“O homem do braço de ouro” e outras notas de Carlos Brickmann
Bolsonaro parece ter percebido que seu articulador, Ônix Lorenzoni, não começou a atuar. E entrou pessoalmente no jogo
Publicado na Coluna de Carlos Brickmann
Imaginemos que Paulo Guedes, o superministro, esteja certo em todas as reformas que propuser ─ ou que o superministro Sergio Moro tenha sempre razão. E daí? Se não conseguirem convencer a maioria a segui-los, nada vai passar pelo Congresso. Não é só convencê-los de que estão certos. É mostrar a cada um que vantagem terá ao segui-los. Coisa para profissionais da política. Bolsonaro já teve duas derrotas antes de entrar em campo (aumento do STF, isenções para a indústria automobilística). Há outros itens caríssimos sendo votados, mesmo nesses dias parados. É hora de agir.
Bolsonaro parece ter percebido que seu articulador, Ônix Lorenzoni, não começou a atuar. E entrou pessoalmente no jogo. Já marcou para hoje um café da manhã com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia; e encarregou a deputada Tereza Cristina, que será sua ministra da Agricultura, de garantir o apoio da bancada ruralista, que ela preside, às reformas do governo. Ela irá também trabalhar na articulação política, onde sempre se saiu bem.
Já houve a ordem para que Paulo Guedes fale menos. Mas há ainda os filhos do presidente (e no Congresso, mesmo quando se fala a verdade, é preciso tomar cuidado). O senador eleito Flávio Bolsonaro disse, à sempre atenta Rádio Bandeirantes, que a volta de Renan ao comando do Senado será ruim, “porque o Congresso precisa de um presidente ficha limpa”. É verdade ─ mas quem quer ouvir essa verdade? E Renan, sim, pode voltar.
O Senado sou eu
O Senado terá ampla renovação, mas não o suficiente para que pessoas como Renan (e, antes dele, Sarney) deixem de ter a cara da Casa. Renan já foi quatro vezes presidente do Senado, e isso não acontece por acaso. Ele é situação ou oposição, depende do que for mais conveniente. Pode apoiar Bolsonaro, claro, desde que para ele isso valha a pena. Flávio Bolsonaro, na entrevista à Bandeirantes, criticou “a prática de alguns parlamentares de criar dificuldades para extorquir o presidente em busca de cargos”. Pois é. E é com eles que é preciso negociar. Ou derrotá-los na batalha parlamentar.
Quem tem voto
Bolsonaro se elegeu bem, deu um tiro no alvo ao nomear Sergio Moro para o Ministério, está fazendo uma esplêndida campanha de “gente como a gente” na Internet ─ veja, ele come hambúrguer no balcão em vez de ir a um restaurante de luxo, veja, ele corta o cabelo no mesmo barbeiro de sempre, veja, ele estava sentado no chão do aeroporto esperando a partida do avião, em vez de ir a uma sala VIP, veja, ele foi ao açougueiro do bairro comprar carne para fazer churrasco para os seguranças ─ mas isso tudo, se ao menos hoje lhe dá popularidade, não é levado em conta quando negocia com os parlamentares. Aí é preciso colocar em vigor a lei da reciprocidade: ou o parlamentar ganha prestígio, associando-se a alguma iniciativa que lhe dê votos, ou é preciso encontrar outra maneira de envolvê-lo nos projetos do governo. Não é essencial, sempre, que haja distribuição de cargos ou de vantagens contabilizáveis; mas é preciso achar a fórmula que leve a maioria dos 513 deputados e 81 senadores a se agregar àquilo que o governo achar necessário. Espera-se que as velhas fórmulas, transportáveis em malas e envelopes, tenham perdido a antiga popularidade após a Lava Jato.
O grande nome
Bastou Moro aceitar o convite de Bolsonaro que caiu o mundo ─ não apenas os petistas furiosos com a condenação de Lula (embora ele tenha tido a condenação confirmada, e ampliada, pelo Tribunal Regional Federal), mas os que acham que deveria ter pedido demissão em vez de tirar férias, os que se queixam de fatos como a liberação do telefonema em que Dilma e Lula combinam como ele fará para ganhar foro especial e escapar do julgamento em primeira instância.
São minoria: de acordo com levantamento nacional da Paraná Pesquisas, 85,3% dos ouvidos aprovam a nomeação de Moro para o Ministério da Justiça. A pesquisa foi divulgada pela coluna Cláudio Humberto e abrange a faixa etária de 24 a 59 anos.
É adversário – e sabe
José Dirceu, ex-comandante do PT, ministro de Lula e Dilma ─ “capitão do time”, como Lula o chamava ─ diz que Bolsonaro terá base social, força e tempo para governar. Dirceu falou anteontem, ao lançar seu livro de memórias. “Há um Brasil profundo que se manifestou democraticamente e que o PT precisa entender. O PT não foi derrotado apenas eleitoralmente nas eleições, mas ideologicamente”. Citou a questão da segurança pública: “Onde estava o PT quando o filho de uma mulher pobre chegava em casa sob efeito de drogas, ou em outros momentos igualmente trágicos na vida do brasileiro?”. Aos poucos, disse, o PT se afastou “do dia a dia do povo”. E Bolsonaro, completou, “avançou sobre a base da qual o PT se afastou durante seus quatro mandatos”.