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Augusto Nunes

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J.R. Guzzo: ‘Deus nos ajude’

PUBLICADO NA EDIÇÃO IMPRESSA DE VEJA Ele continua entre nós, esse incomparável Velho do Restelo, mais vivo do que nunca 500 anos depois de criado pelo gênio de Camões, e sempre em forma para desafiar os poderosos de qualquer lugar e de qualquer época. Hoje, em vez de surgir no melhor da festa em volta […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 02h13 - Publicado em 31 jan 2015, 12h16

PUBLICADO NA EDIÇÃO IMPRESSA DE VEJA

Ele continua entre nós, esse incomparável Velho do Restelo, mais vivo do que nunca 500 anos depois de criado pelo gênio de Camões, e sempre em forma para desafiar os poderosos de qualquer lugar e de qualquer época. Hoje, em vez de surgir no melhor da festa em volta da Torre de Belém para rogar sua praga sobre o Gama, na partida das caravelas que saíam da Lisboa de 1497 na esperança de descobrir o Caminho das Índias, nosso duríssimo Velho poderia estar diante da rampa do Palácio do Planalto.

Ali, dia sim, dia não, ou provavelmente todos os dias, teria excelentes oportunidades para dirigir à presidente Dilma Rousseff as palavras que dirigiu a Vasco da Gama e a El-Rei de Portugal. Ambos já tinham provocado muita pena e muito dano, pela “glória de mandar” e “vã cobiça”; o que mais queriam fazer de ruim? É o que os brasileiros têm o direito de perguntar à presidente neste começo de seu segundo mandato: depois de tudo o que fez no primeiro, que castigos ainda vai nos aplicar durante os próximos quatro anos?

É bom não contar com grande coisa. Em menos de um mês deste segundo governo, Dilma já escolheu aquele que pode ser o pior ministério brasileiro de todos os tempos. Começou a executar uma venenosa derrama que vai punir sobretudo quem vive com mais dificuldade. No momento em que o Brasil mais precisa de harmonia com o mundo desenvolvido, para aliviar as misérias criadas por quatro anos seguidos de decisões econômicas erradas, a presidente resolve ir à Bolívia; foi prestar homenagem ao chefe cocalero que inunda o Brasil com drogas pesadas, tomou propriedades da Petrobras sem pagar um centavo de indenização e transformou seu país num paraíso para a receptação de carros roubados aqui. Junto com tudo isso, como se comprovou na semana passada com a queda de energia elétrica em pelo menos dez estados, o governo deixa claro o que vem escondendo há anos: a população brasileira está sob ameaça real de um colapso na oferta de eletricidade. O resumo da obra é ruim. Se em poucos dias de seu novo mandato Dilma conseguiu aprontar tudo isso, que desastres vão cair até 2018 sobre esta terra e esta gente?

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A crise do setor elétrico é uma tomografia perfeita da doença mais perigosa, talvez, das muitas que mantêm há doze anos na UTI a administração pública deste país – a pura e simples incapacidade dos governos do PT, e especialmente de Dilma Rousseff, de resolver problemas concretos. Na questão da energia, para ficar apenas no fracasso mais recente entre tantos outros – que tal a última prova do Enem, em que 500 000 estudantes da “Pátria Educadora” tiraram nota zero em redação? -, há todas as evidências possíveis de incompetência maciça, permanente e agressiva. Nos quatro primeiros anos de Dilma, houve 240 apagões de todos os tipos. O que mais seria preciso para o governo descobrir que existe um problema de energia elétrica no Brasil? Mas, como insistiu a presidente o tempo inteiro, só um ignorante poderia pensar em algo parecido. Toda a sua angústia é com o uso da palavra “apagão”. Quer que se diga “interrupção” no abastecimento; acha que assim o problema irá embora.

A arrogância, a irresponsabilidade e o egoísmo do poder público na gestão da energia elétrica, um exagero até para o “padrão Dilma” de governo, ficam claros quando se sabe que no primeiro semestre do ano passado técnicos do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) pediram que o governo organizasse um racionamento, pela óbvia falta de oferta. Impossível, respondeu Brasília; estamos em ano eleitoral. Logo depois da eleição, com Dilma instalada no poder para mais um mandato, o pedido foi feito de novo; a resposta foi um outro não. Os profissionais do ONS se espantam, agora, quando o ministro de Minas e Energia jura que não faltará luz elétrica em 2015. “Como o ministro pode dizer isso?”, pergunta um deles. “Ele sabe que os reservatórios estão secos e que nunca se consumiu tanto quanto agora, por causa do calor.” Nenhum discurso vai mudar o fato de que a crise está aí: o sistema simplesmente não fornece a energia no momento ou nos locais em que é solicitada, e a culpa por isso é de um governo que teve doze anos inteiros para fazer alguma coisa a respeito, mas não fez nada.

O ministro agora nos convida a contar “com Deus” para resolver a parada; nem ele acredita mais em Dilma. É muita pretensão. Deus dificilmente terá tempo, ou interesse, para resolver problemas que não criou.

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