Epidemia ameaça provocar crise no sistema funerário em diversas capitais
São Paulo, Rio de Janeiro, Belém e Manaus têm recorrido a planos emergenciais para evitar um problema de saúde pública em relação aos enterros
O aumento no número de mortes causadas pela epidemia do coronavírus tem estrangulado os sistemas funerários em diversas capitais do país, como São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Belém (PA) e Manaus (AM), obrigadas a colocar planos emergenciais em prática para evitar um problema de saúde pública causado pela exposição dos corpos.
Em São Paulo, cidade com maior número de mortes até o momento em todo país, a gestão do prefeito Bruno Covas (PSDB) estruturou um plano de contingência que prevê a abertura emergencial de 13 mil sepulturas, contratação de oito câmaras frigoríficas com capacidade para armazenar até 90 corpos e enterros noturnos caso seja atingida a marca de mais de 400 enterros em um único dia.
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Clique e AssineNa capital do Amazonas, a situação é mais preocupante. Diante da disponibilidade de apenas um cemitério com capacidade para receber novas urnas, o Nossa Senhora Aparecida, a Prefeitura de Manaus instituiu a partir desta terça-feira, 28, o sepultamento em três camadas, no qual um caixão é colocado sobre o outro, separados por tábuas. A medida veio depois de outra igualmente polêmica: a criação de valas comuns, chamadas de “trincheiras” pela administração municipal, em que as urnas são colocadas lado a lado, em vez de abrir uma cova para cada uma. Nessa quadra onde estão sendo concentrados os enterros de vítimas de Covid-19, há plano da prefeitura para criar uma praça em homenagem aos mortos.
Com média de 30 sepultamentos por dia no período pré-pandemia, Manaus passou a enterrar mais de 100 pessoas diariamente – na segunda-feira 27, o sistema funerário recebeu 140 corpos. As mortes domiciliares, que eram cerca de cinco por dia, chegaram a 40. “Têm sido comum as filas de carros funerários na entrada do cemitério”, diz Manoel Viana, presidente do Sindicato das Empresas Funerárias do Amazonas. A prefeitura tem oferecido cremações gratuitas às famílias na tentativa de desafogar os sepultamentos.
Manaus ocupa atualmente o segundo lugar no ranking de cidade com maior número de óbitos de acordo com a população. Segundo dados do Ministério da Saúde, foram registradas 100,9 mortes por 1 milhão de habitantes. Em primeiro lugar, está Fortaleza (CE) com 102,1 mortes na mesma proporção.
Nos últimos dias, Belém tem registrado um grande aumento no número de mortos por coronavírus o que fez com que a Defensoria Pública do Pará criasse um grupo de monitoramento dos sepultamentos. Para evitar um colapso, foi feita exigência para que a prefeitura ofereça cremações gratuitas, já que não há esse tipo de serviço nos cemitérios da cidade. O governo municipal respondeu que não há verba suficiente.
No Rio de Janeiro, as medidas de expansão da capacidade dos cemitérios municipais, em curso desde 2014, foram aceleradas diante da pandemia. A construção de gavetas verticais no Cemitério do Caju, na Zona Norte do Rio de Janeiro, não foi paralisada pela gestão do prefeito Marcelo Crivella (PSC) mesmo diante das medidas de isolamento social impostas no estado.
Em São Paulo, o serviço funerário é um monopólio da prefeitura e, por causa do aumento na demanda, foi publicado decreto que permite às empresas particulares prestarem serviços para os cemitérios municipais, como o transporte de corpos. Para evitar situações como a que aconteceu em Manaus, em que houve troca de corpos e famílias agoniadas durante dias em busca do parente vítima de coronavírus, a prefeitura paulistana contratou um serviço de rastreamento dos caixões.
Parte dessas medidas consta do plano de privatização do serviço funerário de São Paulo, que havia sido prometido pelo então prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), mas que ainda não saiu do papel. O plano implicou cortes de funcionários e de verba destinada aos cemitérios. Diante da pandemia, a administração municipal teve que dobrar o contingente de funcionários, com a contratação emergencial de 220 pessoas, e injetar R$ 16 milhões em contratos emergenciais em um mês.
A preocupação sobre um colapso funerário já mobiliza até as Forças Armadas. O Exército chegou a enviar neste mês um ofício às prefeituras do Rio de Janeiro para pedir o número de sepulturas disponíveis para traçar um plano emergencial nas localidades que apontarem déficits. Em São Paulo, oficiais tiveram uma reunião com representantes do serviço funerário para obter informações do mesmo teor.