Quem é o ‘Rei da Vacina’, que dobrou seu patrimônio com a Covid-19
Maior fabricante de vacinas do mundo, o Instituto Serum impulsionou riqueza do indiano Cyrus Poonawalla; companhia distribuirá 2 milhões de doses ao Brasil
Filho de um criador de cavalos, o bilionário indiano Cyrus Poonawalla, fundador do Instituto Serum, maior fabricante de vacinas no mundo, tem motivos para sorrir mesmo em meio à pandemia que afetou negócios por todo o mundo. Desde o início da disseminação do novo coronavírus, no intervalo de um ano, seu patrimônio líquido dobrou, saindo de 8 bilhões de dólares para a faixa dos 16 bilhões de dólares. O ganho exponencial deve-se, de certa forma, à proliferação da doença. Por sua capacidade de produção em larga escala, o Instituto Serum virou peça-chave na estratégia global de combate à Covid-19. Em 2020, o laboratório indiano firmou uma parceria com a AstraZeneca e a Universidade de Oxford para produzir e distribuir a “Covishield” mundo afora. O Brasil, recentemente, adquiriu 2 milhões de doses do imunizante e, agora, aguarda ansiosamente sua remessa. Enquanto isso não acontece, o antígeno produzido pelo Serum está sendo empregado na Índia. Além do Brasil, África do Sul, Bangladesh e Marrocos negociam com a fabricante, que firmou acordo para estocar, a partir de abril, outra vacina contra a enfermidade, a “Prevent-19”, desenvolvida pela farmacêutica americana Novavax.
Sétima pessoa mais rica da Índia, Cyrus Poonawalla fundou o Instituto Serum em 1966 e hoje é conhecido mundialmente como o “Rei da Vacina”. A empresa se notabilizou ao produzir imunizantes contra sarampo, poliomielite, tétano e, agora, Covid-19 — a farmacêutica anunciou investimentos da ordem de 800 milhões de dólares para a produção do novo antígeno. Mas o magnata tem deixado, nos últimos meses, os holofotes para o filho único. É Adar Poonawalla que coordena a empreitada de levar os imunizantes ao maior número de pessoas possível — na Índia e no mundo. Na última semana, ele reforçou a parceria com o governo do primeiro-ministro, Narendra Modi, para o início da vacinação no país. “Oferecemos as vacinas a um preço especial de 200 rúpias [cerca de 14 reais] para cada uma das primeiras 100 milhões de doses distribuídas ao governo da Índia. Queremos apoiar os vulneráveis, pobres e profissionais da saúde”, disse ele. Cada dose do antígeno adquirido pelo Brasil custou 5,25 dólares (ou pouco menos de 30 reais). A exportação das vacinas se iniciará nos próximos dias, segundo o diretor-executivo do Serum.
Adar Poonawalla trabalha para a companhia do pai desde 2001, quando se formou na Universidade de Westminster, no Reino Unido. Tornou-se CEO da farmacêutica dez anos depois. Sob seu comando, o Instituto Serum se expandiu, chegou a comprar concorrentes, e voltou seus esforços para a exportação de vacinas e produtos licenciados pela Organização Mundial da Saúde, a OMS. Ganhou tanta escala que assumiu o posto de maior produtor (em volume) de imunizantes no mundo a partir de 2017, com mais de 1,5 bilhão de doses produzidas ao ano. Não por acaso, a fortuna da família Poonawalla também explodiu. Segundo um indicador da Bloomberg, o patrimônio líquido do patriarca cresceu mais de 210% desde 2015, quando já era avaliado em 5,24 bilhão de dólares.
Sempre elegante, portando óculos, traje a rigor, um anel dourado na mão esquerda e um charuto entrelaçado aos dedos da mão direita, Cyrus Poonawalla é uma figura excêntrica, mas pouco conhecida longe do mundo das vacinas. Em junho de 2020, quando firmou acordo para produzir a Covishield, prometeu desenvolver um bilhão de imunizantes para países pobres. É possível que sua inspiração venha do próprio país onde vive. Uma das nações mais desiguais do mundo, a Índia apareceu, no último Índice de Desenvolvimento Humano, apenas na posição 129 entre 189 países.
Até por isso, a família Poonawalla ganhou os holofotes em 2015, quando o clã adquiriu a “Lincoln House”, mansão que abrigava o consulado dos Estados Unidos em Mumbai desde 1957. Localizada na maior cidade e centro financeiro indiano, a propriedade de aproximadamente 5.000 metros quadrados pertencia ao governo americano e a um marajá indiano. À época, Cyrus desembolsou cerca de 8 bilhões de rúpias (ou algo em torno de 120 milhões de dólares, em valores da época) para obter o belo e elegante edifício, transformando o espaço em uma casa de veraneio para a família. Voltou a ganhar o noticiário quando, em 2017, arrematou um autorretrato de Mahatma Gandhi, feito a lápis em 1931, por 32.500 libras, três vezes acima do valor estimado para o quadro. Ajudar os mais pobres hoje talvez seja uma missão — ou apenas peso na consciência. O que se sabe, de fato, é que os Poonawalla devem continuar faturando alto ao menos até que a Covid-19 deixe de ser um problema global.