Black Friday: Revista em casa a partir de 8,90/semana
Continua após publicidade

Em meio à pandemia, o desmatamento dispara na Amazônia

Fiscais do Ibama enfrentam problemas sérios para atuar contra os exploradores ilegais

Por Eduardo Gonçalves Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 14h44 - Publicado em 30 abr 2020, 19h50

A pandemia se tornou uma cortina de fumaça para o avanço do desmatamento na Amazônia. Com os olhos do Brasil — e do mundo — voltados para a crise do coronavírus, madeireiros, garimpeiros e grileiros multiplicaram ações criminosas, aproveitando-se do momento para avançar sobre a floresta com motosserras e retroescavadeiras. Os alertas de áreas devastadas bateram o recorde no primeiro trimestre deste ano, totalizando 796 quilômetros quadrados, o que representa um aumento de 51% em relação ao mesmo período de 2019, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Informações preliminares mostram que aumentou ainda mais o ritmo de estragos entre março e abril, justamente quando boa parte do Brasil entrou em quarentena.

Enquanto a supressão da mata segue em ritmo acelerado, as ações de fiscalização e os autos de infração vêm caindo. Desmoralizado desde o ano passado pelo discurso de um governo que fala em incentivar a exploração em áreas protegidas, o Ibama sofreu um baque adicional com a Covid-19. Calcula-se que quase um terço do efetivo de seus profissionais de campo tenha sido afastado por pertencer a grupos de risco. Se não bastasse, as equipes que continuam em ação vêm encontrando dificuldades para atuar em certas regiões, como o Norte do país, porque algumas prefeituras determinaram que elas devem passar por um período de quarentena. O pretexto é de que isso evitaria trazer de fora para dentro a doença. Um completo absurdo, é claro, pois acaba com o efeito surpresa de quem está lá para fazer um flagrante. “Seria importante que vocês reavaliassem essa conduta (…). Talvez esperar passar esse período de pandemia”, argumentou o prefeito de Uruará, Gilson Brandão, em áudio obtido por VEJA, no último dia 20, a fiscais do Ibama, que haviam determinado a saída de invasores e a retirada de gado da terra indígena de Cachoeira Seca, no interior do Pará.

O estado foi palco de um caso que exemplifica bem a situação atual de descalabro. No início de abril, uma equipe do Ibama, com o apoio da Força Nacional, realizou uma megaoperação em reservas indígenas no sul do Pará — área onde o sistema identificou o maior território derrubado da floresta. Orientados por indígenas, os agentes flagraram, ao longo de duas semanas de investigação, serrarias, pontes e aeroportos clandestinos no meio da mata que deveria ser fechada, conforme relatório interno obtido por VEJA. Escondidos com galhos e folhas de árvores para escapar do radar dos helicópteros foram encontrados também tratores, galões de combustível e dezenas de armas. Depois, os fiscais incendiaram cerca de setenta equipamentos dos invasores, conforme manda a lei no caso de impossibilidade de realizar o transporte e a apreensão desses materiais.

arte-desmatamento

O trabalho dos agentes na região continuou nos últimos dias, mas a equipe sofreu baixas importantes. Responsáveis por coordenar a megaoperação, dois diretores de fiscalização do órgão, Renê de Oliveira e Hugo Loss, foram exonerados na última quinta-feira, dia 30. O chefe deles, o diretor de Proteção Ambiental, Olivaldi Azevedo,já havia sido destituído no dia 14. A interlocutores, os profissionais disseram que não houve nenhuma determinação formal para interromper a fiscalização. Segundo eles, no entanto, ficou claro que a forma de trabalho “não agradou” à cúpula do Ministério do Meio Ambiente. Em 21 de abril, dezesseis analistas ambientais do Ibama saíram em defesa dos companheiros, enviando um documento de protesto à chefia do órgão ambiental. Já o Ministério Público Federal abriu uma ação civil pública para apurar se houve “improbidade administrativa e violação aos princípios da moralidade e legalidade” na demissão de Olivaldi. O Ministério do Meio Ambiente não justificou as demissões. Apesar de as ações no Pará estarem amparadas na lei, o presidente Jair Bolsonaro é um crítico contumaz desse tipo de operação. “Não é para queimar nada”, disse ele em abril do ano passado, criticando o ocorrido em um caso semelhante. O presidente também é um ferrenho defensor da exploração de minérios em áreas indígenas — desde fevereiro tramita no Congresso um projeto de lei do Executivo que autoriza essas atividades.

Continua após a publicidade

Quase um consenso entre os especialistas, o enfraquecimento da fiscalização por causa da Covid-19 pode levar a Amazônia a novos recordes de desmatamento. “É preocupante, porque ainda estamos na época das chuvas. A partir de maio a tendência é aumentar com as queimadas”, diz Carlos Souza Junior, pesquisador do instituto Imazon. No dia 23, a força-tarefa da Procuradoria na Amazônia moveu um processo na Justiça para cobrar a ação imediata do governo para conter a “destruição da floresta”. Diante dos alertas, a preocupação internacional com o tema voltou a aparecer. No dia 26, a consultoria global Eurasia alertou os investidores para o fato de que a pandemia aceleraria o desmatamento. O assunto ganhou destaque em jornais como o britânico The Guardian. A volta das manchetes internacionais acusando o Brasil de descaso com esse patrimônio ambiental é outra péssima notícia para a imagem do país, cujo governo já vem sendo retratado no exterior como um dos líderes do discurso negacionista em relação ao risco do coronavírus. O pior é que, em ambas as situações, as críticas são pertinentes.

Publicado em VEJA de 6 de maio de 2020, edição nº 2685

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Semana Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

Apenas 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

a partir de 35,60/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.