O Brasil padeceu (e ainda padece) de atrasos institucionais e de equívocos (inclusive conceituais) muito comuns nos campos fiscal e monetário, que provocavam (e ainda provocam) expansão inadequada de gastos e redução do potencial de crescimento da economia.
Até 1986, o Banco do Brasil (BB) executava funções típicas de um banco central. O Orçamento da União era executado por um de seus departamentos (a Secretaria do Tesouro Nacional surgiu naquele ano). O exercício do monopólio estatal das operações de câmbio cabia a outro departamento. A maior parte dos recursos para a concessão de crédito vinha da “conta movimento”, que permitia ao BB sacar sem limites no Banco Central (BC), a custo zero. Já o BC atuava como banco de fomento, financiando indiretamente a agricultura e a agroindústria.
Essas disfunções eram causa de inflação. Em vez de corrigi-las, optou-se por criar duas outras disfunções: 1) a dívida pública passou a servir para financiar o Orçamento Monetário (OM), e não para cobrir déficits no Orçamento da União; 2) a expansão da dívida era autorizada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), e não pelo Congresso.
O Orçamento da União compreendia apenas uma parcela das despesas federais. Outra parte, muito grande, constava do OM, o qual cobria também despesas com subsídios e com a compra de produtos agrícolas. Financiava feiras e exposições. Até a Ponte Rio-Niterói recebeu dinheiro do OM.
“O Brasil padeceu (e ainda padece) de atrasos institucionais nos campos fiscal e monetário”
Todo esse arranjo acarretava expansão farta do crédito do BB e do BC. Ampliava os gastos públicos. O BB chegou a ser, sem muito sentido, o oitavo maior banco do mundo. Tais distorções foram corrigidas entre 1986 e 1987. A “conta movimento” e as funções de fomento do BC foram extintas. Aboliu-se o OM. O Orçamento da União passou a abranger todas as receitas e despesas da União.
Ainda persiste, todavia, uma grave distorção, a de que o Orçamento é “autorizativo”. Isso não está na Constituição nem na prática de países que levam a sério o assunto, nos quais não existe contingenciamento de despesas pelo Executivo. Apoiada por economistas e jornalistas, a medida piora a alocação dos recursos e inibe o crescimento.
Conceitos equivocados são comuns. É o caso da ideia de que “gasto é vida”, proclamada pela ex-presidente Dilma Rousseff e esposada pelo PT. Outro é considerar o BC como instrumento do governo, a quem cumpriria, via juros baixos, contribuir para a expansão da economia. Daí o combate à sua independência.
Conhecido empresário defendeu publicamente um corte ousado na taxa Selic em 2024 para estimular os investimentos e o consumo. Sabe-se há mais de um século que a contribuição do BC para o desenvolvimento vem de seu papel no controle da inflação e na estabilidade do sistema financeiro. Se usado como quer o empresário, colher-se-á apenas mais inflação e menos crescimento da economia.
Pelo que se vê, todavia, ainda vamos levar tempo para aprender. Essa é uma das razões por que o Brasil não fica rico.
Publicado em VEJA de 19 de janeiro de 2024, edição nº 2876