Black Friday: Revista em casa a partir de 8,90/semana
Continua após publicidade

Vinicius Jr.: o futebol é mero detalhe

Sem a Bola de Ouro, ele merece ser celebrado por uma postura maior do que o desempenho em campo: sua corajosa luta contra a chaga do racismo

Por Alessandro Giannini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Fábio Altman Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 2 nov 2024, 08h00
  • Seguir materia Seguindo materia
  • A Bola de Ouro, prêmio concedido pela revista France Football desde 1956, é a mais prestigiada láurea do esporte de Pelé — a Fifa também criou um troféu, o The Best, que ainda briga para ganhar relevo ante a história de mais de sessenta anos da criação francesa original. A edição de 2024 do evento, cujos vencedores foram anunciados na segunda-feira 28, começou com um papelão — os cartolas do Real Madrid, ao descobrirem previamente que nenhum de seus jogadores venceria a disputa, cancelaram o embarque para Paris, na última hora, com os bilhetes já comprados e presença confirmada, como se houvesse algum complô contra a equipe merengue, vencedora da Liga dos Campeões da temporada de 2023/2024.

    Foi uma descortesia com a organização da festa e também com o treinador Carlo Ancelotti, que seria escolhido como o melhor, e portanto não pôde subir ao palco. Não demorou para que as redes sociais, onde os palpites pululam sem discernimento, batessem tambor em torno da suposta motivação para o forfait madrileño: desrespeito com a clássica agremiação, especialmente pelo fato de nenhuma de suas duas maiores estrelas —Vinicius Jr. e o inglês Jude Bellingham — estarem no topo do pódio. O vencedor, soube-se depois, seria o espanhol Rodri, hoje no Manchester City, formado profissionalmente pela base do Atlético de Madri. Alegou-se, como motivo central de toda a confusão, uma suposta postura racista contra o brasileiro. Vinicius Jr. ficou com a segunda colocação, à frente de Bellingham, o terceiro.

    Não há como pôr a mão no fogo por nenhum dos 100 jornalistas do colégio eleitoral da France Football — e ao menos um deles, de El Salvador, deixou Vinicius Jr. de fora dos dez primeiros. Não se trata de asseverar que sejam todos ímpios e corretos, a fina flor da honestidade e correção moral, mas o caminho contrário também seria um chute para fora. É difícil, para não dizer impossível, afirmar que o veredicto tenha bebido do preconceito de cor, e ponto. Para começo de conversa: o meio-campista Rodri é extraordinário, inigualável na condução de bola e visão de jogo. Compará-­lo, na frieza da estatística, com o atacante formado pelo Flamengo é didático e não revela nenhum absurdo. O craque do City fez 63 partidas, com doze gols e catorze passes decisivos para o tento. O craque do Real jogou 49 vezes, com 26 gols e onze assistências. Rodri ganhou a Premier League, a SuperCopa da Europa, o Mundial de Clubes da Fifa e a Eurocopa com a camisa da Fúria. Vinicius Jr. abocanhou o campeonato espanhol, a SuperCopa da Espanha e a Liga dos Campeões — fracassou apenas na seleção brasileira, com atuações modestas. Resumo da ópera: poderia ser Rodri, poderia ser Vinicius Jr. — inclusive Bellingham. A pequena distância de desempenho não autoriza, portanto, imaginar votos intolerantes. “Obviamente, Vinicius Jr. sofreu matematicamente com a presença de Bellingham e também de Dani Carvajal entre os favoritos no top five, porque os votos foram diluídos”, disse Vincent Garcia, editor-chefe da France Football.

    NÚMERO 1 - Rodri, do Manchester City: habilidade e visão inigualáveis
    NÚMERO 1 - Rodri, do Manchester City: habilidade e visão inigualáveis (Dave Howarth/CameraSport/Getty Images)
    Continua após a publicidade

    Há um outro modo de enxergar a decepção em torno de Vinicius Jr., e ele tende a ser muito mais produtivo no combate à infâmia do preconceito. Cabe instalar o atacante — ao menos por ora, até que desponte novamente como favorito para a Bola de Ouro do ano que vem, dada a velocidade e a vontade de estufar a rede — em lugar nobilíssimo, de extraordinário relevo: o da luta contra o racismo. Não há, na história do futebol, um jogador que tenha desempenhado papel com destaque equivalente, em luta fundamental e inegociável. Pelé não fez isso. Ronaldinho Gaúcho não teve postura de mesma dimensão. Não seria exagero imaginar que, lá na frente, os gestos de Vinicius Jr. ecoem no futebol e vizinhanças como a de Muhammad Ali no boxe e além das quatro cordas.

    NÚMERO 3 - Jude Bellingham, o inglês do Real Madrid: velocidade
    NÚMERO 3 - Jude Bellingham, o inglês do Real Madrid: velocidade (Diego Souto/Getty Images)

    Logo depois da premiação, Vinicius Jr. foi às redes sociais e postou uma mensagem um tanto enigmática — “Eu farei 10x se for preciso. Eles não estão preparados”. As palavras foram traduzidas como grita contra a derrota na Bola de Ouro, e ele tem todo o direito de bater o tambor, por sentir-se incomodado. O correto, contudo, seria apartar o desabafo da premiação, descolando a ilação de causa e efeito, para ficar apenas com o que Vinicius Jr. estampou: tomara, sim, que ele continue a esbravejar, dez, vinte vezes mais, contra o crime do racismo, de que é vítima em sucessivos momentos, dentro e fora dos gramados. A voz do atacante — com ou seu a alcunha de número 1 do mundo — é fundamental e inegociável. É corajosa. Na véspera da festança em Paris, aliás, depois da derrota do Real por 4 a 0 para o arquirrival Barcelona, houve inaceitável estupidez dos torcedores. Vinicius Jr. não teve dúvida e postou no X: “Lamentável o que aconteceu ontem no Bernabéu com insultos racistas. Não há espaço para esses criminosos em nossa sociedade”. Vinicius Jr. não pode ser calado. Se levará ou não o troféu, um dia, é detalhe. Pouco importa. Seria bom e, quem sabe, merecido em futuro próximo. O último brasileiro a brilhar mais do que todos foi Kaká, em 2007.

    Publicado em VEJA de 1º de novembro de 2024, edição nº 2917

    Publicidade

    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Semana Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    BLACK
    FRIDAY

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    Apenas 5,99/mês*

    ou
    BLACK
    FRIDAY
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

    a partir de 35,60/mês

    ou

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.