Suspeitas de desmatamento não freiam exportações do agronegócio brasileiro
Apesar da ampla divulgação da devastação da Amazônia em todo o mundo, as vendas brasileiras no campo só crescem
O agronegócio é um dos principais motores da economia brasileira. Enquanto empresas de diversos setores da economia têm seus resultados assolados pela Covid-19, o mesmo não acontece com a produção do campo no Brasil, que vai de vento e popa. Exemplo disso são os dados divulgados na tarde desta segunda-feira, 15, pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex), do Ministério da Economia: houve superávit de 1,599 bilhão de dólares e corrente de comércio de 6,309 bilhões de dólares na balança comercial brasileira na segunda semana de junho desse ano. No ano, o saldo é positivo em 18,891 bilhões de dólares, com exportações totalizando 92,611 bilhões de dólares e importações com 73,72 bilhões de dólares. O principal responsável por este resultado positivo é a atividade relacionada à agricultura e à pecuária: quando comparada à média diária até a primeira semana de junho de 2019 em relação à média diária até a primeira semana de junho de 2020, as exportações caíram 7,2%, por causa da diminuição de -22,6% das vendas na Indústria Extrativa e de -15,7% das vendas da Indústria da Transformação. As vendas na Agropecuária, no entanto, cresceram 34,3%, segurando parte do resultado. Ao mesmo tempo que o Brasil comemora os bons números das vendas ligadas ao campo, notícias negativas sobre a condução da política do meio ambiente brasileira continuam repercutindo na mídia internacional. Um estudo publicado na The Economist, um dos mais relevantes veículos de imprensa do Reino Unido, mostra por meio de imagens de satélite que parte das exportações da soja provêm de estados com grandes áreas devastas.
O Trase, estudo realizado pelas organizações não governamentais Stockholm Environment Institute e Global Canopy em parceria com os institutos brasileiros ICV e Imaflora, rastreou o caminho que os suprimentos brasileiros percorrem no Brasil, do cerrado e de áreas da Amazônia até portos internacionais. O resultado da pesquisa foi bastante negativo: 19% da soja que saiu do Mato Grosso para a União Europeia em 2018, no valor aproximado de 95 milhões de dólares, teriam vindo de fazendas de desmatamento ilegal. “Encontramos níveis preocupantes de desmatamento ilegal em fazendas de soja no Mato Grosso, e uma quantidade significativa dessa soja provavelmente foi importada para a EU”, disse André Vasconcelos, pesquisador do Trase e principal autor do relatório. “É crucial verificar a conformidade legal de seus fornecedores”, disse. O estudo sugere que, apesar de muitos compradores confiarem na Moratória da Soja, ou seja, um pacto ambiental entre entidades que prevê medidas contra o desmatamento, ele não seria capaz de verificar quando o desmatamento ocorre em outras regiões das fazendas e também não protegeria regiões do Cerrado.
É fato que desde o segundo semestre do ano passado o Brasil vem sendo muito criticado em todo o mundo pelo aumento do desmatamento na Amazônia, como é o caso desse estudo divulgado hoje. Especialistas ouvidos pela reportagem acreditam, porém, que as críticas não vão afetar o agronegócio. Isso se deveria às vantagens competitivas do setor, cuja tecnologia de ponta e alta produtividade o fazem vender com preços competitivos em relação aos concorrentes. “Eu não vejo o Brasil perdendo mercado, os números dizem exatamente o contrário”, diz Flávio França Junior, chefe do setor de grãos da consultoria Datagro. O setor acredita que as políticas ambientais brasileiras são sólidas e essas reprovações seriam motivadas pelo acordo do Mercosul com a União Europeia, que geraria temor em produtores agropecuários europeus diante da entrada dos concorrentes brasileiros. “Na minha opinião, isso é lobby dos produtores da Europa, que não querem competição com o produto brasileiro. Temos uma legislação pesada em cima do produtor” diz França Junior. Diante da incompatibilidade de informações, uma coisa é fato: o governo Bolsonaro, que não tem dado muitas demonstrações de transparência na prestação de informações à sociedade, precisa parar de dar declarações polêmicas e começar a pensar em formas de demonstrar que a produção do agronegócio brasileiro está em conformidade com as regulamentações ambientais.