A estratégia legislativa que une defensores da maconha e dos agrotóxicos
Número de propostas sobre um mesmo tema não acelera mudanças na legislação, mas pode ser útil para divulgação de políticos em ano de eleição
Apenas no primeiro semestre deste ano, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal já receberam nada menos que 2 067 novas propostas de leis, segundo levantamento feito a partir da plataforma InteliGov, de inteligência em relações governamentais. Fato é que muitos desses projetos são iguais a outros já existentes e não têm muitos objetivos senão a divulgação do trabalho e das ideias de seus autores, visto que em nada mudam a chance de aprovação de determinado pleito.
A estratégia está ao alcance de parlamentares de qualquer corrente ideológica, como é o caso do projeto nº 10 549/2018, do deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP), que defende a legalização da maconha para uso recreativo no Brasil. Ou das 29 iniciativas, na Câmara, que foram agregadas ao projeto que flexibiliza a lei dos agrotóxicos. No jargão legislativo, este processo ganha o nome de “apensamento”, que nada mais é do que reunir em uma única tramitação diversos projetos que tratem dos mesmos assuntos.
O objetivo é sempre ter o que mostrar às suas bases eleitorais — ou dar respostas a grupos de pressão — ao custo de engrossar os escaninhos das casas legislativas com a repetição de propostas que já estão em andamento. No máximo, os parlamentares trazem alguma nova justificativa ou ideia de redação, mas nada que não possa ser feito através de uma emenda, por exemplo.
No caso da proposta de legalização da maconha, ela foi apresentada a menos de três meses das eleições, quando não havia mais tempo hábil para que fosse analisada antes do recesso do Legislativo — acabou apensada a outra, de 2014. Na flexibilização dos agrotóxicos, coube ao deputado Luiz Nishimori (PR-PR) elaborar um 31º projeto, contemplando todas as outras propostas dos deputados, para que o texto fosse votado.
Tramitação parada
No caso da maconha, são sete as iniciativas legislativas relacionadas aos termos “maconha” e/ou “cannabis”. Tirando um projeto de autoria dos deputados João Campos (PRB-GO) e Roberto de Lucena (PV-SP), que queria declarar inconstitucional as “marchas da maconha” no Brasil, as outras seis seguem em tramitação. Cinco delas tem o objetivo de diminuir as restrições à produção e ao consumo de derivados da planta. Três incluem o uso recreativo da droga, enquanto as outras duas se concentram apenas nos aspectos medicinais. O sexto projeto, também de Lucena, é para reafirmar a proibição e endurecer a repressão contra a droga.
A proposta em estágio mais avançado para liberar o uso recreativo da maconha foi apresentada pelo ex-deputado Eurico Junior (PV-RJ) e motivou a criação de uma comissão especial para análise. Ficou nisso. Quatro anos depois, o colegiado ainda não foi instalado – e não há qualquer perspectiva que isso ocorra. Em 2016, o deputado Fábio Mitidieri (PSD-SE) protocolou um requerimento questionando o comando da Casa, até hoje não respondido.
Como não há prazo para que essa comissão seja constituída, passa a ser uma questão de vontade política dos partidos, que precisam indicar os nomes para compor o colegiado e ele passe a funcionar, o que mostra a completa dissociação entre a multiplicação de projetos e produtividade legislativa.