Black Friday: Revista em casa a partir de 8,90/semana

Reinaldo Azevedo

Por Blog Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura
Continua após publicidade

“Memória de Ferreira Gullar”, por Marcos Lisboa

Leiam o texto que Marcos Lisboa escreve sobre a obra do poeta Ferreira Gullar, que morreu no dia 4 deste mês, aos 86 anos

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 6 fev 2017, 17h53 - Publicado em 14 dez 2016, 08h37
  • Seguir materia Seguindo materia
  • Prometi aos meus leitores um texto mais alentado, de própria lavra, sobre Ferreira Gullar. Os dias andam bicudos. As noites andam velozes. Felizmente, posso cumprir a promessa, mas por intermédio da pena de um querido amigo, Marcos Lisboa, que me dispenso de apresentar. É tão fácil saber quem é ele.

    Marcos é uma das pessoas mais cultas que conheço no sentido mesmo da palavra: cultivada. Economista brilhante, pensador da economia antes de tudo, é um grande leitor de literatura.

    Em dias de terra devastada, é daqueles amigos que enchem seu coração de esperança.

    Uma esperança sempre magra e severa, como diria Musil, de que ele gosta tanto.

    Leiam “Memória de Ferreira Gullar”, por Marcos Lisboa.

    *
    Morreu Ferreira Gullar. Ferreira Gullar morreu.
    Temos que repetir interminavelmente:
    morreu Ferreira Gullar.

    Continua após a publicidade

    Minha geração conviveu com a sua poesia inesperada;
    a ruptura herdada do verso livre.

    Onde, em João Cabral, havia palavras secas ou silêncio incômodo,
    no jovem Gullar havia a escolha pelo contraste.

    Morreu Ferreira Gullar.

    A sua poesia flui como a língua estrangeira de um país provisoriamente vizinho.
    Reconhecemos as palavras, a melodia.
    Sabemos dos temas.
    Mas há o estranhamento com as sutilezas.

    Continua após a publicidade

    As linhas de Ferreira Gullar revelam intimidade com a delicadeza e a ruptura.
    A sua poesia tem a cadência da respiração
    que permite reconhecer quem se senta à poltrona,
    oculto pela geometria do corredor.

    Morreu Ferreira Gullar.
    Com ele se vai uma vida que acompanhamos com a cerimônia das visitas ilustres.

    Sabemos do filho
    e da estética que combinava palavras simples, linhas retas e cores primárias.
    A delicadeza do concreto turva o resto como a bruma do mar azul.

    A simplicidade da linguagem de Gullar
    surpreende pela sutileza dos contrastes bruscos.
    Alquimia.

    Continua após a publicidade

    A personalidade se impõe na disposição de poucos elementos,
    que revelam suas perdas,
    suas inquietudes;
    uma vida ansiosa por registrar a sua memória.

    Há tanto o que admirar em Ferreira Gullar:
    a ruptura íntima e estranha da sua poesia,
    que às vezes surpreende com um riso de menino.

    E há o mau humor do jovem que se descobriu velho,
    profundamente irritado com os novos que aparentam desconhecer a ordem da revolução.

    A inevitabilidade da história transformou a ruptura em reação.
    Ao menos, foi preservada a indignação ética,
    que não parece escolha; apenas vocação.
    A ética, em Gullar, parece tão inevitável quanto seu perfil.

    Continua após a publicidade

    De longe, parecia que, às vezes, inesperadamente, a divergência brusca surpreendia com um riso aberto.

    Uma parte analítica e crítica, outra parte lambuzada pela sapequeza de menino. Quem seria o tradutor?

    Talvez já não houvesse mais a mesma a sutileza estranha das palavras.
    A poesia revelava as verrugas da idade, polidas pela erosão do aprendizado.
    A prosa, por vezes irritada, contrastava com a aceitação serena da memória.

    Morreu Ferreira Gullar.
    E, com ele, morre um país.
    Frase instintiva, mas balão de ar.

    Morreu Ferreira Gullar.
    Morreu, apenas, Ferreira Gullar.
    Morreu, sobretudo, Ferreira Gullar.
    Ferreira Gullar morreu.

    Publicidade

    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Semana Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    BLACK
    FRIDAY

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    Apenas 5,99/mês*

    ou
    BLACK
    FRIDAY
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (a partir de R$ 8,90 por revista)

    a partir de 35,60/mês

    ou

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.