O desconforto de ficar em locais fechados é claustrofobia. A angústia de estar em aglomerações é agorafobia. Incomodar-se com pequenos sons que a maioria nem repara, como mastigar, tossir ou simplesmente limpar a garganta, é misofonia. A aflição ao falar em público é glossofobia. Como se não bastasse o mal causado por essas fobias, nossos tempos forjaram o medo de todos esses medos juntos. E ele ganhou um nome, é o FORTO.
Esta é uma abreviação de fear of returning to the office. Em tradução literal, seria o “medo de voltar para o escritório”. E o FORTO é real. Para sete em cada dez pessoas, retornar à rotina do escritório será “difícil” e “estranho”, segundo pesquisa da consultoria Korn Ferry.
Entretanto, com o avanço da vacinação e a queda no número de internações, cabe pensar. Será que esse temor de retornar ao local de trabalho está relacionado apenas com a Covid?
Imaginar o “chato” do escritório com dois anos de assuntos para botar em dia pode ser bastante assustador, a ponto de influir no seu FORTO. Não há quem esteja pronto para isso. Outras coisas também trazem pavor na retomada, como dividir espaços, evitar virar os olhos presencialmente e voltar a usar sapatos!
Afinal, depois das cavernas, dos feudos e das sesmarias, é nos escritórios que se enfrentam os limites humanos. Tanto físicos quanto, ultimamente, mentais, como o stress e a síndrome de burnout. Pois então veio a pandemia, que fechou tudo, inaugurou a era do home office e, de uma hora para outra, fez cessar esses transtornos fóbico-ansiosos para muita gente.
“Por incrível que pareça, já há quem sinta falta da fase dura do confinamento, das ruas sem trânsito”
Sim, no meio de tantas vítimas, muitas outras foram salvas. O que nos leva a uma outra nova palavra no léxico, “covidalgia”, a nostalgia do tempo da Covid-19. Isso mesmo, saudades da pandemia.
Por incrível que pareça, já há quem sinta falta da fase dura do confinamento, como a ausência de trânsito nas ruas vazias. Menos mesquinha, dentre as covidalgias mais sentidas para quem retorna à rotina estará a saudade da comida feita em casa, por exemplo. Outras perdas serão sentidas. Lá se vão hábitos saudáveis como a caminhada matinal, diante da necessidade de sair mais cedo e evitar o engarrafamento. E adeus a comer em família, diante da junk food cotidiana entre reuniões e os snacks da madrugada para entregar o relatório na primeira hora.
Como algo que ninguém controla, medos também são necessários. Fica difícil confessar, mas a verdade é que não descendemos do hominídeo mais valente. Esse achou que dava conta e foi comido pelo leão. Viemos do que estava logo atrás, do mais prudente. Ou seja, do “medroso”.
Sem poder evitar, resta superar o novo medo. A adaptabilidade que levou os funcionários para o home office agora será importante para fazer o caminho inverso.
De qualquer forma, diante da conjuntura atual, em que se teme o que inventam em boatos e fatos alternativos, esse seria só mais um livramento. Sorte que, neste caso, a pista está clara. Vencer o FORTO nos tornará mais fortes.
Publicado em VEJA de 29 de setembro de 2021, edição nº 2757