Em 2019, graças ao desgaste de seu adversário na disputa, Renan Calheiros (MDB), Davi Alcolumbre (DEM) assumiu de forma surpreendente o Senado. Uma vez no cargo, manteve o ombro colado ao de Jair Bolsonaro como parte principal de uma estratégia para não se tornar apenas mais um cometa político de Brasília. O esforço não rendeu os frutos desejados. Enquanto o saldo de dois anos de sua gestão à frente do Senado foi insosso e sem nenhuma realização relevante, ele viu seu par Rodrigo Maia ganhar destaque no papel de líder do Parlamento e antagonista dos gestos mais radicais e destemperados do presidente. Agora, além de digerir a decisão do STF que o proibiu de disputar a reeleição à cadeira, Alcolumbre experimentou outro importante revés: a derrota de seu irmão Josiel, que perdeu a eleição para a prefeitura de Macapá no domingo 20.
Durante toda a disputa havia a expectativa de uma vitória do clã Alcolumbre em casa. E a espera (para não dizer agonia) foi longa. O calendário eleitoral da cidade foi adiado em consequência do apagão que afetou treze dos dezesseis municípios do Amapá por quase um mês. O favoritismo de Josiel estava amparado no apoio que ele conquistara das máquinas municipal e estadual. O apagão, porém, fez com que o candidato acumulasse a rejeição que a população direcionou para as autoridades locais, sobretudo para o já mal avaliado governador Waldez Góez (PDT). Também sobrou para o próprio Davi, que se empenhou de cabeça no projeto de ter a capital sob o controle da família. No auge da crise que deixou a população às escuras, numa tentativa de fazer o governo federal se mexer mais rápido e resolver o problema, ele vociferou que seu irmão era “o maior prejudicado” pela falta de energia no estado.
Resultado consumado, Alcolumbre agora parte para um terceiro grande desafio em apenas três meses. O atual presidente do Senado deseja fazer um sucessor que lhe permita daqui a um tempo sonhar com um retorno ao posto, como confessa intramuros. O escolhido é seu colega de partido Rodrigo Pacheco, eleito por Minas Gerais. Desta vez, no entanto, não será uma batalha individual. ACM Neto, presidente do DEM, deixou claro ser vital para o partido manter o controle de ao menos uma das Casas — a legenda comanda as duas atualmente. Desde que viu seu plano de permanência morrer no Judiciário e ciente da importância da disputa, Alcolumbre trabalha firme por Pacheco, a ponto de fazer promessas em nome dele.
Na tentativa de atrair o apoio do PT, numa pouco crível parceria da direita com a esquerda, acenou com a presidência da Comissão de Assuntos Sociais e um lugar numa das secretarias da futura Mesa Diretora. Em outra frente de atuação, tenta convencer Bolsonaro a abraçar o nome de Pacheco. Alcolumbre disse a dois interlocutores que o capitão deu o aval com a seguinte frase: “Se for meio Davi, já pode contar com meu apoio”. Como prêmio de consolação, ainda de acordo com a versão propalada pelo senador do DEM, Bolsonaro teria oferecido a ele um espaço na Esplanada em 2021.
Embora seja muito afável e habilidoso no trato com os pares, Alcolumbre possui certa dificuldade para assumir protagonismos, daí não ter aproveitado todo o potencial que a visibilidade do cargo de presidente do Senado proporciona. De uma maneira maldosa, integrantes da cúpula do DEM se referem a ele muitas vezes como “o vereador do Amapá”, numa referência a uma suposta miudeza política. “Davi tem uma característica raríssima. Ele reconhece sua limitação de conteúdo. Por isso, a timidez nos gestos e resistência aos holofotes”, defende um amigo. Seus detratores apostam que, ao entregar o cargo no dia 1º de fevereiro, ele tem tudo para voltar ao lugar onde sempre esteve antes de chegar à presidência: o fundo do plenário. Se Bolsonaro honrar o convite, no entanto, seus inimigos é que serão derrotados.
Publicado em VEJA de 30 de dezembro de 2020, edição nº 2719