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A Origem dos Bytes

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Crônicas do mundo tecnológico e ultraconectado de hoje. Por Filipe Vilicic, autor de 'O Clube dos Youtubers' e de 'O Clique de 1 Bilhão de Dólares'.
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Esse é o futuro do amor da era Tinder?

Um novo reality show mostra como os encontros amorosos podem evoluir no mundo da realidade virtual; mais tecnológicos, e mais chatos

Por Filipe Vilicic 8 out 2017, 17h08

Quem tem TV por assinatura e já se pegou zapeando livremente pelos canais, ainda mais num domingo como hoje, já deve ter percebido: há reality shows amorosos para todos os gostos. Tem os que aproximam solteiros malhados em uma praia paradisíaca. Outro de encontros totalmente às escuras. Em mais um, um algoritmo supostamente escolhe os pretendentes que vão se encontrar. A lista é enorme. Provavelmente tão enorme quanto a de apps dedicados ao assunto. Nessa categoria, tem os para solteiros de qualquer tipo, os que aproximam só os com a mesma religião (evangélicos, judeus… tem até os dedicados tão-somente aos ateus), os para pais solteiros etc. Parece que está cada vez mais fácil encontrar uma cara metade, ou ao menos alguém para passar uma noite solitária de domingo. Mas também está cada vez mais chato.

Agora, chegou-se ao que aparenta ser um esboço do que tem chance de se provar como o ápice desse flerte moderno (e sem graça). Trata-se de um projeto de um grupo de mídia americano, em parceria com o Facebook: o Virtually Dating. O nome em inglês já diz do que se trata: encontros totalmente virtuais. Aproximados pelos seus gostos e estilos, os casais não se veem antes do date. Melhor, nem durante. Todo o papo ocorre pelas lentes de óculos de realidade virtual.

Aí o grande trunfo, o grande xaveco, é, por exemplo, fazer piada de erros da tecnologia, como torcer os joelhos de um avatar virtual, ou derrubar mesas digitais de forma aleatória, sem tocá-las de fato. A conversa tem início num bar. Contudo, como se trata de um universo fictício, pode fluir para uma praia, um cenário de apocalipse zumbi (!) ou uma estação espacial.

Os próprios pretendentes também podem usar da criatividade para se transformarem. Eles começam trajando roupas similares às que estão no mundo real, e com aparência idem. “Você tá linda nessa realidade virtual”, foi a cantada de um dos participantes, por exemplo. Mas há ainda a opção de se transformar em outra coisa. Qualquer outra coisa. Pode ser um pinguim, uma celebridade, um hidrante de rua (!) ou uma estrela-do-mar (sim, acredite).

A dinâmica é muito parecida com a de um videogame. “Date start” dá início à brincadeira, com uma voz robótica dizendo “Welcome to your VR Dating”. Voz que, aliás, acompanha o casal por toda a experiência. “Do you guys wanna go to somewhere else?”, convida a máquina, tentando “sensualizar”, em certo momento, antes de enviar os avatares para uma praia e, depois, literalmente para dentro do oceano.

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O reality show, em si, é uma chatice. Para quem vê, a situação do encontro virtual ainda pode parecer tão, mas tão, bizarra que o usual é sair com a impressão de que aquilo nunca daria certo, digamos, na vida real. Contudo, vale lembrar que o mesmo se pensava sobre a primeira rede social virtual da história, de 1959. Isso mesmo, 1959. Foi quando dois estudantes da Universidade Stanford, nos EUA, criaram um programa de computador que combinava 49 homens e 49 mulheres de acordo com suas idades, hobbies e traços de personalidade. A brincadeira de mais de cinco décadas atrás rendeu namoros e um casamento. Só que quem presenciou, naqueles idos dos anos 50, achava que se tratava somente de uma experiência exótica.

Pois não se passaram algumas décadas e o exótico virou regra? Hoje, há mais de 1 400 serviços de namoro online em atividade nos EUA (um negócio de 2 bilhões de dólares anuais). Mais de um terço dos americanos têm perfil em uma dessas páginas, ou em algum app equivalente – o mais famosos dentre eles, sabe-se, é o Tinder. Aplicativos de relacionamentos já são parte quase inescapável da rotina contemporânea.

Esses sites e apps são integrantes de um triângulo nada amoroso: 1 humano + internet + 1 outro humano. Tão, digamos, broxante que, fora da realidade virtual, ninguém se empolga com isso. A simples presença de um smartphone por perto costuma desanimar casais. Uma pesquisa da Universidade de Essex (Inglaterra), por exemplo, concluiu que, quando parceiros sexuais têm conversas sobre o relacionamento com o celular de um deles nas proximidades – mesmo que o aparelho esteja fora de uso -, um costuma sentir que o outro não se preocupa com seus sentimentos.

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A tecnologia entrou com tamanha força no meio do cenário do affair moderno que já há até livros (e sites, claro) dedicados a dar dicas de como se dar bem em apps desse métier. Não vou propagandeá-los. Entretanto, numa ilustração, pode-se definir como regras básicas: demore algumas horas (alguns dizem que cerca de quatro) para responder a mensagens de WhatsApp de pretendentes, para se fazer de “difícil” e “ocupado(a)”; não abuse de papos virtuais (como por FaceTime), ainda mais os de teor “quente”, para não diminuir a chance de a conversa migrar para a realidade física; se alguém envia textos de WhatsApp pós-meia-noite, os tais “experts” já têm como certo que o indivíduo não se interessa por compromissos sérios.

O termo “romantismo” ganhou o significado que hoje damos a ele no meio do século XVIII. Foi quando se elevou às alturas o ato de cortejar. Aos artistas românticos, o amor era uma arte. Na definição do movimento citado, “uma missão heroica à procura de sentido para a vida, de identidade pessoal e de uma espécie de salvação na Terra”. Para as gerações deste século conectado, tal significado pode parecer inocente, pouco prático, uma bobagem. Hoje, seria “romantismo” responder a uma mensagem no mesmo dia, ou acertar em cheio – com o auxílio de algoritmos – num(a) pretendente com gostos iguais aos próprios? E como ficará quando se popularizar (e se isso ocorrer) essa ideia de dates imersos completamente em realidades virtuais?

Romântico, ou não, a real é que essa onda de virtualidade está é tornando encontros cada vez mais repetitivos – se o algoritmo seleciona baseado em critérios pré-estabelecidos, só pessoas iguais aparecem pela frente num site de relacionamentos –, calculados e, logo, chatos. Nos anos 90, ficou célebre entre os(as) xavequeiros(as) um estudo que identificou 109 estratégias tipicamente adotadas por homens e mulheres como forma de chamar a atenção de alguém num bar. Dentre as táticas, incluem-se: encarar de forma sedutora, contar piadas em voz alta ou pagar uma bebida para a paquera. Manobras que nos dias de hoje se provam desatualizadas. O tiro certeiro do amor agora é dado em cliques na tela do smartphone, à espera de um match. Ou se transformando num avatar bonitão numa conversa num bar feito de pixels.

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Leia também: Sobre mamilos, peitos, pênis e a internet

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