Um levantamento disponibilizado pelo laboratório de genética Genera, feito com base em exames realizados por 200 mil pessoas, revelou as principais ascendências da população brasileira. No grupo analisado, a ancestralidade média foi 72% europeia, 11% africana e 6,5% oriunda de populações originárias americanas.
Os resultados são referentes ao conjunto de brasileiros que pagaram pelos exames e, por isso, não representam toda a população. “É uma base de dados recortada, com um certo viés”, afirma o médico mestre em genômica humana e cofundador da Genera, Ricardo di Lazzaro Filho. “Mas pelo volume ser tão grande, a gente viu uma similaridade bem importante com a ancestralidade de estudos científicos da população do município de São Paulo, por exemplo”.
A comparação com uma revisão científica brasileira mostra que, enquanto a estimativa de ascendência europeia está ligeiramente superestimada (68,1%), as ancestralidades africana e americana foram subestimadas pelo levantamento e representam, na verdade, 19,6% e 11,6%, respectivamente.
O doutor em genética da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da USP, Celso Teixeira Mendes Junior, explica que isso pode ser justificado pelas diferenças sociodemográficas entre a amostra e a população brasileira: as camadas economicamente desfavorecidas certamente tiveram menor acesso ao teste, assim como habitantes das regiões Norte e Nordeste encontram-se sub-representados na amostra.
Embora não represente com exatidão a ascendência de toda a população, os dados podem ser valiosos para alguns grupos. Quando chegaram ao Brasil, durante a colonização europeia, os negros escravizados tiveram seus documentos apagados e, por isso, seus descendentes não sabem de que países são originários. De acordo com o levantamento, a maior parte da ancestralidade africana vem do Golfo da Guiné e da África Ocidental, enquanto uma minoria descende de países da África Oriental.
A ascendência europeia, como esperado, tem como principais representantes os países Ibéricos, seguidos imediatamente pela Europa ocidental, pela Itália, pelos Bálcãs e, na retaguarda, pela Sardenha. Ancestralidades asiáticas, médio-orientais e judaicas também apareceram no levantamento.
“Um insight que é muito legal, meu favorito, é que grande parte dos brasileiros carrega em suas células DNA que vem de todos os continentes do mundo. A gente talvez seja um dos únicos povos que tenha isso”, comenta di Lazzaro.
O estudo reflete também uma parte menos glamourosa do nosso processo de colonização. Olhando para componentes celulares específicos, o teste consegue diferenciar ancestralidades paternas e maternas da população. Enquanto a parte herdada dos pais é majoritariamente europeia, os elementos recebidos das mães são principalmente indígenas e africanos. Segundo Teixeira, a explicação é que, durante a ocupação europeia, a maior parte dos imigrantes eram homens que, aqui, se reproduziram com mulheres nativas e cativas, enquanto indígenas e africanos do sexo masculino foram, em grande parte, mortos e escravizados. As consequências não ficaram registradas apenas nas páginas dos livros.