Dez anos de UPPs: Cariocas não sentem impacto no cotidiano
Pesquisa realizada com 2.479 pessoas aponta que mesmo sem mudanças significativas, 60% da população prefere que as unidades permaneçam nas comunidades, mas com alterações
Às vésperas de completar dez anos de implantação, as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) no Rio de Janeiro estão desacreditadas pela população, indica pesquisa divulgada hoje (22) pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), da Universidade Candido Mendes. Quando questionados sobre o que achavam do programa, ‘não faz diferença’ foi a resposta de mais da metade dos moradores entrevistados nos 37 territórios com UPP.
A pesquisa foi feita entre 8 de agosto e 25 de outubro de 2016, com uma amostra domiciliar de 2.479 pessoas com 16 anos ou mais de idade. O Programa de Polícia Pacificadora (UPP) começou em dezembro de 2008, com a ocupação da favela Santa Marta, no bairro de Botafogo, zona sul. De 2009 a 2014, outros 36 territórios da cidade foram incorporados ao programa.
Cerca de 49% das pessoas ouvidas declararam que a UPP local não vem melhorando nem piorando desde sua instalação. Entretanto, de acordo com uma das coordenadoras da pesquisa, Sílvia Ramos, surpreendeu o dado que mostra que quase 60% dos moradores ouvidos não querem que o projeto acabe.
“Apesar da avaliação extremamente crítica por parte de muitos moradores sobre as UPPs, quando perguntamos se preferiam que as UPPs acabassem, quase 60% responderam que prefeririam que ficassem, mas que fossem modificadas”, disse.
Para 79% dos entrevistados, uma das medidas necessárias para melhorar o desempenho da iniciativa seria punir os maus policiais. Os moradores apontaram também, a necessidade de oferecer melhores condições de trabalhos, projetos de capacitação para os jovens e policiais e ofertas de outros serviços públicos, além do policiamento.
Convivência
Mulheres são mais favoráveis à permanência de UPP do que homens, (66% contra 58%), e brancos mais do que negros (70% contra 61%). O estudo apontou ainda, que jovens são mais críticos à atuação dos policiais.
“Os que mais defendem o fim das UPPs são aqueles que foram mais abordados pela polícia e que tiveram suas casas revistadas. Esse tipo de experiência, muito mais frequente entre os jovens, é muito negativa para a avaliação de todo o resto. Os jovens são um grupo que merece atenção especial, pois já sofrem muito preconceito, sobretudo, o jovem negro”, disse.
Ao todo, 38% dos entrevistados relataram situações em que os policiais das UPPs xingaram ou humilharam moradores da comunidade.
Policiamento de Proximidade
Outro ponto revelador do estudo, segundo a pesquisadora, foi que 95,8% dos entrevistados declararam não ter tido contato direto com os policiais da unidade em situações do cotidiano.
“Aquele projeto do policiamento de proximidade, do policial que criaria um enraizamento comunitário, que estaria presente na vida dos moradores, não se cumpriu”, opinou Sílvia.
A pesquisadora Leonarda Musumeci, que também coordenou o estudo, ressaltou que nas áreas nobres do Rio foi registrada maior percepção de impactos positivos do programa. Cerca de 48% dos moradores das zonas sul e centro afirmaram que a UPP trouxe benefícios; já os da zona oeste, área mais negligenciada pelo Poder Público, apenas 23% viram impactos positivos depois da UPP e 45% disseram que a UPP trouxe problemas, contra 18% dos moradores da zona sul e centro.
“Em outras palavras, os resultados da pesquisa parecem refletir a costumeira desigualdade de tratamento do Poder Público às regiões mais ricas e mais pobres do município”, afirmou.
“Na medida em que as UPPs foram se multiplicando, em uma velocidade impressionante, os cuidados que havia em relação às primeiras favelas atendidas, na zona sul, foram se perdendo. Nas últimas experiências mais para a zona oeste, essas favelas receberam um tipo de policiamento mais ostensivo, criando relações de hostilidade com os moradores”, explicou Sílvia.
Para 40% dos moradores, a falta de infraestrutura e de serviços urbanos é o principal problema enfrentado na favela, seguido de violência, insegurança, confrontos e tiroteios (32%).
(Com Agência Brasil)