Frigoríficos brasileiros recebem nota baixa em estudo sobre segurança
JBS, BRF e Marfrig tiveram notas que, juntas, dão uma média de 16 dos 100 pontos possíveis; segurança alimentar é o maior dos problemas
Os maiores frigoríficos brasileiros não se saíram bem em um estudo que avaliou a segurança sanitária na produção de carne. De acordo com o instituto Fairr Initiative, BRF, JBS e Marfrig conseguiram, juntas, uma média de 16 pontos de um total de 100. As piores avaliações ficaram por conta da segurança alimentar e do uso de antibióticos.
O Brasil é o segundo maior produtor de carne bovina no mundo. Em 2017, foram produzidos 9,28 milhões de toneladas, deixando o país atrás apenas dos Estados Unidos, com 11,38 milhões de toneladas. Isso faz com que as condições da carne nacional seja motivo de preocupação global, segundo o instituto.
A metodologia da pesquisa utiliza informações públicas da própria companhia para dar notas, como relatórios de sustentabilidade, informações prestadas a imprensa ou a investidores. Assim, a avaliação mais baixa é dada quando não há qualquer informação sobre determinado indicador, e a mais alta quando os indicadores são públicos, detalhados e alcançados.
A BRF tirou nota zero em segurança alimentar e uso de antibióticos. A JBS, por sua vez, tirou 10 em cada um desses quesitos. A Marfrig foi ligeiramente melhor, com 30 e 40, respectivamente. Apesar disso, também foi classificada como “alto risco”.
“A sustentabilidade da produção brasileira é uma preocupação crucial não apenas para os investidores, mas também para os governos, já que as importações de carne e soja são importantes questões do comércio internacional”, avalia Maria Lettini, diretora do Fairr.
Também chamaram a atenção as notas de impacto ambiental da BRF e JBS, 40 e 20, respectivamente, condições de trabalho da JBS, 33, e trato animal de JBS e Marfrig, 40 para ambas.
“As empresas mostram um gerenciamento ruim dos nove riscos no índice. No total de empresas que avaliamos, 60% delas são classificadas como ‘alto risco’. Isso significa que elas nem sequer possuem estruturas básicas para gerenciar a maioria desses riscos”, afirma Lettini.
Os outros indicadores são poluição, uso da água e emissão de gases de efeito estufa. Apenas a Marfrig alcançou índices de “baixo risco” (acima da nota 66) para dois desses indicadores: emissão de gases de efeito estufa e poluição. A JBS conseguiu uma nota alta para uso da água. Todas as outras foram classificadas como “médio risco”.
Após a operação Carne Fraca, deflagrada pela Polícia Federal, em março de 2017, grandes importadores de proteína bovina fecharam o mercado para o Brasil. Estima-se que o país perdeu 1,8 bilhão de dólares devido ao embargo. Estados Unidos, União Europeia e China ainda mantêm alguma restrição à carne brasileira.
Recomendações
O estudo faz algumas considerações sobre como as empresas podem aperfeiçoar sua produção e melhorar suas notas. O instituto fala sobre melhorar os sistemas de rastreabilidade da carne sobre toda a cadeia de produção, além de desenvolver uma política clara sobre o uso de antibióticos. Pede também o compromisso em acabar com o desflorestamento para criação animal e monitorar a cadeia de fornecedores.
“As três companhias são classificadas com ‘alto risco’, situando-se abaixo da média do índice”, diz o estudo acerca da segurança alimentar. “Apesar do grande custo financeiro e risco à saúde, o uso de antibióticos é mal resolvido pelas três companhias, devido à falta de uma política clara e não publicação da quantidade utilizada”, afirma.
Defesa
A Marfrig se defende. “O estudo do Fairr Initiative mostra que a Marfrig Global Foods é uma das empresas de carne bovina mais bem posicionadas no ranking elaborado pela instituição e a melhor ranqueada dentre as empresas brasileiras avaliadas, o que demonstra seu comprometimento com a excelência operacional e com a sustentabilidade. A Marfrig opera de acordo com todas as normas determinadas pelas autoridades e procura a melhoria contínua de seus processos.”
A BRF, por sua vez, diz que toda a produção de aves está livre de antibióticos e que não faz uso profilático de antibióticos na produção em sua cadeia. “Estes são compromisso que fazem parte da estratégia da BRF de reduzir o uso de medicamentos em toda a sua cadeia de produção”, disse em nota.
“A companhia tem um sistema de rastreabilidade e controle de qualidade de seus produtos que passa pela realização de mais de 14 milhões de análises laboratoriais ao ano e a adoção de sistemas para informatizar a gestão de análises laboratoriais que permite o rastreamento integral de informações de todas as etapas dos testes. Essas iniciativas e um constante aprimoramento de processos e controles traduzem os compromissos absolutos da BRF com segurança, integridade e qualidade em toda a sua cadeia de produção.”
Por fim, a JBS questiona a validade do estudo. A empresa afirma que o estudo traz informações incorretas. “Nenhum produto ou marca da JBS foi citado ou colocado sob suspeita pelas autoridades da Operação Carne Fraca. Também destacamos que a companhia não está entre as empresas denunciadas nas investigações derivadas.”
Além disso, a companhia diz que o apontamento sobre uso de antibióticos é outro equívoco baseado em informações incompletas. “A JBS esclarece que o uso de antibióticos ocorre exclusivamente em casos de estrita necessidade, com recomendação veterinária e de acordo com a normas e legislação sanitárias vigentes, de forma que não comprometa o bem-estar animal e a segurança do alimentos.”
Outro ponto questionado pela empresa são as avaliações sobre rastreabilidade e desmatamento. A JBS argumenta que faz o monitoramento de 100% de seus fornecedores da região da Amazônia Legal e que possui uma Política de Compra Responsável de matéria-prima, que estabelece critérios socioambientais para a seleção de fornecedores. A empresa diz não adquirir animais de fazendas envolvidas com desmatamento de florestas nativas, invasão de terras indígenas ou áreas de conservação ambiental, ou que foram embargadas pelo Ibama. “Auditoria realizada recentemente pelo Ministério Público Federal no Pará, usando critérios próprios, avaliou como satisfatório o volume de compras da empresa, e as auditorias realizadas anualmente por consultoria independente indicam que, nos últimos cinco anos, 99,97% das compras de gado da JBS na região da Amazônia Legal foram regulares”, disse, em nota.
A JBS ainda apontou que entrou em contato com a Fairr para esclarecer pontos destacados do estudo e que ouviu a resposta de que o instituto continua trabalhando para aperfeiçoar sua metodologia.
Maria Lettini, diretora da Fairr, responde que ao desenvolver o índice, o instituto procura informações publicamente disponíveis para construir a avaliação dos nove fatores de risco. “O mercado está buscando maior transparência e divulgação em vários problemas que podem afetar o valor do portfólio. Damos pontuações por cobertura geográfica parcial, mas estamos procurando políticas globais abrangentes em todas as proteínas animais, a fim de alcançar as melhores pontuações para este fator de risco.”
Ela explica que, ao colher as informações, quando as empresas não publicam seus dados, a Fairr entra em contato com as companhias. Ao não receber as respostas, ela simplesmente publica a avaliação negativa. “Na Fairr, damos as boas-vindas a um diálogo proativo com as empresas em nosso Índice a qualquer momento durante nosso processo de avaliação e esperamos ver maiores dados disponíveis para as iterações subsequentes do Índice”, disse Lettini.