“E mais um ano se passou!” Nas últimas horas que antecederam o réveillon, certamente fizemos comentários como esse. Da mesma maneira que fizemos no fim do ano passado, e do ano anterior, e de todos os outros que vieram antes. A diferença, talvez, é que os intervalos entre os comentários parecem menores a cada vez. “Sim, e passou voando”, ouvimos provavelmente em resposta.
Todos nós já experimentamos a sensação de que não apenas o tempo passa rápido como passa cada vez mais rápido. Só as crianças, ansiosas pela juventude, ficam amuadas ao constatar a lentidão do tempo. A aritmética básica ajuda a explicar a percepção de cada faixa etária. Para uma criança de 5 anos, um ano a mais representa consideráveis 20% da existência; já para quem tem 50, são só 2% a mais. O resultado é a impressão de que quanto mais vivemos, mais o tempo recente parece relativamente menor ao tempo vivido.
A previsibilidade de uma rotina monótona tem peso decisivo nessa percepção. Quando nos esquecemos de desligar o piloto automático, os dias se tornam indistintos, e por isso se sucedem em ritmo acelerado. O trabalho sem desafios, o relacionamento sem manifestações de afeto, o cotidiano que apenas repete situações, as tarefas das quais nos desincumbimos irrefletidamente — tudo isso desestimula a mente, faz com que o nosso cérebro não preste atenção no instante vivido. Aquilo que não mais nos emociona nem nos chacoalha parece contribuir para fazer nosso tempo voar.
“Ninguém precisa de uma revolução. Para efeito de estímulo mental, bastam pequenas mudanças”
Daí a importância de quebrar a rotina. Ninguém precisa fazer uma revolução pessoal por dia nem aderir a radicalismos. Para efeito de estímulo mental, bastam pequenas mudanças. Coisas como alterar um trajeto diário, que se faz de olhos fechados, mudar os ingredientes de uma receita aprovada ou baixar semanalmente um novo aplicativo de celular e aprender os atalhos para usá-lo como um millennial. Podemos também ouvir um gênero musical diferente do que estamos acostumados. Se você gosta de música brasileira, experimente o pop. Se prefere sertanejo, tente um pouco de clássico. Se a sua tribo é metaleira, arrisque umas baladas românticas. O mesmo vale para a atividade física. Não é apenas o corpo que se acostuma a determinados exercícios — a mente também tende a ficar preguiçosa com a repetição. De vez em quando, troque a esteira pela raia, ou vice-versa.
Se a consistência dos hábitos é, por um lado, desejável, a variação não fica atrás. É tornando cada dia realmente único, diferente do anterior e do seguinte, que poderemos nos aproximar da sensação de retardar a passagem do tempo. Se vivermos plenamente cada dia, estaremos criando um repertório de lembranças que nos acompanharão para sempre, dando maior densidade ao tempo.
Se não podemos fazer o tempo retroceder, como o Super-Homem ou a Mulher-Maravilha, é sempre possível nos submeter a esses pequenos desafios, suficientes para provocar sinapses que prolongarão nossas horas neste ano que já começou. Que em 2022 possamos sair do lugar-comum, romper velhos hábitos e viver muitas novas experiências e emoções memoráveis. Feliz ano novo!
Publicado em VEJA de 12 de janeiro de 2022, edição nº 2771