Moro sobre políticos: ‘O que se vê é quase uma completa omissão’
Juiz se disse frustrado em ver que os políticos não se mobilizaram para combater a corrupção mesmo após a Lava Jato
O juiz Sergio Moro afirmou nesta segunda-feira que a sua maior frustração na condução dos processos da Operação Lava Jato em primeira instância é que a classe política não se mobilizou para combater a corrupção, mesmo após a descoberta de um quadro sistêmico de pagamento de propina e desvio de dinheiro público entranhado nas instituições brasileiras.
“O que se vê é quase uma completa omissão em promover medidas dessa espécie (de combate à corrupção). O que mais me frustrou é que eu tinha uma expectativa de que, diante da magnitude desse problema, ele não ficasse restrito somente às cortes de Justiça. A maior frustração e o que pode levar a retrocessos é nós não irmos adiante”, disse o juiz Sergio durante evento Amarelas ao Vivo, realizado pela VEJA, ao ser perguntado pela redatora-chefe de VEJA Thaís Oyama sobre quais seriam os seus maiores desapontamentos com os rumos da operação.
“Quem reagiu foi a Justiça criminal, a polícia, o Ministério Público e outros órgãos de instituição, mas, para superar esse nível de corrupção, seriam necessárias reformas mais gerais da parte das nossas lideranças políticas. Nem falo de reformas no Código Penal, mas mudanças que diminuíssem os incentivos para a corrupção”, disse o juiz, propondo iniciativas que acabassem com as indicações políticas no loteamento de cargos públicos e a restrição ao foro privilegiado.
Na entrevista, Moro chamou a atenção para a questão do foro privilegiado, que tem “blindado” muitos congressistas investigados na operação e cujo alcance está sendo discutido no Supremo Tribunal Federal. O magistrado pontuou que, apesar das críticas sobre o excesso de prisões preventivas decretadas ao longo do processo, a “omissão é grande” e ainda há “muitas pessoas” para ser responsabilizadas criminalmente.
“Não foi possível ainda realizar todo o trabalho. Temos uma parcela significativa de investigados com foro privilegiado que respondem no Supremo. Só depois disso poderemos ter um diagnóstico completo de até onde foi a Lava Jato”, afirmou.
Frustrações à parte, o juiz considerou como os dois maiores legados da Lava Jato o “rompimento da tradição de impunidade” no país e a atenção da opinião pública para o problema dos crimes de colarinho-branco.
O juiz também falou sobre uma de suas decisões que foram mais contestadas à frente da 13 Vara Federal de Curitiba – a de divulgar um grampo telefônico em que os ex-presidentes Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva falam sobre a posse do segundo como ministro da Casa Civil, em março de 2016. A publicização do áudio teve repercussão imediata nas ruas e no meio político – um mês depois, a Câmara dos Deputados aprovaria o impeachment de Dilma, que seria afastada definitivamente do cargo em agosto.
Moro afirmou que não cabia ao Poder Judiciário “ser guardião de segredos sombrios” e que o povo precisava saber das “conversas não republicanas” dos seus governantes.”Eu não esperava que [essa decisão] tivesse tanta repercussão e trouxesse tanta celeuma. Eu fiz o que achei necessário e achei que o conteúdo daqueles diálogos deveriam vir a público”, comentou, comparando o caso, guardadas as suas devidas diferenças, ao de Watergate, nos Estados Unidos, que resultou na renúncia do presidente Richard Nixon, na década de 70.
No diálogo, Dilma dizia a Lula que lhe enviaria o “termo de posse”, para que fosse usado “só em caso de necessidade”. Os partidos de oposição e grande parte da opinião pública viram a nomeação como uma tentativa de dar foro privilegiado a Lula, que era investigado em diversas frentes na Operação Lava Jato.