A frase “É a economia, estúpido”, cunhada pelo marqueteiro James Carville em 1992 na campanha de Bill Clinton, tem sido largamente empregada em ocasiões diversas. Em especial para dizer que a economia, muitas vezes, é o assunto central das eleições. No Brasil de hoje, muitos dizem que a economia pós-pandemia será o tema principal na escolha do próximo presidente da República.
O raciocínio embute a ideia de que, se a economia estiver bem, Jair Bolsonaro pode ter condições de se reeleger. No entorno do presidente, porém, teme-se que: a) a inflação venha a prejudicá-lo; b) o novo programa social não seja suficiente para aquecer a economia; e c) o aumento de juros a ser promovido pelo Banco Central possa gerar estagflação. E o resultado de tudo seria a dificuldade de Bolsonaro chegar competitivo a 2022.
Ora, a situação que se apresenta é bastante desafiadora. Não apenas pela situação da economia, mas sobretudo pela política. Até mesmo porque todas as decisões econômicas têm se tornado cada vez mais políticas. Não à toa, cerca de 20% do dinheiro em circulação no mundo foi emitido nos últimos dois anos como resposta a crises diversas, em especial no enfrentamento da pandemia. Foram decisões políticas. E, em tempos de crise, elas se tornam sempre mais políticas.
No Brasil, a interferência da política na economia ocorre por razões específicas. A primeira reside no fato de que o Congresso ganhou autonomia diante do Executivo a partir do caráter impositivo das emendas de parlamentares ao Orçamento. A situação se agravou com o avanço do Congresso sobre as verbas discricionárias do presidente da República.
“Há um quadro de limitação de poder do Executivo. Assim, a racionalidade será espremida pelas circunstâncias”
A segunda razão refere-se à evidência de que, sem poder modular a execução das emendas dos parlamentares, a construção de uma maioria estável fica bem mais difícil. Aliás, os grandes organizadores de maiorias no Congresso são os presidentes da Câmara e do Senado, os quais, como se sabe, partem sempre de uma lógica política.
A terceira razão decorre do fato histórico de que o presidente teve limitada a sua liberdade de editar medidas provisórias. Para se ter uma ideia, a MP que criou o Plano Real foi reeditada anos a fio pelo temor de que, se votada, pudesse ser modificada. Hoje elas são limitadas à reedição, não podem ser repetidas no mesmo ano legislativo e têm restrições quanto à temática.
Essas três razões apontam para um quadro de limitação de poder do Executivo. E há mais sobre o encurtamento desse poder: a “recueta” de Bolsonaro no pós-7 de setembro revela o poder da política. A política se impôs porque o presidente levou um cartão amarelo do Supremo Tribunal Federal e a paciência da Câmara com ele estava próxima do limite.
A economia será decisiva, sim, em 2022. Mas o que vai decidir o estado da economia no ano eleitoral serão as decisões políticas tomadas a partir de agora. A pauta é intensa e complexa: propostas tributárias, precatórios, reforma administrativa, novo programa social e o Orçamento. Essas matérias serão deliberadas com forte componente político, seja pela situação política do presidente, seja pelo ciclo eleitoral que afeta o Congresso como um todo.
Assim, a racionalidade será espremida pelas circunstâncias.
Publicado em VEJA de 22 de setembro de 2021, edição nº 2756