Creatina pode ajudar na depressão? Nova análise investiga o elo entre o suplemento e a saúde mental
Pesquisadores brasileiros revisaram evidências para entender se a substância, popular no mundo esportivo, também pode ajudar na redução de sintomas depressivos
Produzida pelo corpo — nos rins, fígado e pâncreas — e obtida naturalmente em carnes e peixes, a creatina é um dos campeões de venda entre os suplementos usados por quem quer “turbinar” o desempenho físico. Nos últimos anos, porém, o interesse por ela ultrapassou as paredes da academia. Pesquisadores começaram a investigar se a substância, conhecida por abastecer os músculos de energia, também poderia dar um “empurrão” no humor.
À primeira vista, essa conexão pode soar sem pé nem cabeça. Porém, há um raciocínio biológico que sustenta essa história. O cérebro é um dos órgãos que mais consomem energia no corpo, e a creatina participa diretamente da produção e do transporte desse combustível dentro das células. Além disso, estudos indicam que pessoas com depressão tendem a apresentar níveis cerebrais mais baixos de fosfocreatina — e foi daí que surgiu a hipótese de que a suplementação poderia ajudar a restaurar esse equilíbrio.
Um dos trabalhos nesse sentido que mais repercutiram foi publicado em fevereiro deste ano na European Neuropsychopharmacology. Conduzido na Índia, o estudo envolveu 60 pessoas com depressão leve a grave que estavam havia pelo menos oito semanas sem antidepressivos. Metade recebeu 5 gramas diárias de creatina monohidratada em pó e a outra metade tomou a mesma quantidade de amido, usado como placebo. Além disso, todos participaram de sessões quinzenais de terapia cognitivo-comportamental.
O curioso é que ambos os grupos melhoraram, mas quem recebeu creatina apresentou uma redução mais marcante dos sintomas. A pontuação média caiu para 5,8 (faixa de depressão leve), enquanto o grupo placebo ficou em 11,9 (depressão moderada). Em outras palavras, o estudo apontou melhora significativa entre os participantes que suplementaram creatina.
Nova revisão
Uma nova revisão — possivelmente uma das mais abragentens já feita sobre o tema — traz novas pistas sobre a relação entre creatina e sintomas de depressão. Conduzido por pesquisadores brasileiros e publicado no British Journal of Nutrition, o trabalho reuniu 11 estudos clínicos que testaram o suplemento em pessoas com quadros depressivos, incluindo pesquisas já publicadas e outras que ainda não haviam vindo a público.
Em vez de começarem do zero, os autores revisaram tudo o que já havia sido feito sobre o assunto e combinaram os resultados, em uma tentativa de enxergar o panorama geral. Para entrar na análise, os estudos precisavam comparar grupos que receberam creatina por via oral com outros que tomaram placebo, sempre medindo os sintomas de depressão por meio de questionários validados.
No fim das contas, a creatina até mostrou algum mérito. Nos estudos analisados, ela superou o placebo na maioria dos casos — o que se traduziu numa redução média de 2,2 pontos na Escala de Hamilton, usada para medir a gravidade da depressão. O detalhe é que, segundo os próprios autores, uma diferença clinicamente relevante começaria a partir de 3 pontos. “Ou seja: o resultado é estatisticamente significativo, mas ainda não parece clinicamente expressivo”, explica o nutricionista Igor Eckert, um dos autores da revisão. “Chegamos a testar se excluir o estudo com resultado mais negativo mudaria o quadro, mas não mudou”, acrescenta.
Outro ponto é a grande variação entre os estudos: alguns mostraram benefícios consideráveis, outros praticamente nenhum efeito. Além disso, muitos ensaios tinham limitações importantes, como mostras pequenas, duração curta (geralmente de quatro a dez semanas) e alto risco de viés, como a possibilidade de os participantes descobrirem se estavam tomando creatina ou placebo, o que pode influenciar a percepção dos sintomas.
Mesmo assim, os resultados pareceram um pouco mais promissores quando a creatina foi usada como complemento ao tratamento convencional, junto de antidepressivos ou sessões de terapia. Já quando testada isoladamente, os efeitos foram bem menos consistentes. “Ainda assim, há mais dúvidas do que certezas. Não dá para afirmar que ‘funciona’, porque a maioria dos estudos tem vieses e fragilidades metodológicas”, resume Eckert.
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