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Tenentismo: uma força poderosa

O movimento faz 100 anos e continua influente, muito influente

Por Murillo de Aragão Atualizado em 4 jun 2024, 14h47 - Publicado em 21 fev 2020, 06h00

A mais poderosa força política do Brasil, o tenentismo completa 100 anos. Já em seu nascedouro, o movimento abalou as estruturas políticas do país. E, ao longo do tempo, influenciou eventos diversos, como as revoltas de 1922 e 1924, a Coluna Prestes, a Revolução de 1930, a Intentona Comunista de 1935, o advento do Estado Novo, a redemocratização em 1945, o suicídio de Getúlio Vargas, o golpe cívico-militar de 1964 e, mais recentemente, a eleição de Jair Bolsonaro, em 2018.

Vale registrar que o tenentismo tem origens no positivismo de Benjamin Constant, que, por sua vez, influenciou a quartelada que derrubaria o Império. O tenentismo tem também uma ainda pouco estudada inspiração nos movimentos liderados pelo marechal Kemal Atatürk, que acabou com o Império Otomano e fundou a República Turca. No Brasil, os tenentes de 1920 eram conhecidos como “jovens turcos” justamente por causa de seu ideário reformador, tal qual Atatürk.

Nossos tenentes eram quase todos saídos da Escola Militar do Realengo, na Zona Oeste do Rio. A instituição profissionalizou o Exército e reforçou seus credos, tornando parte de seus alunos protagonista da política nacional, além de eles virarem mentores dos que os seguiram.

“Sem a eclosão do chamado ‘neotenentismo’, Jair Bolsonaro não teria chegado ao poder”

O tenentismo pregou fortemente contra as oligarquias, a política conciliatória do “café com leite”, a corrupção e o loteamento de cargos, e defendeu o aperfeiçoamento do sistema eleitoral, o intervencionismo nacionalista na economia e uma agenda reformista do sistema educacional, entre outros temas que ajudaram a construir um ideário de enorme peso na tomada de decisões no Brasil dos últimos 100 anos.

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O fato de o tenentismo ter sido a mola ideológica do golpe cívico-militar de 1964 o condenou perante nossa intelligentsia, basicamente de centro-esquerda ou de esquerda. Daí o tema acabar quase banido dos círculos acadêmicos e ser relegado a um plano inferior na análise da história política brasileira. Porém, mais do que por sua evidente relevância histórica e política, o centenário do tenentismo merece ser observado com atenção, em virtude de dois fenômenos recentes. Um deles é a Operação Lava-Jato, promovida pela Polícia Federal a partir de março de 2014 contra a corrupção.

Em 2016, em artigo sobre o tema, afirmei que a força-tarefa da Lava-Jato queria reformar a política no Brasil por meio de suas investigações, representando uma espécie de “neotenentismo” antiestablishment político. Na ocasião afirmei também que, tal qual o movimento de 1920 encabeçado por jovens militares, os procuradores se viam como “agentes da regeneração” e “defensores das instituições republicanas”. Sem a eclosão do “neotenentismo” e de sua pauta moralizante, o presidente Jair Bolsonaro não teria chegado ao poder. E esse seria o segundo fenômeno recente. As narrativas do então juiz Sergio Moro, hoje ministro, e do procurador Deltan Dallagnol, ambos à frente da Lava-Jato, abriram caminho para o retorno do antigo tenentismo que instrui a base narrativa de Bolsonaro. Apenas por isso o tema já deveria atrair atenção, ainda que a potência influenciadora do tenentismo deva merecer reflexões aprofundadas.

Publicado em VEJA de 26 de fevereiro de 2020, edição nº 2675

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