Último Mês: Veja por apenas 4,00/mês
Imagem Blog

Coluna da Lucilia

Por Lucilia Diniz Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Um espaço para discutir bem estar, alimentação saudável e inovação
Continua após publicidade

Doa a quem doer

A verdade que se esconde no sincericídio

Por Lucilia Diniz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 21 jun 2024, 13h25 - Publicado em 21 jun 2024, 06h00

A espontaneidade infantil é bem conhecida. Toda família tem sua coleção de episódios de franqueza extrema que, se na hora causam embaraço, depois são recordados com risadas. Porém, se toleramos a falta de limites das crianças é por ela ser passageira. Com o tempo, nos moldamos às regras do bom convívio e adquirimos “filtro”. Sendo assim, como se explica que pessoas maduras percam o crivo e se entreguem à incontinência verbal por escolha, mesmo sendo conhecedoras das convenções sociais?

O termo “sincericídio”, dado ao ímpeto excessivo pela verdade, é eloquente: ele é um ataque de sinceridade mortal. Para os psicólogos, o sincericida é alguém que se crê injustiçado. Ele usa a honestidade como uma arma para cobrar, doa a quem doer, o que acha que o mundo lhe deve. Em diferentes medidas, acredito que raiva, ilusão de poder e vaidade são alguns dos sentimentos que fazem aflorar o “sincerão” em nós. Se, em jornais e conversas, a expressão aparece cada vez mais, é porque a atitude está em alta. Surge tanto em colocações pessoais acaloradas quanto em declarações públicas. Às vezes, é um lapso; em geral, é uma afirmação calculada para causar impressão.

Eu mesma não escondo ter tido momentos assim. Lembro, não exatamente com orgulho, da resposta atravessada que dei quando um chef me serviu um risoto cuja consistência mal mascarava o uso de creme de leite. Da mesma forma, denunciei doces que se diziam “zero” sem ser. Era o início de minha carreira. Dedicada e séria, exigia dos demais rigor igual ao meu. Nessas ocasiões, deixei claro que não seria enganada por quem escolhesse caminhos fáceis. Hoje, talvez eu evitasse alguns embates desnecessários.

“Do escritor francês André Maurois: ‘A sinceridade é de vidro, e a discrição, de diamante’ ”

Em toda parte, haverá quem se creia acima do bem e do mal, sentindo-se autorizado a proferir suas opiniões com segurança desbragada, mesmo quando elas não são solicitadas. Essa maneira de agir é imprudente. Porque, é importante lembrar, os sincericidas não são apenas soldados armados com uma “metralhadora cheia de mágoas”, como diz a famosa canção de Cazuza. Embora esses arroubos possam acertar muitos pelo caminho, também quem dispara pode ser atingido pelos efeitos de suas próprias palavras. Não à toa os sincericidas são às vezes chamados “camicases da verdade”. Como esses pilotos japoneses da Segunda Guerra, eles não só lançam sua bomba, mas se atiram com ela contra o alvo. Por falar demais, o sincericida pode perder um amigo, azedar um negócio e até ver sua reputação ser jogada na lama. Portanto, é bem comum que, depois da falta de medida, venha o arrependimento.

Continua após a publicidade

A honestidade é qualidade a defender. Ter apego aos seus valores, manter uma linha coerente entre o que pensamos, dizemos e fazemos é louvável. Mas ser sincericida não é ser sincero — é ser um tanto inconsequente. Porque mesmo ao conversarmos com aqueles em quem mais confiamos, nas situações mais privadas, podemos sempre escolher medir as palavras. E o que, então, é ser sincero? Para o escritor francês André Maurois, a sinceridade não está em dizer tudo o que se pensa, mas em não dizer nada contrário ao que se pensa. Ou, como ele resume em uma afirmação conhecida, com a qual me alinho: “A sinceridade é de vidro, e a discrição, de diamante”.

Publicado em VEJA de 21 de junho de 2024, edição nº 2898

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Veja e Vote.

A síntese sempre atualizada de tudo que acontece nas Eleições 2024.

OFERTA
VEJA E VOTE

Digital Veja e Vote
Digital Veja e Vote

Acesso ilimitado aos sites, apps, edições digitais e acervos de todas as marcas Abril

1 Mês por 4,00

Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (equivalente a 12,50 por revista)

a partir de 49,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$118,80, equivalente a 9,90/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.