Com frequência, nos perguntamos por que ultimamente as coisas não andam bem. Na verdade, crises têm ocorrido a partir dos dois choques do petróleo (1973 e 1979) e da crise de dívida externa (1982). Ao mesmo tempo, o prolongamento da estratégia de substituição de importações, os efeitos econômicos da Constituição de 1988 e as más consequências do governo de Dilma Rousseff contribuíram para o colapso da produtividade — e assim do potencial de crescimento.
Enquanto isso, a cultura da indexação e o impacto fiscal do atendimento de demandas sociais reprimidas aceleraram o ritmo da subida da inflação, que resistiu a diferentes remédios até o Plano Real (1994). A esperança renasceu com a estabilidade monetária, as reformas do governo FHC e a política econômica responsável do primeiro mandato de Lula. O Brasil voltava a dar certo. Na capa de uma edição da revista The Economist, o Cristo Redentor decolava qual um foguete. De repente, o pessimismo retornou com a armadilha do baixo crescimento e o alto desemprego. O que aconteceu?
A explicação está no recente livro Nós do Brasil: Nossa Herança e Nossas Escolhas, da economista Zeina Latif, que examinou as causas dos nossos problemas. Para ela, “o pecado original foi negligenciar a educação”, frase que denomina o capítulo em que discorre sobre os equívocos nessa área crucial para o desenvolvimento. Em análise incomum para economistas, o livro examina a herança cultural da colonização portuguesa, de onde se originam as crenças antimercado e o fervor intervencionista. Como disse Samuel Pessôa, “Zeina transcendeu a profissão”.
“A impressão pode ser pessimista diante da enormidade dos problemas, mas nem tudo está perdido”
No capítulo dedicado ao marco jurídico e ao funcionamento do Judiciário, Zeina aponta as fontes da insegurança jurídica: a complexidade, as imprecisões, as brechas e o ativismo do sistema judiciário que atingem o direito adquirido, questões julgadas e atos jurídicos perfeitos. Os custos da Constituição de 1988 aparecem em várias partes do livro.
A obra avançou em temas como o preço da democracia tardia, a influência das Forças Armadas, a cidadania, a necessidade do compromisso do servidor público com o cidadão, a trajetória e o papel da imprensa e o pensamento (quase único) da academia. Nesse último caso, ela ressalta a baixa qualidade da pesquisa acadêmica e o pensamento de esquerda que impregna as universidades públicas.
Até aqui, a impressão pode ser pessimista diante da enormidade dos problemas a resolver, mas o alento vem no capítulo final. Nem tudo está perdido. Transformações recentes, muitas vezes silenciosas, indicam a possibilidade de volta do crescimento: a classe média não está apática, não há apagão de ideias, o debate público amadurece e existem muitas administrações estaduais e municipais bem-sucedidas.
O livro não recorre ao linguajar dos economistas, nem a gráficos e equações econométricas. Em escrita clara e didática, o leitor entenderá por que estamos fracassando e os caminhos para superar os desafios.
Publicado em VEJA de 8 de junho de 2022, edição nº 2792