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Pacote de Lula dá fôlego às exportadoras, mas acende alerta de novo risco fiscal

Os tropeços do passado servem de alerta para que se trate o novo programa de auxílio com prudência

Por Juliana Elias Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Felipe Erlich Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 17 ago 2025, 13h09 - Publicado em 17 ago 2025, 08h00

Criado em 2021 com o objetivo de socorrer empresas de serviços sufocadas pela pandemia, o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) tornou-se um caso exemplar da tradição brasileira de transformar medidas provisórias em privilégios permanentes. Previsto para durar cinco anos e custar 4 bilhões de reais anuais, o programa zerou parte dos impostos das empresas de eventos. Em 2023, porém, já queimava quatro vezes mais recursos e havia ampliado seu alcance para muito além de restaurantes, cinemas, feiras e hotéis, passando a beneficiar até influenciadores digitais e grandes plataformas de delivery. Após desgastantes negociações entre Planalto e Congresso, o Perse foi extinto em abril deste ano. Mas ele quase entrou para uma lista de emergências sem fim: a desoneração da folha de pagamento, criada em 2011, e a Zona Franca de Manaus, inaugurada em 1967, também nasceram temporárias, mas permanecem em vigor até hoje.

Sob a pressão para que velhos erros de planejamento não se repitam — e, sobretudo, diante do caixa vazio para sustentar subsídios —, o presidente Lula apresentou na quarta 13 seu pacote de socorro às empresas atingidas pela supertarifa de 50% imposta pelos Estados Unidos a produtos brasileiros. Em vigor desde o dia 6, a medida americana atinge cerca da metade de tudo o que o Brasil exporta para lá. Entre os prejudicados estão centenas de grandes e pequenos produtores, de carne, café e frutas a calçados, móveis e máquinas. Muitos tinham nos Estados Unidos seu principal, quando não único, cliente. “É importante que as medidas sejam bem desenhadas e pontuais”, afirma Murilo Viana, consultor da GO Associados, especializado em contas públicas. “No Brasil, infelizmente, sabemos que, uma vez concedida, uma ajuda raramente deixa de existir.”

arte pacote

O pacote de contingência, batizado de Brasil Soberano, prevê linhas de crédito com juros reduzidos, garantias para novos financiamentos, abatimento de impostos e até a compra, por prefeituras e governos estaduais, de alimentos encalhados com a perda das exportações. O Planalto garante que, desta vez, haverá critérios claros para a distribuição dos recursos, levando em conta o porte das empresas, o tipo de produto comercializado e o peso das vendas para o mercado americano. Ainda assim, os tropeços do passado servem de alerta para que se trate o novo pacote com prudência.

O carro-chefe do programa é a liberação de 30 bilhões de reais, hoje aplicados em um fundo do BNDES, para a oferta de novas linhas de financiamento à exportação com juros reduzidos, direcionadas às empresas atingidas pelo tarifaço. Além disso, serão aportados 4,5 bilhões de reais nesses fundos de crédito, e outros 5 bilhões foram reservados para ampliar o desconto de impostos sobre produtos exportados. A soma de 9,5 bilhões de reais representa, de fato, o montante que sairá dos cofres públicos diretamente para reforçar o caixa das empresas — e, no curto prazo, pressionar as contas federais. O valor não é pequeno para um governo que já projeta encerrar o ano com déficit de 26 bilhões de reais, bem próximo do limite fixado pela meta fiscal, de 31 bilhões.

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SEM ACESSO - Scott Bessent, do Tesouro americano: o Brasil nem sequer consegue obter uma reunião
SEM ACESSO – Scott Bessent, do Tesouro americano: o Brasil nem sequer consegue obter uma reunião (Allison Robbert/AFP)

Não por acaso, a equipe econômica sinalizou que pedirá ao Congresso autorização para excluir os novos gastos da meta fiscal. “O problema não é o valor em si, mas o fato de que ele se soma a uma sequência de decisões irresponsáveis do governo, que vive encontrando maneiras de driblar as regras fiscais”, afirma Luis Leal, economista-chefe da gestora G5 Partners. Para Welber Barral, sócio da consultoria BMJ, há outro risco: “Medidas de crédito como essa quase sempre acabam beneficiando apenas as grandes empresas”. O programa promete dar prioridade às pequenas e médias exportadoras no acesso ao crédito subsidiado, mas, como ressalta Barral, ainda pairam incertezas sobre como serão definidos os critérios e aplicadas as regras.

Depender do socorro permanente não interessa nem mesmo aos produtores. “Vamos trabalhar muito para que essas medidas sejam apenas temporárias e superadas o mais rápido possível”, afirmou o presidente da Confederação Nacional da Indústria, Ricardo Alban, ao comentar o anúncio do pacote. Na avaliação de Igor Rocha, economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a iniciativa “não elimina o prejuízo, mas oferece algum alívio”. Antes do anúncio, a Fiesp estimava que as tarifas americanas, como estavam desenhadas, poderiam cortar 0,2 ponto percentual do PIB em 2025. Agora, com o plano de 30 bilhões na mesa, a XP Investimentos calcula que a perda pode ser integralmente compensada.

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DIFÍCIL DE TIRAR - Comércio fechado na pandemia: o Perse ganhou sobrevida
DIFÍCIL DE TIRAR - Comércio fechado na pandemia: o Perse ganhou sobrevida (Bruna Prado/Getty Images)

Os maiores desafios, no entanto, estão a médio e longo prazo — é aí que surge o temor de que um pacote emergencial acabe ganhando sobrevida e sendo renovado indefinidamente. “Buscar novos mercados é essencial”, afirma Sérgio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados. “Não dá para depender só de pacote fiscal. O risco de as empresas chegarem ao ano que vem ainda em dificuldades, sem conseguir redirecionar suas mercadorias, é considerável.” Nesse sentido, o chamado “eixo diplomático” é uma das apostas do plano: o próprio Lula prometeu intensificar a busca de novos parceiros comerciais, sem abandonar a tentativa de negociação com os Estados Unidos, embora os pedidos de reunião de ministros brasileiros sigam sem resposta do secretário do Tesouro americano, Scott Bessent. Índia, Vietnã, Emirados Árabes e Canadá já figuram no novo mapa de prospecção. O problema é que Lula busca novos mercados com três décadas de atraso: o Brasil é um dos países que menos avançaram em acordos comerciais desde os anos 1990 e, agora, terá de começar do zero um trabalho que outros lapidam há anos.

O desafio é imenso. As exportadoras, de fato, ganharão um fôlego extra para se adaptar à tarifa de 50% imposta por Trump. Mas o presidente americano permanecerá no cargo até 2029, e os fatores que motivaram sua decisão, em especial o imbróglio jurídico-político de Jair Bolsonaro, dificilmente mudarão nesse período. O Brasil não pode sustentar indefinidamente um plano de socorro dessa magnitude. É preciso que os setores contemplados caminhem com as próprias pernas em um futuro próximo. Espera-se também que o governo troque a retórica bélico-­demagógica pelo pragmatismo diplomático. Só assim a ideia de um Brasil soberano deixará de ser um slogan para se tornar realidade.

Publicado em VEJA de 15 de agosto de 2025, edição nº 2957

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