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Pedro Jobim: 2ª década perdida acabou; será o fim de décadas perdidas?

Frágil condição fiscal tem importante papel na deterioração observada; não é mais possível adiar esse encontro de contas, sob pena de rápido naufrágio

Por Pedro Jobim *
Atualizado em 3 mar 2021, 14h34 - Publicado em 3 mar 2021, 11h08

A contração do PIB em 2020, divulgada nesta quarta-feira pelo IBGE, foi de 4,1%. O resultado confirmou queda da atividade econômica mais intensa do que a média mundial para o mesmo período, que foi de -3,5%, de acordo com a última estimativa do FMI, a despeito de o Brasil haver promovido o maior aumento de gastos, como proporção do PIB, dentre todos os países emergentes, no contexto do combate à pandemia. 

Todavia, destacar o desempenho abaixo da média em 2020 não é a melhor forma de colocar em perspectiva o que vem ocorrendo com a renda relativa do Brail. A tabela abaixo consolida o crescimento do PIB real per capita, separado por décadas, no Brasil e no mundo.  

É possível perceber quatro fases distintas, nesses últimos sessenta anos. Após duas décadas de crescimento acima da média mundial (1961-80), o país viveu a chamada “década perdida” (1981-90), período em que a economia brasileira, fortemente endividada em dólares, não resistiu à elevação dos juros nos EUA, e mergulhou na recessão, tendo a renda per capita do país recuado em cerca de 5%. Já no período 1991-2000, marcado pelos últimos anos de hiperinflação e mudança de regimes cambiais, o país cresceu apenas a metade da média mundial. Na década seguinte (2001-2010), com o benefício do choque favorável no preço das commodities, o Brasil conseguiu acompanhar o ritmo de crescimento mundial.

A década que se encerrou em 2020 merece um comentário mais detalhado. Na esteira da recuperação da crise financeira global de 2008-2009, o país ainda logrou crescer, a taxas modestas, entre 2011 e 2014. Porém, a economia, não resistindo à soma dos efeitos do excesso de intervencionismo do governo Dilma, da forte elevação da moeda americana, em 2014, e dos bilionários processos judiciais contra empresários e políticos corruptos, que tanto marcaram aqueles anos, viveu forte recessão no biênio 2015-16. O Brasil, assim, teve redução média na renda per capita de 0,4% ao ano neste subperíodo, enquanto o PIB global per capita avançou 2,4% ao ano. 

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As sequelas da recessão de 2015-16 foram severas. As finanças públicas, deterioradas por décadas de ação do mecanismo indutor de crescimento de gastos e impostos introduzido pela Constituição de 1988, precisaram ser amparadas pelo instituto do teto de gastos, que tem se revelado fundamental para limitar o crescimento das despesas da União, pelo menos enquanto não se encontra uma solução para o crescimento das despesas obrigatórias. (Sobre a Constituição de 1988, vale explicar que a garantia de montantes mínimos a serem gastos com saúde e educação e a obrigatoriedade da correção dos benefícios previdenciários pela inflação, além de outros mecanismos criadores de despesas adicionados ao longo dos anos, determinaram forte e contínuo aumento na carga tributária a partir de 1994.)

A reforma da previdência, aprovada em 2019, foi um importante avanço nessa direção. O país se adequava, a partir do governo Temer, ao redirecionamento do eixo de crescimento para o setor privado – em oposição ao foco na expansão do setor público, no período anterior—, e parecia se encaminhar para uma aceleração da atividade econômica, quando foi abatido pelo meteoro da pandemia. O resultado final da década aponta um desempenho relativo da renda per capita idêntico ao registrado na década de 80, justificando a reedição da alcunha – a segunda “década perdida”. 

O gráfico abaixo ilustra por outro ângulo a história que contamos acima. O PIB do Brasil, como fração do PIB mundial, na métrica de paridade pelo poder de compra, é hoje pouco mais da metade do que era há 40 anos, tendo os grandes ajustes para baixo acontecido nas “décadas perdidas” de 1980 e 2010.  

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PIB

Terá nosso ciclo de “décadas perdidas” se encerrado em 2020? A resposta, como sempre, estará nas opções a serem feitas pela sociedade. Nas atuais circunstâncias, a primeira etapa rumo a uma melhor perspectiva econômica passa por aprovar, em sua íntegra, o marco fiscal para a federação (PEC 186), que se encontra em plena tramitação no Congresso Nacional, com finalização prevista para as próximas semanas. Nossa frágil condição fiscal tem tido importante papel na deterioração observada no quadro econômico, não sendo mais possível adiar esse encontro de contas, sob pena de rápido naufrágio. Na mesma linha, a reforma administrativa, também já encaminhada ao Congresso, teria importante papel na redução de despesas obrigatórias à frente, e reabriria  espaço orçamentário para investimento público. 

É preciso, ainda, ampliar o programa de privatizações – preferencialmente com a venda de toda e qualquer empresa estatal à iniciativa privada. Estão mais do que demonstrados o peso do fardo e do atraso representado pela existência de empresas estatais, confirmado pelo recente episódio envolvendo a Petrobras. Não menos importante, na agenda do crescimento, é avançar na simplificação de nosso kafkiano sistema tributário, e na abertura de nossa economia ao exterior. 

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A maior parte dessas questões já foi equacionada pela maioria das demais economias relevantes, e é por este motivo que o Brasil está, literalmente, ficando para trás.

Haveria obviamente muitos outros aperfeiçoamentos que poderiam se seguir aos enumerados – esta breve lista é apenas um grupo mínimo de reformas imprescindíveis para que o processo de redução da relevância da economia brasileira seja, pelo menos, interrompido.

Caso não avancemos nessa agenda, continuaremos vivendo uma sucessão de ciclos semelhantes aos dos últimos anos, caracterizados pela sequência de crescimento medíocre, esperanças de retomada cada vez mais tênues, e recessões cada vez mais profundas. O empobrecimento e o envelhecimento já são processos suficientemente difíceis para serem vividos separadamente por qualquer sociedade. Quando são simultâneos, tornam-se ainda mais dolorosos.   

* Pedro Jobim é sócio fundador da Legacy Capital e Ph.D em economia pela Universidade de Chicago

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