Eleições americanas: as chances da cannabis nas urnas
Além de escolher o presidente do país e parte do Congresso, eleitores de cinco estados vão decidir sobre o futuro da erva em suas jurisdições
Em 2017, quando comecei a desbravar o mercado da cannabis legal, estava em um evento na Califórnia e, conversando com um representante do MPP (Marijuana Policy Project ), lancei a pergunta: “O que nós temos que fazer no Brasil para reproduzir o que vocês já conquistaram aqui?”. A resposta foi tão boa quanto inesperada, ainda que motivada por interesse próprio: “A melhor coisa que vocês podem fazer é nos ajudar com a legalização da cannabis em nível federal aqui nos Estados Unidos. Se nós legalizarmos, o resto do mundo virá em seguida”. Às vésperas das eleições americanas, o tema novamente se impõe. Além de escolher entre o presidente republicano Donald Trump e o desafiante democrata Joe Biden, os eleitores vão votar para vagas na Câmara, no Senado e em mais uma infinidade de questões locais. Entre elas, algumas relacionadas a políticas estaduais para a cannabis.
De 2017 pra cá, mais três estados legalizaram o consumo e o comércio da erva por adultos: Michigan, Vermont e Illinois. Os três se juntam aos outros oito que já haviam tomado a mesma decisão: Colorado, Califórnia, Nevada, Oregon, Washington, Massachussets, Maine e Alaska. Em nível federal, contudo, a planta segue proibida e listada ao lado da heroína, do LSD e do MDMA, entre outras. De acordo com a maioria dos ativistas e analistas, nada indica que isso deva mudar em futuro próximo, mesmo que os democratas recuperem a maioria no Senado e a mantenham na Câmara. Reeleito, Trump não deve priorizar o tema, assim como Biden que, se vencer, terá muitos outros temas aos quais se dedicar e a legalização da cannabis vai ter que esperar. Será uma surpresa se o Congresso chamar a responsabilidade para si e pautar a questão. Pouquíssima gente aposta nisso. Nesse contexto, as principais iniciativas de avanço na regulamentação da erva continuam sendo as dos estados, mais especificamente cinco: Arizona, Dakota do Sul, Mississipi, Montana e Nova Jersey.
A seguir, apresento um resumo das especificidades regionais sobre as quais cada eleitorado vai decidir no próximo dia 3 de novembro, data das eleições.
Arizona
Depois de ser derrotada por pequena margem no pleito de 2016, a legalização volta às urnas por meio da proposição 207. Se aprovada, a medida legaliza a venda, posse e consumo de até uma onça (aprox. 28 gramas) de cannabis por adultos maiores de 21 anos.
Dakota do Sul
Há muito em jogo nessa disputa no meio-oeste já que, pela primeira vez, um estado vai votar propostas para legalizar, ao mesmo tempo, o uso medicinal e o recreativo da erva. Duas propostas estarão na cédula: a medida 26 e a emenda à constituição estadual A. A primeira visa criar um programa de cannabis medicinal para pacientes com moléstias graves. A emenda A, por sua vez, tem como objetivo proteger o direito de acesso à cannabis medicinal para os cidadãos do estado e permitir que indivíduos maiores de 21 anos possam portar e comprar até uma onça (aprox. 28 gramas) do produto. Se ambas forem aprovadas, será um momento histórico para os movimentos que lutam pela legalização nos Estados Unidos.
Mississipi
Em um modelo com grande potencial de gerar confusão, os eleitores desse estado se verão diante das iniciativas 65 e 65A. Se optarem pela 65, darão acesso à cannabis medicinal para pacientes com condições debilitantes, como câncer, epilepsia e ELA (esclerose lateral amiotrófica). Caso a vencedora seja a 65A, a regulamentação final ficará a cargo dos deputados estaduais, com risco de resultar em medidas mais restritivas.
Montana
Aqui também haverá duas propostas na cédula mas, ao menos, elas são complementares. Pela iniciativa I-190, os eleitores poderão legalizar a cannabis para maiores de 21 anos, além de estabelecer um arcabouço regulatório para vendas e cultivo. Já por meio da emenda constitucional CI-118, vão estabelecer a idade mínima para o consumo da erva em 21 anos.
Nova Jersey
Graças à sua localização geográfica, no rico e populoso nordeste dos Estados Unidos, o estado está atraindo a maior parte das atenções dos defensores da legalização. Uma decisão favorável à planta vai acabar gerando impactos significativos sobre alguns de seus vizinhos, principalmente Nova York e Pennsylvania, mercados ainda fechados, mas com milhões de consumidores em potencial. Por meio da Public Question 1, uma emenda constitucional, os eleitores de Nova Jersey podem legalizar a posse e o uso da cannabis por maiores de 21 anos, bem como regulamentar o cultivo, o processamento e a venda da erva e seus derivados.
Ainda que muitos estejam frustrados com a inércia federal, os americanos já demonstraram que aprovam o novo status da planta, seja como remédio, seja como substância recreativa. Em 2020 eles terão mais uma oportunidade para demonstrar o tamanho e o alcance desse apoio. Do nosso lado, nos resta acompanhar e, claro, torcer. Quem sabe um dia o prognóstico do sujeito do MPP se cumpre por aqui também?
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