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Grãos de vida

O milho, da origem do homem à pipoca no cinema

Por Lucilia Diniz
25 jul 2024, 16h53

Dizem antigos mitos mexicanos que os deuses usaram o milho para moldar o homem. É uma metáfora eloquente sobre o papel vital desse grão no país onde, há cerca de 9.000 anos, foi domesticado. Dele se fazem as onipresentes tortillas e mais de 700 outras receitas, um fator de orgulho e união nacional existente em um arco-íris de variedades, do branco ao preto, do amarelo ao marrom, ao roxo e ao azul.

De lá o milho se espalhou para o sul e para o norte das Américas. Quando Colombo chegou à ilha Hispaniola – hoje dividida entre Haiti e República Dominicana – viu que os nativos aproveitavam tudo da planta que chamavam “mahiz”, fosse para alimentar os animais, preparar beberagens alcoólicas e açúcar, cobrir as casas ou nutrir a população.

Na lista dos ingredientes levados pelos colonizadores, o milho foi um dos primeiros, por ser muito adaptável e produtivo – em menos de quatro meses se vai da semente à espiga. Por isso, foi também muito importante.

Na Espanha, destinou-se inicialmente aos animais. Com a polenta, a Itália foi uma das pioneiras em levar o cereal à mesa dos homens. Lá ficou conhecido como “granturco”, grão turco, por ter chegado ao país pelos Bálcãs, então parte do Império Otomano. Os italianos adotaram tão bem a receita que desenvolveram cultivares de milho específicos para ela.

Com o tempo, o mundo todo passou a se valer do grão. Recentemente, aprendi em um restaurante indiano de Londres uma receita de “costelas de milho”. Cortadas em finas tiras e levadas ao calor do forno, temperadas com especiarias orientais, as espigas se encurvam lembrando o corte suíno, daí o nome.

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Como tantos outros produtos das colônias, o milho cumpriu seu papel contra a escassez no Velho Continente em repetidas ocasiões, substituindo o trigo – embora não seja equivalente a esse cereal, tendo menos proteína.

Já aqui no Brasil ele se tornou popular pelo que é, e não no lugar de outro alimento. Tão frequente é em nossas roças, onde seus sabugos rendiam bonequinhos singelos, que foi parar nos livros como o sábio Visconde de Sabugosa – é quase como se Monteiro Lobato quisesse nos dizer que, no milho, até os despojos têm conteúdo.

O mais comum aqui é o milho verde, chamado assim por ser colhido jovem, ainda tenro, comido na espiga ou em preparos como curau e pamonha. Outras variedades do grão nos dão a canjica e o munguzá, sem falar nas diferentes farinhas que servem para cuscuz, farofas e bolo de fubá.

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Mas talvez a forma mais cotidiana de consumir milho seja a pipoca. Uma lenda diz que os indígenas americanos a serviram no primeiro Dia de Ação de Graças, mas o fato, mesmo, é que veio dos Andes o tipo de milho que, por ter a casca tão dura, estoura sem queimar ao ser exposto ao calor.

Rica em fibras, se preparada sem óleo, em um saco de papel no micro-ondas, pode ser um bom lanche. Não é o caso das versões industriais, nem da amanteigada pipoca de cinema.

Esse costume, sim, se originou nos Estados Unidos. Na Grande Depressão, era um passeio acessível ver um filme munido de um saquinho de milho estourado. Assim se popularizou, até cinema e pipoca se tornarem um binômio indissociável para muitos – e, para outros, um incômodo, pelo barulho. Pessoalmente, evito: comer na frente da tela é um convite a comer em excesso. Trocadilhos à parte, um hábito explosivo.

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