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Dora Kramer

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Imune não é impune

Imunidade obedece à regra legal. Impunidade atropela o que diz a lei

Por Dora Kramer Atualizado em 20 out 2017, 06h00 - Publicado em 20 out 2017, 06h00

Dias atrás uma amiga muito atenta ao atual andar da carruagem nacional me fez uma pergunta bastante relevante. Tão pertinente ao interesse geral quanto objeto de indiferença por parte daqueles que, como eu, vivem enredados nas entranhas da política: “Dorinha (assim me conhecem os íntimos mais antigos), qual a diferença entre imunidade e impunidade?”.
Ela — chama-se Lavínia — estava intrigada com o caso do senador Aécio Neves, impedido de exercer o mandato por ordem do Supremo Tribunal Federal e liberado da restrição por decisão do Senado. Levei um susto. Até ouvir a coisa posta assim, confesso, não tinha pensado na existência de discrepância entre os conceitos. Muito menos havia cogitado da necessidade de esmiuçar um e outro a fim de ampliar o acesso aos meios e modos da atividade político-parlamentar.

Pois se Lavínia estava em dúvida, imagino que em dúvida estejam os leitores. Vamos lá: o que é imunidade? Trata-se de uma prerrogativa em geral assegurada em lei. Leia-se também como privilégio e/ou vantagem, mas não há nas imunidades nada de ilegal. Gostemos ou não, justas ou injustas, são salvaguardas legalmente sustentadas. Garantem ao parlamentar o direito de voz e voto, asseguram ao cidadão a liberdade de expressão.

Impunidade ocorre quando a transgressão sai de graça e o transgressor, portanto, imune. Os conceitos se cruzam pelo caminho, embora jamais possam ser entendidos como tradução um do outro. Tomemos o caso do senador Aécio Neves, a fim de esclarecer por completo a dúvida de nossa personagem: o Senado entendeu por maioria que Aécio é imune à decisão do Supremo Tribunal Federal de afastá-lo da função legislativa com acréscimo de recolhimento noturno, mas isso não torna o senador necessariamente impune perante a lei.
A investigação sobre o pedido de dinheiro ao empresário Joesley Batista prossegue e, caso fique configurado que se tratou de ato de corrupção, haverá processo, julgamento, acusação, defesa, condenação ou absolvição. Assim é nos países civilizados, nem sempre foi no Brasil e, graças à atuação de juízes cônscios daquilo que a eles concerne por dever de ofício, começou a vigorar entre nós desde o julgamento do mensalão.

Ali, cinco anos atrás, houve um divisor. As coisas não se resolveram no país, mas tomaram um novo rumo. Imunidade já não se confunde com impunidade, não obstante os esforços de gente como Jader Barbalho, Renan Calheiros e Romero Jucá para manter o Brasil atrelado a um passado que já passou.

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Em 2012, quando do exame da ação 470, o STF deu um aviso geral aos navegantes dos altos escalões da República: queiram ou não, há um momento em que o vigor dos fatos se impõe. Seja qual for o desfecho. Vamos, sim, avançar, quando e se o ato do Supremo for entendido como o marco de um recomeço. A adoção de parâmetros mais adequados à boa prática institucional que nos convém e torna a todos democraticamente mais saudáveis.

Publicado em VEJA de 25 de outubro de 2017, edição nº 2553

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