“Dar as mãos do capital privado com o Estado é o melhor caminho”
CEO da holding Prumo, Rogerio Zampronha defende um modelo híbrido entre público e privado para o setor de portos
O economista pela Universidade de São Paulo (FEA/USP) Rogerio Zampronha é CEO da holding Prumo, responsável pelos negócios do Porto do Açu – o único porto privado do Brasil – e que, em oito anos de operação, já ocupa o terceiro lugar na movimentação de cargas no País, segundo recente ranking da Agência Nacional de Transportes Aquáticos (Antaq), perdendo apenas para os portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR). No momento em que se discute estender esse modelo para todo o setor, Zampronha defende uma versão híbrida. “Dar as mãos do capital privado com o Estado é o melhor caminho para a infraestrutura brasileira”, afirma. “Não diria que o ideal seria a privatização de todos os portos. Mas, sim, abrir espaço para que o capital privado também possa participar desse processo. As empresas, quando são privatizadas, têm um melhor desempenho do que as estatais – não só no Brasil, mas é um fenômeno global.”
O Grupo Prumo é controlado pelo EIG, um fundo norte-americano com foco em energia e infraestrutura, e pelo Mubadala Investment Company, um dos maiores fundos soberanos do mundo. No País, o Porto de Açu atende aos setores de petróleo e gás, logística portuária e mineração. Zampronha deu a seguinte entrevista à coluna:
Como o sr. vê o atual processo de concessão de portos no País? Estamos muito atrasados? Se sim, qual a razão: falta vontade política?
Os portos são, por natureza, um investimento de Estado. São projetos que levam décadas para atingir um grau de maturidade importante. O Estado, no entanto, teve sua capacidade de investimento no setor muito reduzida nas últimas décadas, e isso afeta projetos de longo ciclo de maturação como portos. Nos últimos 20 anos, surgiram vários terminais privados, que operam dentro de um porto. Ou seja, um precisa do outro. Mas porto privado no Brasil só tem um, que é o Porto do Açu. Existe um processo de privatização do Porto de Santos que caminhou bastante, e ainda falta a última milha para que se torne realidade. Mas, definitivamente, é um ponto para se observar. Por um lado, esse avanço não está sendo tão rápido por falta de capacidade de investimento estatal; mas, por outro, abre-se a fronteira para a entrada de capital. E, assim, vejo que vão surgir boas oportunidades de investimentos para o desenvolvimento de negócios nos portos com o capital privado.
Então, a privatização de todos os portos brasileiros garantiria um melhor desenvolvimento do setor?
Não diria que o ideal seria a privatização de todos os portos. Mas, sim, abri espaço para que o capital privado também possa participar desse processo. As empresas, quando são privatizadas, têm um melhor desempenho do que as estatais – não só no Brasil, mas é um fenômeno global. O mais importante é que o capital privado possa existir de uma maneira sustentável. Não é fácil investir em um porto R$ 20 bilhões e esperar 50 anos para o porto começar a dar retorno.
Como o sr. avalia o papel do Estado nesse setor?
O papel do Estado nesse setor é relevante em qualquer lugar do mundo, não só no Brasil. E não se pode apenas aguardar o Estado agir. Temos de participar desse processo de mãos dadas, seja no aspecto regulação, concessão, autorização. Então, há vários modelos de participação que envolvem o capital estatal e o privado de bastante sucesso. Ou seja, dar as mãos do capital privado com o Estado é o melhor caminho para a infraestrutura brasileira.
O Mubadala, ao lado da EIG, é um dos sócios majoritários da Prumo, que controla o Porto do Açu. O Mubadala – um dos maiores fundos soberanos do mundo – investe em vários setores. Qual é o pulo do gato para o interesse dos dois por aqui?
O nosso maior investidor é o fundo americano EIG, que faz investimentos no mundo inteiro. E são todos investimentos de período de maior maturação. Não posso falar pelo fundo Mubadala, que é o fundo soberano de Abu Dhabi e se permite fazer investimentos de infraestrutura com prazos de maturação maior. São investidores que entendem muito bem desse negócio de infraestrutura.
