Em missa de encerramento do Sínodo da Amazônia neste domingo, 27, o papa Francisco pediu pela defesa da terra diante de saques na região e convidou o mundo a escutar o grito dos pobres e marginalizados.
“Os erros do passado não foram suficientes para deixar de saquear e causar feridas a nossos irmãos e nossa irmã Terra: vimos no rosto desfigurado da Amazônia”, disse o papa diante de centenas de religiosos e outros convidados, entre eles indígenas provenientes da bacia amazônica.
Os trabalhos da assembleia, conhecida como sínodo, terminaram na noite de sábado 26, e entre as propostas do documento final está a de permitir que homens casados em regiões isoladas sejam ordenados padres.
A proposta, um marco para a Igreja, pode resultar numa mudança fundamental na centenária disciplina do celibato católico. Entre outros temas discutidos no sínodo de três semanas esteve também a preservação ambiental da Amazônia e o respeito aos povos indígenas e a suas culturas.
Em seu sermão na missa de encerramento do sínodo, na Basílica de São Pedro, Francisco criticou aqueles que consideram os povos indígenas “atrasados e de pouco valor”, não reconhecendo o que a cultura deles pode ensinar às outras.
O papa condenou “o desprezo” pela história e pelas tradições de outros povos, “considerando-os inferiores e de pouco valor” e que “apaga sua história, ocupa seus territórios, usurpa seus bens”, disse.
“Quanta suposta superioridade que hoje se converte em opressão e exploração!”, lamentou. Francisco também pediu também que os fiéis escutem “o grito dos pobres”.
O papa aproveitou para criticar, indiretamente, os setores da Igreja que trataram cinicamente dos ritos indígenas e denunciou a “religião do eu”, em um ataque aos ultraconservadores.
“Neste sínodo, tivemos a graça de escutar as vozes dos pobres e de refletir sobre a precariedade de suas vidas, ameaçadas por modelos de desenvolvimento predadores”, destacou.
“Quantas vezes, na Igreja as vozes dos pobres não são ouvidas, e até são alvo de piadas, ou silenciadas, por serem incômodas”, comentou, ao convidar à tomada de consciência da dor alheia.
O papa agradeceu aos mais de 250 participantes, entre bispos, religiosos e cardeais, além de 35 mulheres e 15 indígenas, pela “franqueza e sinceridade” demostrada durante as três semanas de trabalho no Vaticano.
Sínodo histórico
Os 184 bispos que participaram do sínodo aprovaram um documento que pede a criação do “pecado ecológico”, bem como a possibilidade de ordenar padres casados e estudar a possibilidade de contar com mulheres diáconos – temas tabu para os católicos conservadores.
Entre os pontos mais controversos aprovados, com 128 votos a favor e 41 contra, está a possibilidade de ordenar homens casados como padres, os chamados “viri probati”, muitos deles indígenas, para resolver a escassez de padres nas regiões remotas.
Um pedido sem precedentes que poderia gerar até uma cisma pela defesa do celibato dos padres em vigor desde o século XI, embora o texto reitere que considera o celibato “um presente de Deus”.
A questão agora vai para as mãos Francisco, que anunciou que preparará uma exortação apostólica antes do final do ano para comunicar sua decisão.
O papa anunciou que reabrirá uma comissão especial para estudar a possibilidade de ordenar mulheres diáconas, conforme solicitado pelos bispos, que superaram a maioria de dois terços, obtendo 137 votos a favor e 30 contra.
Indígenas endossam papa
A Coordenadoria das Organizações Indígenas dos nove países da Bacia Amazônica (COICA), cujo líder participou do sínodo, expressou sua “esperança” em relação ao compromisso do papa Francisco contra a pilhagem das Amazônia.
“Temos o apoio de um poderoso aliado, esse corajoso papa e seu exército de bispos e padres que prometeram caminhar conosco e nos ajudar a transformar um modelo de desenvolvimento que põe em risco todo o planeta”, afirmou a organização em comunicado.
“O Vaticano se une à comunidade científica e a um crescente exército de jovens para reconhecer os povos indígenas como fundamentais para conservar nosso planeta. Onde nossos direitos são fortes, onde são respeitados, as florestas permanecem”, alerta a nota.
“Precisamos de ação e não de palavras. Nosso mundo florestal está em crise e os povos indígenas da Amazônia estão sendo criminalizados e mortos por confrontar as poderosas forças econômicas que cobiçam nossa riqueza natural”, diz a entidade.
“Temos a esperança de que outros possam nos ver, como nos vê o papa”, conclui o comunicado.
(Com AFP e Reuters)