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O dia em que bebi com Jânio (fim)

A grande ressaca e o golpe abaixo da linha da cintura Meu erro foi o sexto copo, expliquei ao ouvir o humilhante “Eu não disse?” dito por Jomar Moraes na subida da Anchieta. Nunca a estrada de Santos teve tantas curvas. Lembrava que tinha capitulado na metade do copo. Jânio deu mais um gole. Lembrava […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 14h32 - Publicado em 14 ago 2010, 12h18

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A grande ressaca e o golpe abaixo da linha da cintura

Meu erro foi o sexto copo, expliquei ao ouvir o humilhante “Eu não disse?” dito por Jomar Moraes na subida da Anchieta. Nunca a estrada de Santos teve tantas curvas. Lembrava que tinha capitulado na metade do copo. Jânio deu mais um gole. Lembrava vagamente que me despedi de Jânio e Gastone com voz pastosa e caminhei para o fusca com a dignidade possível. Para minha sorte, dona Eloá estava refugiada na cozinha.

─ Sexto ou sétimo copo, tanto faz ─ desdenhou Jomar. ─ Teu erro foi encarar a fera.

O sorriso superior de Pedrão avalizou o parecer. Eu só queria que a Serra do Mar parasse de girar ao meu redor, chegar em casa o quanto antes e dormir. No dia seguinte, ainda convalescendo da bebedeira, fui para prédio da Abril na Marginal do Tietê. José Roberto Guzzo, diretor de redação, estava fora naquela semana. Entrei na sala do diretor-adjunto Elio Gaspari tentando disfarçar a ressaca. Ele quis saber se tinha assunto para uma reportagem de capa. Tinha de sobra, respondi. E soltei o comentário como quem não quer nada.

─ O que o homem está bebendo é uma grandeza.

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─ É mesmo? ─ Gaspari ficou curioso.

Contei o que Jânio tinha bebido, ele não acreditou. Sugeri que conferisse com Jomar. Achei irrelevante falar sobre os tragos que tomei. Jornalista não é notícia, tinha ouvido várias vezes na redação. Gaspari resumiu num trecho da Carta ao Leitor a performance do campeão: 20 latas de cerveja, 6 copos de caipirinha e 11 cálices (dos grandes) de vinho do Porto. A reportagem ficou boa. A Carta ao Leitor repercutiu ainda mais. Fiquei sabendo que Jânio se irritou. Eu me senti vingado.

Quero ver como ele vai se virar na quarta-feira, pensei. Era o dia do programa que tinha na Record, onde falava o que queria. Vai ter de comentar o que a Veja publicou, calculei. Foi o que Jânio fez no primeiro minuto do primeiro bloco. Com um exemplar da revista na mão, queixou-se de que fora vítima de jornalistas irresponsáveis. E entrou na questão alcoólica disposto a golpear abaixo da linha da cintura.

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─ Di-zem-que-be-bi! — escandiu as sílabas. Pois não bebi, até por prescrição médica! Quem bebeu foram os jornalistas!

Fiquei espantado. Não é possível que ele estivesse desmentindo o desempenho admirável. Pois fez pior. Abriu a revista na página da Carta ao Leitor, a câmera fechou a lente, Jânio pôs o dedo indicador na foto e desfechou o golpe de misericórdia:

─ Vejam isto! Vejam quem está bebendo!

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Para sorte de Jânio e para meu infortúnio, a foto que ilustrava a página era uma das que Pedro Martinelli fizera quando dona Eloá acabou de confiscar a garrafa de vinho e Gastone ainda não fora buscá-la. O cálice estava atrás do Lincoln do busto. Só aparecia o copo de uísque, circundado em vermelho pelo artista.

─ Aqui está o senhor jornalista com seu copo ─ bateu nas partes baixas. ─ Cadê a minha bebida?

Foi o segundo nocaute consecutivo. Perdi feio. Mas fui derrotado por um campeão.

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