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Desempenho fraco de prefeitos de esquerda dá munição a rivais para 2024

Fracassos em administrações muito mal avaliadas nas capitais serão explorados no período eleitoral

Por Laísa Dall'Agnol Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Victoria Bechara Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 09h49 - Publicado em 25 nov 2023, 08h00

O ano de 2020 foi difícil para a esquerda brasileira. Com o seu maior cabo eleitoral, o hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva, chamuscado pela Lava-Jato, e com Jair Bolsonaro no poder, os candidatos desse espectro político naufragaram nas eleições municipais — em especial o PT, que, pela primeira vez em sua história, não conquistou nenhuma das metrópoles mais importantes. Os partidos que mais levaram essas prefeituras estavam do centro à direita (pela ordem, MDB, PSD, DEM, PSDB e PL). Nas capitais, apenas quatro cidades escolheram um candidato de esquerda, todas no Norte/Nordeste: Recife, Fortaleza, Belém e Aracaju. Três anos depois, com Lula de novo no Palácio do Planalto, o sentimento é o de que será possível virar o jogo. Mas há um problema considerável no horizonte esquerdista: o desempenho ruim de seus prefeitos, o que tende a virar munição de adversários na campanha.

O caso mais delicado envolve a gestão mais à esquerda do país: a de Belém, comandada pela aliança PSOL-PT. O prefeito Edmilson Rodrigues (PSOL) ostenta no momento um recorde negativo: tem a desaprovação de nada menos que 71,3% da população, segundo levantamento feito no início do mês pelo Paraná Pesquisas — é de longe o prefeito mais mal avaliado entre todas as capitais pesquisadas pelo instituto. A péssima performance faz com que ele apareça em segundo lugar na pesquisa para a sua sucessão em 2024, atrás do deputado federal Éder Mauro (PL) — apenas 16,6% dos moradores de Belém estão, por ora, dispostos a lhe dar um novo mandato.

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MAU EXEMPLO - Edmilson Rodrigues: criticado até por correligionários do PSOL (Filipe Bispo/Fotoarena)

Problemas é que não faltam em sua gestão. Além de críticas a sua articulação política, ao inchaço da máquina e a falhas em ações básicas de zeladoria, como limpeza urbana, as greves de servidores por causa de salários atrasados ou por melhores condições de trabalho desgastaram ainda mais a imagem do prefeito — apenas no segundo semestre deste ano, houve paralisações de funcionários da Funpapa (fundação de assistência social) e de médicos de UPAs (Unidades de Pronto-Atendimento). Isolado, Rodrigues ainda enfrenta dificuldades de interlocução com o governo estadual, de Helder Barbalho (MDB), com a Câmara e até mesmo com uma ala do seu próprio partido.

Para se ter uma ideia do nível de rejeição, nem os companheiros de partido o poupam de críticas. Em agosto, a deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP) chegou a fustigar publicamente o correligionário. “O PSOL já administra uma prefeitura, que é a de Belém. E eu honestamente quero que o Boulos faça uma prefeitura como a de Luiza Erundina (…) e não como a do Edmilson, que infelizmente é um prefeito com uma das piores avaliações do país”, disse em um evento da legenda. Algumas lideranças do PSOL minimizam, no entanto, o possível impacto negativo em 2024. De uma forma um tanto quanto otimista, dizem que, depois de meses de crise fiscal, as dificuldades estão sendo enfrentadas com novos aportes dos governos federal e estadual. Além disso, apostam que os investimentos para a COP30, a cúpula ambiental que ocorrerá na cidade, terão forte potencial para melhorar a avaliação da prefeitura. Tendo em conta o cenário atual para lá de negativo, será quase um milagre se essa virada se concretizar.

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O mau desempenho do prefeito tem potencial até para influenciar eleições em outras capitais, em especial a de São Paulo, onde o psolista Guilherme Boulos desponta como favorito no momento. Aliados do prefeito Ricardo Nunes (MDB) afirmam que uma das estratégias contra Boulos será justamente a de associar a sua imagem ao fracasso em Belém. Em outras palavras, vão bater na campanha que uma gestão do PSOL pode ter resultados ainda mais desastrosos, considerando o tamanho e a complexidade de São Paulo. Boulos, naturalmente, já sentiu o cheiro de perigo — e tem uma resposta pronta. “Nunes deveria se preocupar com a gestão dele, que é péssima e mal avaliada em São Paulo. Eu vou usar a rejeição dele na minha campanha”, rebate. A desaprovação a Nunes, no entanto, está longe da ostentada por Edmilson Rodrigues em Belém. Segundo pesquisa Datafolha de setembro, o prefeito paulistano tem a gestão considerada ótima ou boa por 23% da população e regular por 49% — apenas 24% a avaliam como ruim ou péssima.

