Em segundo plano no governo, fator indústria desponta na corrida eleitoral
A recriação do Ministério da Indústria, que em 2019 foi incorporado ao da Economia, é promessa dos três primeiros colocados nas pesquisas
A três meses das eleições presidenciais, algo já parece certo na área econômica, independentemente de quem ocupará o Palácio do Planalto em 2023. O novo governo terá um Ministério da Indústria. A recriação da pasta, que em 2019 foi incorporada ao Ministério da Economia, chefiado por Paulo Guedes, é promessa dos três primeiros colocados nas pesquisas. No fim de junho, em evento em Brasília organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), diante de uma plateia de 1 500 empresários, o presidente Jair Bolsonaro declarou: “Pretendemos, em havendo uma reeleição, recriar o Indústria e Comércio, cujo ministro seria indicado pelos senhores, com o perfil dos senhores, para exatamente ter liberdade para trabalhar”. No mesmo evento, o pré-candidato Ciro Gomes declarou a sua intenção de contar com um ministério específico para o setor. O líder das pesquisas, Luiz Inácio Lula da Silva, não compareceu, mas também tem indicado o mesmo desejo, e nos últimos dias incrementou a sua agenda com mais encontros com empresários.
A relevância da pauta industrial é tamanha que obrigou os industriais a adotarem uma estratégia inédita para lidar com o processo eleitoral. Nas últimas semanas, passou a existir uma espécie de pacto entre empresários para evitar declarações sobre reuniões, para não se exporem. Eles notaram que, especialmente depois de encontros com Lula, acabam sofrendo pressões de bolsonaristas, em grupos de WhatsApp dos quais participam, com ameaças de boicotes a suas empresas. Em algumas reuniões, a prática tem sido a de deixar os telefones celulares do lado de fora. Outros industriais têm preferido até evitar encontros, seja com Lula, seja com Bolsonaro, para fugir da polarização. À parte as intrigas eleitoreiras, é consenso que o setor, mergulhado em um processo de perda de relevância no cenário econômico brasileiro, exige mais atenção. Em 1985, a indústria representava 48% do PIB. Na virada do milênio, caiu para 26,7%. E as duas últimas décadas trouxeram mais retrocessos. Em 2021, a fatia estava em 22,2%, mesmo com uma pequena recuperação frente ao baque da pandemia.
A situação da indústria representa, como a de nenhum outro setor, a perda de dinamismo da economia nacional, acorrentada a uma estrutura de impostos complexa e de altas tarifas, a burocracias excessivas, a pouco incentivo à inovação, a uma baixa qualidade educacional da população, a muita insegurança jurídica e a uma infraestrutura de transportes deficiente. “Quando há uma cadeia de suprimentos mais longa, existem diversos componentes que implicam custos embutidos, o que dificulta que a indústria brasileira tenha competitividade lá fora”, diz Renato da Fonseca, superintendente de desenvolvimento industrial da CNI. “Várias grandes empresas brasileiras têm fábricas lá fora para atender ao mercado global e fugir dos custos internos.”
Apesar do cenário alarmante, o setor recebeu pouca atenção do governo Bolsonaro. Mesmo quando representantes do setor conseguiam acesso a secretários do Ministério da Economia, as demandas não evoluíam. Dessa forma, o diálogo dos industriais com o governo foi considerado péssimo no início da gestão, mas começou a melhorar nos últimos meses, com a proximidade das eleições. Agora, o ministro Paulo Guedes busca se posicionar para não perder a influência. Ele desenha um plano em que a Secretaria de Produtividade e Competitividade servirá de base para o novo ministério. A ideia original era alçar a secretária responsável pela área, Daniella Marques, a ministra. Mas ela acabou assumindo a presidência da Caixa, após a demissão de Pedro Guimarães. Além disso, o seu nome encontrava resistência junto ao empresariado, que prefere alguém com experiência no setor em vez de uma ex-representante do mercado financeiro. “Eles têm bons economistas, mas não há hoje no Ministério da Economia especialistas nessa área”, diz Flávio Roscoe, presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg). Com a disputa acirrada e a economia patinando, o fator indústria se tornou decisivo.
Publicado em VEJA de 13 de julho de 2022, edição nº 2797