quem perde em uma sociedade autoritária. Mais leve, Skeleton Crew mergulha no frescor da curiosidade juvenil e no poder da amizade. Assistidas individualmente, as séries se sustentam sozinhas.

Mas manter a unidade é essencial — e aí faz diferença o valoroso time de efeitos visuais e de som. Quando Lucas criou Star Wars, não existia uma empresa voltada exclusivamente para essas tecnologias. Ele então fundou, em 1975, o estúdio Industrial Light & Magic (ILM). De lá saíram truques inovadores, além de câmeras e sistemas específicos para dar mais veracidade às cenas, a exemplo do método de captura de movimento que filma atores para depois transformá-los em outros seres. O estúdio ainda foi berço do Photoshop, famoso programa de manipulação digital de imagens. Em 2005, a empresa se instalou em um confortável condomínio de quatro prédios em São Francisco, no norte da Califórnia, onde ainda atua atendendo a uma parcela generosa da indústria: os recentes Wicked e Gladiador II, por exemplo, passaram pelas mãos dos profissionais do ILM.
Hoje aposentado e com 80 anos, George Lucas deixou um legado imensurável para o mercado do audiovisual. Já seu valor financeiro ganhou um preço em 2012, quando ele vendeu seu império para a Disney por 4 bilhões de dólares. Os profissionais do ILM ainda seguem a filosofia que deu origem à empresa, resumida na frase: “practical when possible”. Adaptando para o português, significa que, sempre que possível, os efeitos devem ser produzidos de forma prática e até artesanal, sem interferência digital. Em visita ao estúdio, a reportagem de VEJA viu de perto maquetes usadas nas gravações de títulos da saga, além de outros itens históricos, como um dinossauro de Jurassic Park. “Nosso modo de trabalhar faz com que os efeitos sejam mais duradouros”, disse Shawn Kelly, supervisor de animação.

Um exemplo notável é Neel, o garoto-elefante de Skeleton Crew: o personagem é uma combinação de efeitos digitais e cenas feitas pelo jovem ator Robert Timothy Smith com uma cabeça de elefante que possuía uma tela para sua respiração — detalhe apagado posteriormente. Suas feições eram manipuladas por um marionetista munido de um controle remoto por trás das câmeras. Outro detalhe prático que se repete em todo Star Wars é a criação da nave espacial específica de cada trama. Geralmente, elas são maquetes reais com cerca de 1 metro de comprimento, filmadas por câmeras em movimento no estúdio — o que resulta na cena típica da nave estática cercada por estrelas aceleradas.

Para o futuro, Star Wars já tem oito projetos no gatilho, entre eles novas temporadas das séries Andor e Ahsoka e uma nova trilogia de filmes sob a batuta do produtor Simon Kinberg, responsável pelos longas dos heróis X-Men. A expansão desse universo admirável está longe do fim.
Publicado em VEJA de 13 de dezembro de 2024, edição nº 2923