Léo Índio, sobrinho de Bolsonaro, está pessimista sobre a anistia e quer a ajuda de Milei
Foragido na Argentina, ele conta a VEJA que os brasileiros têm dificuldades para encontrar habitação e emprego no país vizinho

Prestes a ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal pelos atos golpistas do 8 de Janeiro, Leonardo Rodrigues de Jesus, o ‘Léo Índio‘, que é sobrinho do ex-presidente Jair Bolsonaro, diz que foi para a Argentina ao ter certeza de que seria preso no Brasil. A notícia de sua mudança para o país vizinho levou o ministro Alexandre de Moraes, relator do processo da tentativa de golpe no Supremo Tribunal Federal (STF), a decretar a prisão preventiva do agora foragido na semana passada. Nesta entrevista exclusiva a VEJA, Leo Índio conta como vem tentando atrair a atenção do presidente argentino Javier Milei aos pedidos de asilo permanente para cerca de 300 brasileiros que também estão fugindo das duras penas do Supremo, de até 17 anos de cadeia, em regime fechado. Ele também se mostra um pouco descrente com a possibilidade de o Congresso brasileiro votar a anistia.
Por que você fugiu para a Argentina? Eu acredito que seu eu ficasse onde estava já estaria preso. Eu estava no Paraná, ali na região de Cascavel, onde fui candidato a vereador nas eleições de 2024, estava continuando um trabalho de assessoria parlamentar, rodando o estado, uma hora ou outra eu seria pego. Eu tinha processo antigo no STF, de incentivo a atos antidemocráticos, não sei se o nome é o ‘processo do fim do mundo’, mas é um processo tão sem pé e cabeça que nem dei atenção. Me orientaram o seguinte: ‘olha, cara, a melhor coisa que você pode fazer é se precaver, sua cabeça está na bandeja, é melhor você se cuidar’.
Quais são as principais acusações que pesam contra você nos atos antidemocráticos? Foi uma divulgação que eu fiz, de um PIX, pra juntar dinheiro para fazer faixas no 7 de Setembro, e fui enquadrado pelo Alexandre de Moraes como patrocinador de atos antidemocráticos, sendo que nunca transitou dinheiro na minha conta, eu caí nisso aí e na época bloquearam todas as minhas redes sociais, minhas contas bancárias. Esse foi o meu primeiro ‘contato’ com o STF. Eu participei de todas as campanhas da família: do Carlos, do Flávio, Eduardo e do próprio Jair, quando era deputado federal. Participei da campanha vitoriosa de 2018, e os holofotes vieram em cima de mim.
E o que pesa contra você no 8 de Janeiro? Eu estive em minha vida em todas as manifestações pró-armas, contra aborto, pró-Bolsonaro. Sou figurinha carimbada em todas as manifestações da direita. Morei no Brasil inteiro, porque meu pai é militar, engenheiro do Instituto Militar de Engenharia, foi professor do governador de São Paulo, o Tarcísio. Hoje em dia meu pai é pastor da Igreja Batista. Estive também no 8 de Janeiro. Teve uma imagem minha lá, um pequeno vídeo, feito por alguém, antes de todo aquele caos, e depois teve uma selfie minha na Esplanada dos Ministérios. Isso foi suficiente para ser enquadrado na tentativa de golpe de Estado.
Você entrou nos prédios do Palácio do Planalto, do Congresso e no Supremo? Claro que não. Não entrei em prédio nenhum. Até pela minha formação, de colégio militar, não teria sentido algum apoiar qualquer tipo de vandalismo. Foi algo totalmente atípico, até porque isso aí não foi da direita. Então, a minha presença lá foi um prato cheio para a esquerda e para o atual momento jurídico do país. Fui enquadrado em todos os rigores do processo, teve uma busca e apreensão na minha casa no final de 2023. Poderiam ter ido direto à minha casa em Brasília, mas foram em todos os endereços que morei na vida, em vários lugares no Rio de Janeiro, e isso acabou expondo amigos a situações constrangedoras. Tudo isso colabora para o desgaste que eles tentam fazer o tempo inteiro com pessoas próximas ao presidente Bolsonaro.
Você, então, acredita que isso é uma forma de atingirem seu tio? Eles querem afetar o presidente Bolsonaro. Em novembro teve a busca e apreensão no meu endereço no Guará, em Brasília, levaram meu celular, meu passaporte. Não tinha nada que pudesse me colocar nessa situação. Implicaram com um colchonete camuflado, eu disse: ‘sou filho de militar’. Falaram sobre uma Bandeira do Brasil, eu falei: ‘vem cá, eu sou brasileiro’. Não acharam nada. Fizeram a oitiva. Até então achei que estava tudo certo. Este ano houve o indiciamento, a Procuradoria-Geral da República enviou (denúncia) para o STF numa movimentação recorde de velocidade, o Moraes já me colocou como réu, os outros ministros também me colocaram, foi cinco a zero, uma goleada. Tomei uma lambada.
Já há mais de 200 brasileiros do 8 de Janeiro na Argentina? Já beira 300 brasileiros, mais os familiares, próximo de 1.000 pessoas. A situação aqui é muito complicada. Temos todos os tipos de carência que você pode imaginar. Eu tive a opção para ir para outros países. O Osvaldo Eustáquio, lá na Espanha, falou: ‘Léo, vem pra cá que aqui a gente cuida (de você)’, mas eu falei: ‘cara, desculpa, tem muito brasileiro desamparado’. Então eu acho que a missão é aqui mais perto, a gente pode ajudar com minha presença aqui. Não que eu seja uma pessoa importante, mas em função desse meu parentesco com o presidente Bolsonaro as autoridades já botaram um holofote em cima. Eu optei pela Argentina para isso.