Então, o Brasil é um País promissor nesse negócio para ter dois fundos dessa envergadura…
A guerra da Rússia contra a Ucrânia evidenciou o quão crítico é ter uma dependência geopolítica no campo da energia. E o mundo está se redesenhando a passos rápidos. Essa mudança abre espaço para que o Brasil tenha uma oportunidade daquelas que só aparece a cada 50 anos. Isso porque, independentemente de governo, o Brasil tem sido um cumpridor de contratos – não se estatiza como a Bolívia fez – e tem, no setor de energia, marcos regulatórios muito claros, com incentivo à participação de diferentes. Tem ainda agências reguladoras que funcionam bem. E o País tem recursos naturais em abundância. Quando se trata de energia, o Brasil está no pódio das renováveis, porque tem ventos estáveis e muito bons, sol, biomassa cuja taxa de crescimento é veloz. No nosso caso, o Porto do Açu tem uma vocação muito forte para a energia.
Qual a relação entre energia limpa e portos?
Essas instalações de energia de biomassa vão ocorrer em portos. Isso porque precisamos de grande qualidade de energia renovável de baixo custo, e que virá da instalação de parques eólicos instalados no mar – camadas eólicas offshore – e que desembocam no porto. E no porto se instalam indústrias que precisam ser cada vez mais competitivas, produzindo com energia mais barata.
Então, o sr. está otimista?
Acho que vamos viver um momento muito bom nos próximos quatro ou cinco anos. Se observarmos o número de dias que o navio espera para descarregar – porque sempre tem fila e congestionamento de navios nos grandes portos –, muitas vezes o custo é alto: espera-se por 60 ou 70 dias. Isso pode ser mais caro do que o item do produto que está sendo transportado. Se existem filas, existe também oportunidade para que novos portos surjam ou que haja mais investimentos nos portos existentes.
No caso do Porto do Açu, qual o volume de investimentos em operação para ampliar o acesso (por estrada, ferrovia, dutos) aos terminais? E qual será o efeito disso sobre o volume de produtos movimentados no futuro?
A Prumo tem vários investimentos, e um deles é o Porto do Açu. A Prumo é controladora do porto. Nos próximos anos – por volta de 2027 –, nós esperamos fazer investimentos na ordem de R$ 22 bilhões no Porto do Açu e em várias frentes: novos terminais, crescimento dos terminais existentes e investimentos em projetos de transição energética. Um dos nossos investimentos é um terminal multi-cargas privado. Com atividades iniciadas em 2014, o Porto do Açu possui o terceiro maior terminal de minério de ferro do Brasil, é responsável por 30% das exportações brasileiras de petróleo, ergue o maior parque térmico da América Latina e abriga a maior base de apoio offshore do mundo. Ao todo, já são 19 empresas instaladas ali. Considerado como porta de entrada para os projetos verdes no País, o Açu promove sua industrialização com base em projetos com menor emissão de carbono e geração de energia limpa para incrementar suas matrizes energéticas sustentáveis.
Dos terminais e áreas exploradas hoje pelo grupo, quais têm apresentado melhor retorno e por quê?
O terminal de multicargas tem crescido mais de 50% ao ano. E esperamos que isso continue ao longo dos próximos anos também. Outra empresa nossa, a Vast, faz transporte de petróleo com toda a segurança por ser em ambiente protegido. Mais de 40% do petróleo exportado pelo Brasil passou pela Vast nos últimos três meses. Os outros 60% passaram por terminal da Petrobras. Esse é um exemplo do crescimento muito acelerado que temos tido. O porto é, na verdade, o nosso playground. Ou seja, tudo acontece por lá porque ele tem infraestrutura necessária para o desenvolvimento de várias atividades econômicas.
Em quais novos segmentos o grupo aposta para ampliar sua participação de mercado, e qual o volume de investimentos para atingir essa meta?
Nossa grande aposta são os negócios de transição energética, como produção de hidrogênio, energia eólica, insumos, produção de fertilizante verde. Enfim, na industrialização de baixo carbono estamos aptos para a instalação de novas indústrias.