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Em Fortaleza, a esquerda vive um dilema parecido. O prefeito José Sarto (PDT), aliado do ex-ministro Ciro Gomes, tem a gestão reprovada por quase quatro em cada dez eleitores da capital do Ceará (veja o quadro). Nas sondagens eleitorais mais recentes, ele aparece em terceiro lugar, atrás do ex-deputado Capitão Wagner (União Brasil) e da ex-prefeita Luizianne Lins (PT). Como ocorre com Edmilson Rodrigues, apenas 16% dos eleitores aceitariam hoje lhe dar um novo mandato. Há dentro do PDT quem defenda inclusive que ele não seja candidato, e que o partido apoie o nome do PT (de quem os pedetistas são aliados no plano estadual). Uma das possibilidades é o ex-presidente da Assembleia Evandro Leitão, que acabou de deixar o PDT por divergências com o grupo de Ciro e Sarto e que deve ir para o PT. Aliados do prefeito acham, no entanto, que pode haver uma desidratação de Capitão Wagner e que Sarto pode ir ao segundo turno com um candidato petista — nesse caso, apostam que podem atrair o eleitorado de centro e de direita.

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Embora os pontos fracos sejam bem aparentes, a esquerda tem ao menos um reduto para comemorar o seu desempenho — e ironicamente é onde o gestor chegou ao poder após derrotar o PT numa das eleições mais acirradas de 2020. O prefeito do Recife, João Campos (PSB), tem a gestão aprovada por 71% dos eleitores, segundo pesquisa feita pelo Ipespe em outubro — mais do que a avaliação positiva de Lula e da governadora Raquel Lyra (PSDB). Campos ocupa o terceiro lugar no ranking de prefeitos mais bem avaliados das dez maiores capitais, segundo o Paraná Pesquisas, o que, naturalmente, o colocou no topo dos levantamentos de intenção de voto para 2024.

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RINDO À TOA - João Campos: prefeito do Recife tem governo aprovado por 71% dos eleitores e aliança que inclui até o ex-rival PT (Hélia Scheppa/PCR/.)

O desempenho de João Campos se dá, principalmente, pela reestruturação da educação no município, incluindo a contratação de professores, a reforma de escolas e a ampliação de vagas em creches, além de obras de infraestrutura. O prefeito tem o Conecta Recife como uma das principais marcas de sua gestão — um aplicativo para acesso a serviços municipais, como agendamento de consultas médicas e matrículas escolares, emissão de documentos e até a possibilidade de solicitar podas de árvores ou remoção de entulhos. Se vencer em 2024, o PSB irá para o quarto mandato seguido no Recife. João Campos já conta com o apoio de siglas de esquerda como PDT e PCdoB, mas terá também o apoio do ex-rival PT, inclusive de Lula. Nos bastidores, a disputa maior é pela vaga de vice na chapa, já que são grandes as chances de Campos deixar o cargo em 2026 para tentar o governo. A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, já manifestou o interesse na vaga. “Queremos manter a unidade feita entre PT e PSB na eleição do presidente Lula. Por isso entendemos que a posição de vice do prefeito é a posição ideal para nosso partido”, disse.

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Em uma escala um pouco menor de sucesso, Aracaju é outro exemplo de trabalho até aqui bem-su­cedido de uma gestão de esquerda. Edvaldo Nogueira tem aprovação de 66% dos eleitores — ­ex-PCdoB e atualmente no PDT, o prefeito está no quarto mandato como prefeito e não poderá disputar a reeleição em 2024. Ele já sinalizou, porém, uma inflexão ao centro ao dizer que pretende indicar o candidato para suceder-lhe em acordo com o governador Fábio Mitidieri (PSD), que derrotou o PT em 2022 no estado com o apoio do prefeito.

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RACHA INTERNO - José Sarto: imagem ruim em Fortaleza faz com que o PDT não esteja unido na defesa de seu nome (Caio Rocha/iShoot/Agência O Globo/.)

O sonho da esquerda em retomar os dias de glória nas maiores cidades do país depende muito, é claro, de como estará a popularidade de Lula no ano que vem. O tamanho do cacife do presidente como cabo eleitoral estará umbilicalmente ligado ao desempenho da economia, que, aliás, começa a dar alguns sinais de preocupação. “O bolsonarismo pode voltar a crescer em uma eventual crise de governo”, afirma Marco Antonio Teixeira, coordenador do mestrado em gestão e políticas públicas da FGV. O outro desafio será reverter, ao menos em parte, a péssima avaliação que a população faz de suas administrações em algumas das capitais. Nesse sentido, Belém e Fortaleza são hoje os grandes telhados de vidro desse projeto eleitoral.

Publicado em VEJA de 24 de novembro de 2023, edição nº 2869

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