De que formas você pretende ajudar os outros brasileiros? Estou tentando usar essa proximidade de familiar (do presidente Bolsonaro), que usam tanto para me bater, estou tentando usar de uma forma benéfica aqui, solidária. Isso ajudou a atrair a atenção de pessoas. Graças a Deus a gente está conseguindo, num trabalho em paralelo com o Congresso, a busca pela anistia. A minha guerra e a guerra dos brasileiros aqui é pelo asilo permanente. Vai ser bom para a Argentina também, a Argentina vai ter pessoas trabalhando aqui, gerando recursos, gerando renda, são pessoas honrosas. Se Deus quiser, o Bolsonaro volta em 2026 e tenta ajudar o Milei de alguma forma em sua reeleição.
Como foi essa chegada aí na Argentina? A Argentina tem um órgão (Conare) para os refugiados. Graças a Deus eu tive facilidade, cheguei e já tinham pessoas para me receber. Eu tive onde dormir. Fui orientado a ir a esse órgão. Eles lhe dão um papel em branco, e você vai escrever de próprio punho, explicando por que você precisa desse refúgio, esse asilo temporário. Eu escrevi lá ‘perseguição política’. Avaliaram e no outro dia me entregaram a (autorização) ‘precária’. Essa precária lhe dá autonomia de ficar num asilo temporário aqui na Argentina, com duração de 90 dias. Após 90 dias vou lá, me apresento e eles vão me dar a definitiva ou uma nova precária de 90 dias.
Uma brasileira presa em Ezeiza, Ana Paula Sousa, diz que tinha a ‘precária’, mas o próprio Conare deu o endereço dela para a polícia Argentina, que a prendeu. No caso dela e dos outros quatro que foram presos, lá em Buenos Aires tem um juiz, Daniel Rafecas, ele é bem próximo da Dilma e do Lula, ele sabe de toda a movimentação que está tendo do STF e seus tentáculos de perseguição aos brasileiros.
Como é que você ajuda os brasileiros? Três mídias aqui da Argentina divulgaram que tem um sobrinho do presidente Bolsonaro em asilo temporário aqui na Argentina. Minha ideia é tentar chamar a atenção dos parlamentares de direita daqui e pessoas próximas ao presidente Milei. Faz um ano que os brasileiros estão aqui e faz cinco meses que algumas pessoas estão presas. Então, a gente precisa de um posicionamento do governo do Milei. Qualquer movimento nosso ruim pode resultar numa rusga diplomática, então a gente está tentando de uma forma macia, suave, fazer chegar o clamor dos brasileiros ao Milei.
Por que fazer esse clamor chegar ao presidente Milei? Os brasileiros precisam do asilo permanente. As pessoas não conseguem trabalhar, não conseguem arrumar emprego porque todo mundo está com medo de estar com seu nome na lista. Vou dar um exemplo: se eu chego num restaurante aqui e digo que eu preciso de trabalho, a primeira coisa que o proprietário vai pedir é o nome completo e o telefone. As pessoas não estão trabalhando, as pessoas estão acabando com as suas economias. Algumas pessoas conseguem faze uns bicos aqui e outras se ajudam.
Há sinalização de que o presidente Milei possa receber uma comitiva de brasileiros do 8 de Janeiro aí na Argentina? Eu mandei uma carta, eu tenho amigos que são parlamentares, do meio politico, entreguei a carta, existe interesse dos deputados Marcel Van Hatten, do próprio Nikolas Ferreira, que se encontraram, e falaram ‘poxa, vamos tentar unir essas forças aí’. Aqui eu estou conversando com a Maria Celeste Ponce (deputada Argentina) e com o Martín Arjol, um parlamentar próximo ao Milei. Enviei a carta para ele em espanhol, ele mandou mensagem hoje, ‘vou fazer com que chegue no gabinete da Casa Rosada’.
Como os brasileiros buscam formas de se esconder na Argentina? Vou lhe mandar uns vídeos, as pessoas estão em meio de mata, em camping, teve um local que a gente foi na semana passada para jogar remédio em baratas, tem idosos, tem gente que precisa tomar remédios para o coração. Tem pessoas que fugiram do Brasil que foram presas num primeiro momento e depois foram soltas, ganharam tornozeleiras e aproveitaram para fugir, porque são pessoas que usam remédios de uso contínuo, mais de dez medicamentos, que se ficassem lá na cadeia seriam mais um Clezão (Cleriston da Cunha, que morreu na Papuda). Eu, graças a Deus, tinha umas economias, me juntei com mais duas pessoas aqui, estamos morando num local bem humilde, mas mesmo assim temos um teto sobre minha cabeça, tenho uma cama, a gente consegue lavar a roupa ali no balde.
Você acredita que o Congresso aprove a anistia? Não quero ser injusto, há parlamentares realmente focados, empenhados, mas acho que existem pessoas que querem empurrar para 2026 para fazer palanque politico. Teve aí essa manifestação do ultimo dia 6, ouvi algumas falas, mas não consegui ver de ponta a ponta, por problemas de sinal aqui. Até onde vi, não teve nenhuma citação sobre os brasileiros que estão fora do país. Não é só na Argentina, tem brasileiro no México, na Espanha, então eu tiro um pouquinho do meu ânimo com relação a essa votação dessa anistia. Eu vou repetir: não quero ser injusto com alguns nomes, mas acredito que não é uma prioridade. Eu sinto que não é uma prioridade, porque já são dois anos e três meses. Quando eles querem resolver, eles resolvem, a gente sabe como funciona a política.