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Tropas da Coreia do Norte na Ucrânia: tudo o que pode dar errado

Com ajuda dos amigos do Sul Global, Putin fica mais ousado e introduz um elemento explosivo ao mobilizar Kim Jong-un para guerra

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 24 out 2024, 07h11 - Publicado em 24 out 2024, 06h29
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  • Como um ditador completo e absoluto em seu reinado vermelho na Coreia do Norte, Kim Jong-un não deve satisfações a ninguém: pode mandar militares para a Ucrânia, entrar num conflito no qual o país não tem nenhum interesse em jogo, sofrer um número de baixas que ninguém realmente ficará sabendo e até absorver inevitáveis deserções. Desafiar os mais elementares princípios do direito internacional? Não está nem aí.

    Mas o quadro geopolítico ganha um fator que complica tudo – inclusive por mostrar como Vladimir Putin está se sentindo vencedor, no campo militar e diplomático, com o incentivo dos amigões do Brics, dispostos aos maiores contorcionismos morais para lhe dar asas.

    O apelo a tropas sobre as quais na verdade não tem controle não seria um sinal de que a Rússia está precisando de reforço, com recursos esgotados?

    Sim e não. As perdas sofridas são realmente imensas: 600 mil mortos e feridos desde a invasão da Ucrânia. Mas não há indícios de que a opinião pública russa esteja virando contra a guerra. Militarmente, a Rússia não só mantém como avança, mesmo que em ritmo muito reduzido, sobre os ucranianos. Também está sendo reconquistado o território na região de Kursk, um pedaço pequeno mas altamente simbólico de solo russo que a Ucrânia ousadamente tomou.

    Em resumo, a tática do “moedor de carne”, avanços alcançados a um preço terrível em baixas, aproveitando a vantagem numérica da Rússia em tropas e material bélico, está funcionando. Trazer mais gente, mesmo que, absurdamente, de um país asiático sem nada a ver com o conflito, ajuda a colocar mais carne no moedor. Também ajuda nos objetivos diplomáticos de longo alcance da Rússia: criar uma frente contra o Ocidente – ou seja, Estados Unidos e países europeus.

    “MELHOR AMIGO”

    Trazer para seu campo uma figura bizarra e fora do padrão normal de todos os outros países do mundo, inclusive os anormais, como Kim Jong-un, o terceiro ditador da dinastia familiar comunista, também ajudar Putin a criar um clima de intimidação contra seus adversários. Um maluco com armas nucleares do seu lado é, por essa medida, um trunfo.

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    Putin ficará devendo um favor a Kim? Sem dúvida. Está ligando para as múltiplas consequências desse comprometimento? Não parece. Dobrar a Ucrânia, e infligir uma derrota grande aos aliados ocidentais, vale o risco.

    Para Kim, obviamente, tudo parece vantajoso: seu “melhor amigo”, como já disse, quebra o isolamento em que ele vivia, num sistema em que até a China fingia que não comungava com os maiores exageros do pequeno ditador. O fingimento se tornou desnecessário.

    “Estamos numa era inteiramente diferente se soldados norte-coreanos estão morrendo por Putin”, definiu para o New York Times o especialista Victor Cha, do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais. Cha acredita que a conta vai ficar cara para Putin quando Kim pedir o pagamento pelo favor.

    POPULAÇÃO ESCRAVIZADA

    Mas o fato é que agora já há em território europeu soldados norte-coreanos – supostamente de forças especiais, mais doutrinados ainda para impedir deserções em massa. Segundo o secretário da Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, os sistemas americanos de vigilância já detectaram a presença de 2,5 mil deles. A Ucrânia fala em 12 mil. Estão sendo transportados em navios russos.

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    A Coreia do Norte é um objeto de espanto permanente pelo regime completamente fechado que consegue manter, propagando para uma população escravizada que é o melhor país do mundo enquanto a ampla maioria das pessoas nem sequer consegue alimentação nos valores mínimos.

    Gastar os recursos nacionais em armas nucleares e ampla militarização compensa do ponto de vista de Kim Jong-un: o inimigo sul-coreano, mesmo sob o guarda-chuva americano, não arrisca nada que coloque a ditadura familiar em risco.

    Por isso ele se animou a dar um passo sem precedentes e se envolver numa guerra em território europeu, num país que recebe armamentos dos Estados Unidos e outros aliados da Otan.

    PRISIONEIROS “CONTAMINADOS”

    “A Rússia certamente está fornecendo tecnologia nuclear à Coreia do Norte, o que representa uma séria ameaça à estabilidade do Extremo Oriente”, escreveu no Telegraph o analista militar Hamish de Bretton-Gordon. “A Rússia provavelmente também está ajudando o Irã com tecnologia nuclear em troca de mísseis”.

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    Putin, afirmou ele, aposta que os líderes ocidentais “são fracos e incapazes de tomar decisões ousadas – e, infelizmente, talvez esteja certo”.

    É com a turma de Putin, Kim, os turbantes iranianos e outros aliados do mal que os partidários do Sul Global, como movimento para contestar a preponderância dos Estados Unidos, estão juntando forças.

    Para os pobres norte-coreanos, nem se sabe qual seu futuro. Depois que a II Guerra Mundial acabou, Stalin mandou para a Sibéria os soldados soviéticos que tinham sobrevivido como prisioneiros de guerra da Alemanha nazista – considerava-os “contaminados” pelos simples fato de terem convivido com estrangeiros.

    Poderão os norte-coreanos retornar a seu país, se sobreviverem ao moedor humano e não desertarem, como todos eles no fundo pensam fazer?

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    Ou Kim Jong-un pode se injuriar se suas tropas sofrerem muitas baixas e planejar alguma resposta maligna?

    A situação na Ucrânia ganha assim um complicador de teor altamente explosivo. O que será que o Sul Global tem a dizer a respeito?

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