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Augusto Nunes

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Essa crise econômica eterna é ecológica

Desentortar o Brasil é amarrar firme cada representante eleito à parcela exata do eleitorado que ele representa, e dar a esses eleitores poder de recall

Por Fernão Lara Mesquita
Atualizado em 30 jul 2020, 20h25 - Publicado em 19 jun 2018, 15h16

Fernão Lara Mesquita (publicado no Vespeiro)

O Brasil não se desinteressou da política propriamente. A política é que se desinteressou do Brasil. Não precisa mais dele. Ainda faz um pouquinho de cerimônia, mas é mais pra disfarçar.

O debate ideológico acabou, aliás, no mundo inteiro. Ninguém mais precisa ser convencido de nada. Não há mais sistemas concorrentes. Nem Kim Jong-un nem o Castro que resta acreditam “na revolução”. A diferença que subsiste diz respeito tão somente a quem tem o direito de se apropriar de que parcela do resultado, e por quais critérios: o da força ou o do esforço. E onde o Estado gasta mais de 100% do que arrecada com “pagamento de pessoal” e não investe um tostão furado no que interessa à coletividade deixa de haver qualquer dúvida sobre qual a escolha feita.

Só o que há aqui é um jogo de força entre facções pelo comando do butim. A “privilegiatura” nos impõe sua rapina na porrada falsificando cada vez mais ostensivamente os processos de “legitimação” da sua brutalidade. Desmancha nos tribunais o que os representantes eleitos do povo eventualmente decidem a favor do povo. Fecha cada vez mais a porta da mudança com o “financiamento público” de campanhas e com as regras de tempo de comunicação entre candidatos e eleitores na televisão. E ao impor, agora, a proibição (!!) da produção de provas materiais contra a falsificação do voto assume-se oficialmente como o que quer vir a ser.

Houve uma aposta forte o suficiente para deter a marcha à ré e colocar o País andando para a frente na altura da instalação do governo Temer apenas porque, apesar de todos os pesares, ele assumiu com o tipo de discurso consequente que precede obrigatoriamente as ações consequentes. Ninguém tinha ilusões sobre a dificuldade de transformar aquelas palavras em atos, mas o preço é função da escassez e nem esse tanto pouco nós jamais tínhamos tido. O mercado reagiu mais por saudade que por esperança…

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Atingido abaixo da linha d’água por intenso canhoneio por ter ousado tanto ─ e tão somente por ter ousado tanto ─ o governo Temer teve o discurso da reforma de que até então não se ousava dizer o nome enfiado goela abaixo de volta com todas as suas escamas e espinhos apontados na direção de machucar. Cada vez que tentou ressuscitá-lo o bombardeio recrudesceu na forma de dossiês vazados para uma imprensa fácil diretamente pelas corporações que se apossaram do Estado para construir uma “privilegiatura”. Uns apontam o herege e fornecem a lenha, os outros encenam os autos de fé. Como todo mundo se elegeu do jeito que a lei mandava, quem ataca a “privilegiatura” tem os contatos de mucosas com os financiadores de campanha que todos tiveram escancarados com escândalo na televisão, tão certo quanto que o sol vai nascer amanhã. Para qualquer grau de obscenidades outras há recurso… e disposição para o silêncio. A aposta é, portanto, em Darwin. Sobrevivência dos mais adaptados. A lei só se impõe pela certeza do castigo e o País está sendo ensinado a duras penas que a do crime é a única que não falha.

Esgotado o discurso das reformas o governo Temer ─ como qualquer outro presidindo o colapso de uma nação esgotada por um sistema de privilégios ─ não tem mais nada a dizer. Tenta resistir vendendo a memória das “conquistas” que decorreram da antecipação pelo mercado de uma até então impensável reforma da previdência pública escondida no bojo de um mero ajuste da outra, mas é tarde. Paga ─ e nós junto ─ pela covardia de não ter enfrentado o leão de frente. A condição descamba para o desespero, porém, a cada centímetro que o discurso dos candidatos a substituí-lo se afasta da reforma da previdência pública. E não há exceções. Quem não é assumidamente covarde é omisso.

Excluída a discussão da cura possível, tudo o que subsiste é a destilação de bílis dos que se dispõem a isso, discurso que uma parcela do eleitorado compra ao menos como vingança. E então cai-se no pior dos mundos. Não há reserva de moeda forte que aguente…

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A economia é só uma medida do Estado de sanidade do ecossistema institucional onde uma sociedade vive e tenta progredir. E o nosso entorta a partir da raiz. Nossa eterna crise econômica é efeito, não é causa.

Todo sistema de governo é uma hierarquia. Estabelece quem manda em quem. Democracia é a forma de governo em que os representados mandam nos representantes e aqui o que acontece é o contrário. A essência da tapeação que nos impingem é que, desamarrado o representante dos seus representados, todos os outros mecanismos macaqueados de sistemas democráticos para proteger os representados protegendo os seus representantes passam a jogar para inverter essa relação. Ficam eles armados para jogar só para si e contra nós e invocar as “instituições democráticas” para defender a sua moeda falsa.

Desentortar o Brasil é, portanto, muito mais simples do que parece. Basta amarrar firmemente cada representante eleito à parcela exata do eleitorado que ele representa, e dar a esses eleitores poder de vida ou morte sobre o mandato dele antes e, principalmente, depois da eleição. Isso se consegue com eleições distritais puras, direito de retomada de mandatos e referendo de leis pervertidas por iniciativa popular a qualquer momento. Armados assim os representados, ficam os representantes permanentemente sob mira e impotentes para nos meter em caminhos sem volta. E isso abre o País à reforma permanente que é a condição natural de qualquer organismo vivo com pretensões a manter-se vivo num ambiente em permanente mudança.

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O resto acontece sozinho. Todo mundo acaba indo em direção à felicidade se lhe for dado escolher em que direção quer andar.

Quanto a como instalar esse processo, também é simples. Encham-se de povo as principais praças públicas das principais cidades do País com metade dos manifestantes segurando o mesmo cartaz duas ou três vezes ao longo de um ano e a coisa acontece. Exatamente do mesmo jeito que conquistamos a nossa última façanha “impossível”.

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