Galípolo toma posse no BC em um dos momentos mais críticos da história
Novo presidente do Banco Central assume oficialmente o cargo a partir desta quarta-feira, com duras batalhas no horizonte, como a inflação e o câmbio

Ninguém disse que seria fácil. Gabriel Galípolo chega à presidência do Banco Central com desafios tão grandes que sua gestão vai consagrá-lo ou arruiná-lo, a depender das escolhas que ele fará à frente de uma das mais importantes instituições do país. E, claro, diante de possíveis interferências do Executivo – um medo crescente entre os participantes do mercado.
Aos 42 anos, Galípolo é um dos mais jovens presidentes do BC, ficando atrás de Armínio Fraga, que liderou a autarquia em 1999. Galípolo integrou o Ministério da Fazenda de Haddad como secretário-executivo, além de ter sido presidente do Banco Fator e chefe da Assessoria Econômica da Secretaria de Transportes Metropolitanos de SP. Teve importante papel, em 2022, de servir como uma espécie de interlocutor para conectar o PT com o empresariado.
Quem trabalhou lado a lado dele cita sua resiliência e seu gosto pelo estudo como grandes diferenciais, com importante capacidade de adaptação. Na outra ponta, sua proximidade com o PT foi alvo de preocupações de agentes do mercado financeiro, que veem a carreira dele como errática, sem um caminho claro.
No último dia 30, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou o termo de posse de Galípolo na presença dele próprio e do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em cerimônia reservada. Apesar da assinatura, Galípolo assume oficialmente o cargo de presidente do BC a partir desta quarta-feira, 1º de janeiro de 2025.
E ele já chega enfrentando duras batalhas. A primeira delas é a inflação, cada vez mais distante da meta e com um número crescente de economistas que veem uma clara dificuldade da autoridade monetária de levá-la para o nível desejado. A elevada quantidade de gastos do governo, outro fator inflacionário, também entra no rol de obstáculos já colocados à frente da nova administração do BC. A conclusão só pode ser uma: juros mais altos, que, por sua vez, freiam a economia – uma agenda que não agrada o Executivo.
Galípolo fez questão de, nos últimos meses, sinalizar constantemente que vai trabalhar para conter a inflação e que o papel do BC é técnico, numa tentativa de se alinhar ao até então presidente Roberto Campos Neto e de afastar os maus agouros em relação ao seu futuro no BC. Mas não houve trégua: em entrevistas recentes, Lula foi categórico em criticar o atual patamar de juros no Brasil e afirmar até mesmo que ele não é condizente com a realidade. Trata-se de mais espinhos pelo caminho de Galípolo, afinal, à frente do BC, ele terá o importante desafio de cuidar das expectativas dos investidores, o que só seria feito se a política monetária for independente o suficiente para trafegar na direção exigida no momento, conforme a inflação.
Outro tema sensível é o câmbio. Na cerimônia de posse de Galípolo, Haddad concedeu entrevista a jornalistas em que afirmou que o câmbio não é fixo no Brasil e que o dólar “esse ano de 2024 termina muito forte no mundo todo”. Trata-se também de um desafio grande para o BC, que já injetou mais de US$ 30 bilhões para conter a desvalorização cambial e as disfuncionalidades identificadas no mercado. O câmbio, como canal de contaminação para a inflação, deve continuar como peça-chefe no xadrez de Galípolo no BC. “Eu penso que as intervenções do Banco Central foram corretas, no sentido de dar liquidez para quem estava eventualmente fazendo remessa, enquanto o mercado processava as informações a respeito das medidas fiscais”, disse Haddad.
O cenário externo também permanece no foco do BC de Galípolo, diante da chegada do republicano Donald Trump à presidência dos Estados Unidos. Com uma agenda considerada inflacionária e protecionista, o trabalho dos bancos centrais de países emergentes ficará ainda mais difícil, dado que uma inflação mais alta na maior economia do mundo representa juros mais altos por lá e, consequentemente, por aqui. O caminho de Galípolo está traçado. Agora, só o tempo dirá quais obstáculos serão superados.