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Ser amável faz bem à saúde

A sabedoria popular e a ciência de ponta assinam embaixo

Por Lucilia Diniz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 5 jul 2024, 12h13 - Publicado em 5 jul 2024, 06h00

Para nós parecia impossível que alguém naquele romântico restaurante em Coimbra pudesse ter uma noite desagradável. Um episódio, no entanto, contrariou nossa convicção e mostrou que os maus sentimentos podem azedar a melhor das refeições. Escolhíamos os pratos quando uma família com filhos entrou. Os meninos estavam comportados, mas a presença deles incomodou o casal ao lado. A cada movimento da prole, o homem torcia os lábios. Quando um dos pequenos fez soar seu garfo contra uma taça, foi a gota d’água. Ele deixou a namorada sozinha na mesa e foi ter com o maître: “Como uma casa daquelas permitia crianças?”.

Naquela altura, o resmungão não conseguia mais evitar o estresse. Sentia as borboletas esvoaçarem em seu estômago — uma expressão comum nos Estados Unidos para descrever a energia nervosa reverberando na barriga durante um pico de ansiedade. Insistir na refeição só lhe causaria indigestão e arruinaria uma noite que, com um mínimo de empatia, poderia ter sido perfeita.

A cena me fez lembrar de uma frase do escritor Henry James: “Há três coisas importantes na vida. A primeira é ser gentil. A segunda é ser gentil. A terceira é ser gentil”. Enquanto a família seguiu seu jantar em harmonia, o casal emburrado certamente terminou o programa com o corpo e o espírito pesados. A indigestão não é o único mal que a falta de empatia causa. A ciência cada vez mais busca comprovar a relação entre os bons sentimentos e uma vida melhor. A gratidão, a bondade, o otimismo, o perdão e a alegria vêm sendo associados a ganhos em bem-estar físico e mental.

“Caso ser afável em nome de um mundo melhor não lhe pareça suficiente, pratique a gentileza por você mesmo”

A sabedoria popular diz que a bondade faz bem à saúde. Em diferentes culturas, provérbios traçam esse elo. Deve-se “fazer o bem sem olhar a quem”, confiando que “aquele que dá recebe em dobro”. Num lema bem brasileiro, que já inspirou um texto meu, “gentileza gera gentileza”.

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Dizem que a generosidade real é desinteressada. Mas qual o mal de colher os bons frutos que ela nos devolve? Nesse contexto, talvez meu ditado predileto seja: “O coração generoso é sempre jovem”. Resume de forma singela a noção de que corpo, consciência, emoções e relacionamentos não são instâncias separadas.

Até a genética explica o porquê. Na escola, o DNA é apresentado como uma sequência previsível, responsável por escrever a história de cada um. Mas pode-se alterar, ao menos em parte, a mensagem proposta pelo nosso alfabeto pessoal. Pesquisadores investigam como o estilo de vida age sobre os genes e biomarcadores do envelhecimento chamados telômeros. O nome grego significa “parte final”, porque ficam na ponta dos cromossomos, evitando seu desgaste. Conforme passa o tempo, os telômeros encurtam e deixam de cumprir sua função. Esticá-los é esticar a vida.

Segundo estudos, não só os cuidados imprescindíveis — como não fumar, se alimentar bem e praticar atividade física — conservam os telômeros. Também os bons sentimentos contribuem para isso. Ao longo da evolução, a bondade foi uma estratégia de sobrevivência. Os grupos unidos por uma noção de pertencimento são mais fortes do que os que se juntam à força, pela coerção ou contra um inimigo comum. Mas, caso ser afável em nome de um mundo melhor não lhe pareça suficiente, pratique a gentileza porque faz bem a você mesmo.

Publicado em VEJA de 5 de julho de 2024, edição nº 2900

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