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Claudio Lottenberg

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Mestre e doutor em Oftalmologia pela Escola Paulista de Medicina (Unifesp), é presidente institucional do Instituto Coalizão Saúde e do conselho do Hospital Albert Einstein
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Pólio: só a vacina pode impedir a volta de um velho inimigo

Livre da poliomielite há quase três décadas, país vê queda na cobertura vacinal contra a doença desde 2019

Por Claudio Lottenberg
15 mar 2022, 09h22

A desordem provocada nos sistemas de saúde do mundo todo pela pandemia de Covid-19 levará um longo tempo para ser desfeita. A fragilidade geral causada pelo novo coronavírus cria riscos não só para o surgimento de novas pandemias, como acentua o fato de que antigas doenças voltem a rondar o planeta – uma que se tornou causa de preocupação recentemente é a poliomielite.

Neste mês, o Ministério da Saúde de Israel divulgou que um caso de poliomielite selvagem foi detectado em uma criança de 4 anos, não vacinada, em Jerusalém. A doença não dava as caras no país desde 1989. As autoridades ainda não determinaram de onde teria vindo o vírus. No entanto, sabe-se que a cobertura vacinal para poliomielite vem caindo naquele país. O caso em Israel segue-se ao registrado no Malaui em fevereiro deste ano – o primeiro desde 1992. A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera que o país tem alto risco de um surto nacional devido a condições como a imunização precária e a alta densidade populacional.

A poliomielite, também chamada de paralisia infantil, é uma doença contagiosa aguda, causada pelo poliovírus, e que pode infectar crianças e adultos. Nas ocorrências graves, acarreta paralisia muscular – e os membros inferiores são os mais atingidos. Afeganistão, Nigéria e Paquistão ainda vivem endemias de poliomielite (a cepa detectada no Malaui é a mesma que circula em uma província paquistanesa).

O Brasil presenciou um duro combate contra a doença no século 20. Há registros de surtos no país desde 1909, segundo dados da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz). Outros se seguiram nas décadas de 1930 e 1950. A vacinação teve início em 1961, com a vacina Sabin. Mas somente em 1971 foi lançado um plano nacional para enfrentar o poliovírus e, no início da década de 1980, foram instituídos os Dias Nacionais de Vacinação. Como o último caso de poliomielite no Brasil foi registrado em 1989, o país recebeu o Certificado Internacional de Erradicação da Transmissão Autóctone do Poliovírus Selvagem em 1994.

A poliomielite não tem cura. Só se conseguiu erradicá-la do país por meio da vacinação – o esquema vacinal deve ser iniciado a partir dos 2 meses de vida, com mais duas doses aos 4 e 6 meses, além de reforços entre 15 e 18 meses e aos 5 anos de idade, segundo a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).

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Mesmo assim, desde 2019, o que se tem visto é uma redução da imunização contra a poliomielite: naquele ano, a porcentagem de crianças vacinadas chegou a cerca de 84%; em 2020, caiu para 76%; e no ano passado, nova redução – para 59,82%. O Brasil também tem tido dificuldades na luta contra outra doença, o sarampo: em 2015, o país havia registrado os últimos casos da doença e recebeu por isso, em 2016, a certificação de certificação de “país livre de sarampo”. Em 2018, no entanto, foram registrados 10,3 mil casos, o que fez com que o país perdesse a certificação no ano seguinte.

A pandemia não é o ponto inicial da queda na procura das pessoas por vacinas, mas fez com que a tendência que se observa, ao menos desde 2015, se acentuasse. As medidas de restrição para evitar a transmissão reduziram a procura por serviços presenciais de saúde e afetaram não só tratamentos de doenças crônicas, como fizeram cair ainda mais a busca por unidades de saúde para a vacinação.

O Ministério da Saúde aponta algumas causas ligadas à redução, que ocorrem também em relação a outras doenças. A primeira é justamente o sucesso do programa: como a pólio já está há muito ausente no dia a dia das pessoas, a preocupação em imunizar as crianças pode ter diminuído. Outros fatores têm a ver com a falta de tempo das famílias para ir aos postos de saúde, que só funcionam em dias úteis e, geralmente, das 8h às 17h, além do receio dos efeitos adversos dos imunizantes.

A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) vê como real “a ameaça de reintrodução” da pólio nas Américas. A nosso favor, porém, temos o Programa Nacional de Imunizações (PNI), uma referência mundial. Graças a ele, problemas como a pólio sumiram do radar, e outros permanecem sob controle. Ao combatermos os motivos por trás da queda da cobertura vacinal, teremos plenas condições de impedir que isso aconteça.

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